"Qualquer enunciação que não é contextualizada pode configurar desonestidade intelectual. Ao optar por ignorar a sua história, Moçambique arrisca-se a cometer os mesmos erros do passado. A reconciliação nacional não deve apagar a nossa história, a morte de milhares de moçambicanos e a deslocação de milhares, interna e externamente, não é desenterrar o machado de guerra. Ao agirmos assim, teremos uma geração ignorante, com direito a todo o tipo de disparates. Reconciliação sim, ignorar a história não".
AB
Circula nas redes sociais um vídeo, com 25 perguntas à Frelimo, sobre o "insucesso" na sua Governação, questionando sobre o que trará Daniel Francisco Chapo, que Samora Machel, Joaquim Chissano, Armando Guebuza e Filipe Jacinto Nyusi não puderam trazer. No vídeo fala-se de "50 anos" de retrocesso no País.
A pessoa que questiona até pode ter razão, sobretudo, se é jovem nascido após o Acordo Geral de Paz. Sim, porque como é sabido, dois anos após a independência nacional, alguns portugueses, com apoio do regime racista minoritário de Ian Smith, criaram um grupo que treinaram, apetrecharam com logística de guerra e, posteriormente, introduziram no território nacional, com o objectivo único de sabotar as infra-estruturas do País. Essas infra-estruturas incluíam Pontes, Linhas férreas, Hospitais, Escolas, Edifícios Públicos de entre outras.
Esse grupo teve na liderança operacional André Matade Matsangaissa e, externamente, liderada por Orlando Cristina. Infelizmente, com o advento da democracia, estes actos ficaram conhecidos como actos "nobres" e ganharam o nome de "Luta pela democracia" e os combatentes com direito à pensão do Estado. Esta parte da nossa história, por conveniência não sei de quem, não é divulgada e pior é que foi apagada da sociedade.
Em 1992, aquando do Acordo Geral da Paz, devido ao efeito da guerra, os moçambicanos estavam confinados às cidades, vilas e sedes dos Postos Administrativos, por razões de segurança. Os moçambicanos, no geral, viviam de caridade, quem não se lembra do milho amarelo, roupa de “calamidade” de entre outros.
Ora, em 1992, Moçambique contabilizava milhões de mortos e outros tantos deslocados a nível nacional e no estrangeiro. Provavelmente, tinha regredido para menos de 500 anos do colonialismo português. Por exemplo, a sabotagem da linha de energia de Cahora Bassa, Tete/ África do Sul, levou Moçambique a prorrogar a entrega da infra-estrutura. De acordo com os entendimentos de 07 de Setembro, que deu lugar à independência nacional, a reposição da Linha férrea, das Pontes etc., levou o seu tempo. Foi a prioridade no período pós-AGP.
Foi prioridade, igualmente, a reposição dos serviços de saúde, da educação, dos serviços públicos e outros. Felizmente, o País contou com o apoio das instituições financeiras internacionais, as mesmas que obrigaram Moçambique a privatizar as infra-estruturas económicas, através do PRE-Programa de Reabilitação Económica. Lembre-se, nos moldes em que foi implementado, o PRE destruiu as indústrias de referência, como de caju, têxteis, pneus e outros. Neste quesito, essas instituições contaram com a colaboração da elite interna, naturalmente afecta à Frelimo, não sendo necessariamente as políticas da Frelimo como partido governamental. Claro que, a Frelimo, nesta fase, devido à ganância de alguns membros, deixou o rigor na forma de selecção dos seus membros, abandonou a crítica e a autocrítica, não mais fez a purificação das fileiras, tendo chegado aos níveis de infiltração a que está hoje.
Que fique claro que para o bem da nossa história como Nação, a contextualização dos factos não deveria ser algo negociável e isso não pode ser considerado como defesa à corrupção que grassa, hoje, quase todos os sectores em Moçambique. Contextualizar uma afirmação é uma questão de honestidade intelectual.
Sobre os Recursos Naturais e os Benefícios
É preciso reconhecer que o início da exploração dos Recursos Naturais em Moçambique, ao afectar-se quadros para a representação do Estado, baseando-se na confiança partidária, propiciou a exploração desenfreada desse recursos por parte das multinacionais, sem olhar para a componente nacional, muitas vezes, com a cumplicidade dos representantes do Estado, porque incompetentes, e sob olhar sereno e impávido do Governo.
Mais ainda, com a abertura da nossa economia, os membros da Frelimo estavam na posse de toda a informação da nossa Geologia e, por conseguinte, se posicionaram como parceiros dos estrangeiros que trazem conhecimento e dinheiro. Estes, no lugar de assegurar que estes cumpram com obrigações para com as populações e o Governo, ficaram do lado do estrangeiro e juntos exploram os nossos recursos. Isto parece perpetuado e fico céptico com a hipótese de renegociar os contratos das multinacionais. Com o tipo de representação que temos ou inclui-se no pacote a nomeação por mérito para esses lugares! Os actuais representantes irão concordar ou estaremos à beira de novo conflito?
Tudo isto mostra que o futuro Governo, se quer trabalhar em prol do povo, deve preparar-se para uma resistência tenaz, resistência interna, pois tudo indica que a Frelimo irá vencer as eleições de 09 de Outubro de 2024.
Adelino Buque