Quando Filipe Nyusi assumiu a batuta da governação há já 7 anos atrás, ele desmantelou o Ministério da Planificação e Desenvolvimento (MPD), uma criação guebuzista engendrada para pensar estrategicamente o país. Nyusi criou, no seu lugar, o Ministério da Economia e Finanças (MEF), e entregou a batuta a um respeitado gestor financeiro que em tempos fora Governador do Banco de Moçambique:Adriano Maleiane.
O primeiro choque da Governação de Nyusi foi a revelação dos cofres vazios, deixados pelo anterior executivo: O calote das dívidas ocultas (Nyusi destacou isso na terça-feira, enquadrando o endividamento oculto como uma grande perda para a economia).
Maleiane foi apanhado nesse encruzilhada e deixou-se aprisionar nela. Desde lá, ele veio gerindo o MEF como Ministério das Finanças apenas, deixando a componente económica de lado. Entregou-se à gestão do binômio receita-despesas, de uma certa forma empurrado pela emergência de encontrar uma saída negociada com os credores, e quiçá, recuperar a confiança dos doadores.
O resultado foi uma catástrofe. Nestes 7 anos, o país viveu sem pensamento económico. Curiosamente, ao longo destes anos, Moçambique não parou de sofrer choques com impacto tremendo no sector produtivo. Veio o Covid 19 e toda uma conjuntura desfavorável que poderiam suscitar medidas de política de relevo para relançar a economia.
Mas a inércia estava instalada. E, com ela, o afundamento do sector produtivo, o desemprego galopante, uma economia aprisionada numa saia justa. Durante a crise da Covid 19, o governo não conseguiu gerar uma medida de reforma económica estrutural que pudesse fazer renascer a esperança. A economia, o pensamento estratégico tinha sido abandonada.
E quando, a 24 de Fevereiro deste ano, a Rússia invadiu a Ucrânia, lançando um manto de incerteza sobre a economia mundial, Nyusi percebeu o vazio do MEF como motor de reformas para relaxar o aperto da saia. Já era sem tempo. Com o sector privado quase no fundo do poço e a sociedade com fome, sem trabalho nem comida, Nyusi acordou para a realidade.
Colocou Max Tonela no MEF. Economista de bagagem cheia, habituado a desenhar propostas arrojadas de “project finance” e a pensar estrategicamente (a longo prazo) o sector corporativo estatal (EDM e HCB) por onde passara como gestor financeiro antes de assumir sucessivamente as pastas da Indústria e Comércio e a dos Recursos Minerais e Energia, Tonela finalmente aceitou o desafio.
Ele tomou posse em princípios de Março, mas antes do fim desse mês já estava, sabe “Carta”, juntando os pauzinhos para compor o conjunto de medidas de estímulo à economia que o Presidente Filipe Nyusi lançou nesta terça-feira. As medidas não foram geradas nos corredores do FMI como alguém conjecturou; foram geradas internamente, dentro do MEF, por uma plêiade de técnicos escolhidos a dedo por Tonela. Com dois vice-ministros altamente competentes nas suas funções (Almícar Tivane e Carla do Louveira), o Ministro do MEF ganhou tempo para pensar estrategicamente.
E trazer a economia de volta. Em poucos meses, o debate em Moçambique volta a se centrar em temáticas que realmente contam: como fazer a máquina do Estado funcionar para que o sector privado produza e ganhe dinheiro, o investimento nacional e estrangeiro retornem, haja negócios e trabalho e, por fim, mais receita para o Estado.
O pacote de medidas lançado corresponde ao regresso do pensamento económico, da planificação estratégica para estimular o sector produtivo, visando, em última análise, um maior fluxo de receitas para o Estado: Nos últimos meses, a arrecadação fiscal tornara-se penosa: o fisco até chegou ao nível rasteiro da tributação de cabelos.
Seja como for, o pacote está aí e sua relevância não pode ser questionada. As medidas podiam ser mais arrojadas aqui e ali, argumenta-se, e os desafios da sua implementação são enormes, reconhecemos. Mas uma coisa é certa: o pensamento económico no Governo está de volta e isso deve ser registado com a ênfase com que “Carta” fá-lo nesta Carta do Leitor. (Marcelo Mosse)