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terça-feira, 10 dezembro 2019 06:50

Ukuvuyela* Zozibini Tunzi!

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“Esta noite abriu-se uma porta e eu não podia estar mais grata por ser quem passou por ela. Que todas as meninas que presenciaram este momento acreditem para sempre no poder dos sonhos e vejam os seus rostos reflectidos no meu.”, Zozibini Tunzi

 

Esta semana temos mais uma razão para nos sentirmos abençoados por fazer parte desta Era. Pela História passar por nós e por podermos gritar ao Mundo que a estamos a viver. Este é o poder da comunicação e, também, das redes sociais. Hoje “meio mundo” se orgulhou da Vitória de Zozibini Tunzi! A sul-africana que foi eleita Miss Universo 2019.

 

Numa altura em que se fala e se exige representatividade em género, raça e número, principalmente no que toca a nós, mulheres, é sim um dia para celebrar. Aos 26 anos Zozibini é quarta mulher negra a ser eleita Miss Universo, em 68 edições do concurso. 68, tenho de repetir. Antes dela Janelle Commissiong, de Trindade e Tobago esperou 25 anos para ser eleita a mais bonita do Universo, em 1977. Seguiu-lhe a norte-americana Chelsi Smith, em 1995, e a angolana Leila Lopes em 2011. 

 

Se fizermos bem as contas, há uma diferença de mais de 20 anos nestas coroações. Se analisarmos um bocadinho mais a fundo talvez consigamos perceber que há um atraso na mentalidade de quem avalia ou decide quais são os standards de beleza do Universo.

 

O que começou por ser apenas um concurso criado na Califórnia, em 1952, pela empresa de vestuário Pacific Mills, passou a ser uma marca com uma licença que se renova anualmente. Neste evento estão envolvidos vários players do mercado mundial e muito dinheiro, também.

 

Não é de estranhar a invisibilidade da mulher negra num ecossistema em que quem dita são as marcas.

 

Mesmo assim, várias gerações foram passando e se esquecendo se havia mulheres negras a serem premiadas. Ser invisível é isso. É não existir. E a beleza, para além de outros fatores da sociedade é um assunto do foro muito íntimo.  Que temos receio em abordar.

 

Foi preciso as redes sociais serem mais um player, definido por nós – pela positiva – para que questões invisíveis começassem a ser visíveis. E acredito que a discussão e exposição inteligente tem sempre uma força maior.

 

Foi o que senti quando vi mais de dez vezes o discurso de Zozibini.

 

“Eu cresci num mundo onde uma mulher como eu, com o meu tipo de pele e cabelo, nunca foi considerada bonita. E acho que é hora de isso terminar hoje", disse a concorrente, na sua última mensagem antes do veredito final.

 

E afirmou-o bem. De facto, quando olho para trás e penso nos primeiros anos de adolescência, em Lisboa, lembro-me que sempre quis ter tranças compridas para os meus cabelos abanarem como os das minhas amigas. Fizeram-me a vontade. Claro que na altura nunca pensei que um dia ia escrever uma crónica a falar sobre isto e muito menos com o cabelo curto, semelhante ao de Zozi, é assim que vai ser o nickname dela para mim. E a ouvir Hugh Masekela. Estou mesmo feliz.

 

Zozi, para quem já ultrapassou as inseguranças impostas pelo mundo Ocidental, como tu, eu e outras mulheres de que tenho muito orgulho, e marcou um statement num concurso em que raras foram as mulheres negras que tiveram coragem de assumir o seu cabelo, a sua visão de combate ao racismo estrutural, já tinhas ganho pela tua frontalidade e segurança. I’m so proud of you girl.

 

Aos 26 anos és o futuro de mulher negra que quero ver, mais e mais representada. Ter ao meu lado. É em ti que me espelho, mesmo sabendo que faço a minha parte, precisamos de mais miúdas como tu. De mulheres que de facto se unem a outras mulheres por uma causa, a nossa. E não dividem para reinar. Com educação, assertividade e uma postura coerente com o presente. Nada de vitimização ou acerto de contas com o passado vindo de alguém que tinha um ano quando apartheid terminou.

 

Os teus pais só podem ser pessoas muito especiais por, apesar do que passaram, nunca terem passado aquilo, que hoje em dia, seriam inseguranças para ti.

 

"Liderança. É algo que falta a mulheres e mulheres jovens há muito tempo, não porque elas não a desejavam, mas por causa de como a sociedade rotulou como as mulheres deveriam ser". Há oito anos era apenas um concurso de beleza que elegia uma mulher negra. Hoje foi um concurso de beleza que deu voz a uma líder.

 

Khanimambo.

 

*Parabéns em Xhosa

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