“Moçambique realizou as VI eleições Autárquicas a 11 de Outubro de 2023. São eleições contestadas, em particular, pelo partido Renamo, que diz ter provas materiais de as ter ganho, em alguns Municípios. Ora, a recontagem desses votos não me parece que seja tão problemática, seria de todo justo, fazer-se a recontagem, com a participação dos interessados, os concorrentes da Renamo, da Frelimo ou de outro partido qualquer. São todos elegíveis a dirigirem as autarquias, somos todos moçambicanos, por isso julgo pertinente que a posição do Conselho Constitucional, para além de observar os aspectos estritamente jurídicos, deve ter em consciência que a sua decisão pode salvar ou precipitar o País ao abismo. Tudo está nas vossas mãos, senhores Juízes do Conselho Constitucional. A alínea d) do nr. 1 do artigo 244 da Constituição da República outorga-vos esse poder.”
AB
“O Conselho Constitucional Moçambicano é materialmente um órgão jurisdicional, desempenhando as funções de um TC. É titular da jurisdição constitucional, embora não tenha sido formalmente qualificado como um TC ou como um órgão jurisdicional, pois: - É um órgão constitucional de soberania que exerce uma função jurisdicional que consiste em aplicar a lei geral para julgar casos concretos da esfera da sua competência e no quadro da jurisdição constitucional; - É o órgão de administração da justiça titular da jurisdição constitucional, isto é, que aprecia e declara a inconstitucionalidade das leis e ilegalidade dos actos normativos dos órgãos do Estado; - É o órgão de recurso das decisões dos tribunais _630________RJLB, Ano 7 (2021), nº 3 em sede do controlo concreto da constitucionalidade; - É um órgão deliberativo, as suas decisões não são passíveis de recurso, são de cumprimento obrigatório e prevalecem sobre as dos tribunais e demais autoridades; - Os titulares do CC são juízes; - Os Juízes-conselheiros do CC gozam de garantia de independência, inamovibilidade, imparcialidade e irresponsabilidade; - Exerce a fiscalização concreta, sucessiva, abstracta e preventiva da constitucionalidade; - Fixa jurisprudência com força obrigatória geral; - Julga os processos contenciosos relativos aos conflitos de competências entre os órgãos de soberania e relativos aos processos eleitorais, ao mandato dos deputados, deliberações dos órgãos dos partidos políticos e as incompatibilidades previstas na Constituição e na lei; - Fiscaliza a legalidade dos processos eleitorais; -Verifica previamente a constitucionalidade dos referendos; - Tem iniciativa processual passiva; - O critério que serve de base para as suas decisões é o da legalidade”.
In: NATUREZA JURÍDICA DO CONSELHO CONSTITUCIONAL MOÇAMBICANO. Edson da Graça Francisco Macuácua*
Competências do Conselho Constitucional
“d) Apreciar, em última instância, os recursos e as reclamações eleitorais, validar e proclamar os resultados eleitorais nos termos da lei;
g) Julgar as acções de impugnação de eleições e de deliberação dos órgãos dos partidos políticos;”
In Artigo nº 244 da Constituição da República de Moçambique
Depois de fazer o exercício de consulta legislativa face aos acontecimentos resultantes da comunicação da CNE – Comissão Nacional de Eleições, sobre os resultados das eleições Autárquicas de 11 de Outubro de 2023, notei com satisfação que ainda temos uma janela de esperança para que Moçambique não resvale num Estado desgovernado. A nossa última esperança, neste momento, está depositada no Conselho Constitucional que exerce, simultaneamente, as funções de um Tribunal Eleitoral.
Compete ao Conselho Constitucional – segundo a alínea d) do nº 1 do artigo 244, da CR, apreciar, em última instância, os recursos e as reclamações eleitorais, validar e proclamar os resultados eleitorais nos termos da Lei, competindo, também, a este órgão de soberania “julgar as acções de impugnação de eleições e de deliberação dos órgãos políticos”, sendo que: É um órgão deliberativo, as suas decisões não são passíveis de recurso, são de cumprimento obrigatório e prevalecem sobre as dos tribunais e demais autoridade.
A esperança neste órgão deve-se ao facto de os partidos políticos terem interposto recursos junto dos Tribunais de Distrito, local onde ocorreram os “ilícitos” eleitorais e estes Tribunais, em alguns casos, terem indeferido esses recursos e, noutros, apesar de haver recursos em curso, a CNE ter já apresentado aquilo que designou de resultados das eleições de 2023 e atribuído mandatos aos concorrentes, quando, na verdade, existem recursos correndo os trâmites legais, pois, há casos em que os Tribunais decidiram pela recontagem de votos e outros ainda pela anulação de todos os actos, por divergências graves entre os editais de uns e outros.
A instabilidade que se criou com o anúncio dos resultados eleitorais, fazendo fé à liderança do maior partido da oposição e sua liderança, vai continuar, por via de manifestações e o meu receio é que estas manifestações degenerem em caos, devido à “fúria” popular, como se viu na manifestação de 26 de Outubro de 2023. Alguns cidadãos recorreram a arrombamento de estabelecimentos comerciais, vandalização de bens públicos e privados, de cujos danos, certamente, não serão ressarcidos.
Há o princípio, segundo o qual, os juízes decidem com base na Lei e sua consciência, independentemente daquilo que a Lei determina, sem violar as normas. Nesta senda, os juízes do Conselho Constitucional devem chamar a sua consciência para a tomada de decisão destes casos, tendo em conta que as suas decisões não são recorríveis. O Conselho Constitucional deve, na minha opinião, trabalhar para evitar que o pior aconteça em solo pátrio. Aqui, não é somente a legalidade que está em causa, é também a justiça, o que parece contraditório, mas não é. A Lei pode determinar uma coisa, mas aquilo que é justo de se fazer ser outra.
Adelino Buque