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terça-feira, 05 fevereiro 2019 05:00

Cabo Delgado: os bodes expiatórios da incapacidade do Governo

Não é segredo que a intensificação dos ataques em Cabo Delgado está a provocar sérios embaraços ao regime, levando-o a procurar bodes expiatórios face à sua incapacidade em travar as incursões dos grupos armados naquela província. Apesar do optimismo que tem transparecido no discurso dos dirigentes, Presidente da República incluído, a verdade é que as forças de defesa e segurança enfrentam sérias dificuldades no combate aos que quando iniciaram os primeiros ataques em finais de 2017 em Mocímboa da Praia foram rotulados de criminosos aventureiros sem qualquer motivação.

 

 Como exemplo da procura de bodes expiatórios para a guerra (porque de guerra se trata, ainda que se tente suavizar com os já conhecidos sofismas) em Cabo Delgado, na sua edição de hoje o matutino pró-governamental Notícias insere um artigo sobre quatro supostos logísticos que foram detidos pela Polícia. Os visados são indiciados de fornecer armamento de guerra e vestuário aos grupos de atacantes que actuam nos distritos do norte da província de Cabo Delgado. Adianta o Notícias que os ‘logísticos’ em causa, identificados pelos nomes de Ussene Juma (36 anos), Domingos Máquina (23), Aine Idrisse (30) e Xavier Shacabaceni (54), sendo estes dois últimos irmãos, confessaram ser originários de Macomia de onde se deslocavam até à província de Nampula para levar caixas e outro material contendo armas, munições e vestuário destinados aos atacantes que actuam em vários pontos de Cabo Delgado.

 

 Segundo o “Notícias”, Juma, Máquina, Idrisse e Shacabaceni ficavam à espera das encomendas enviadas nos autocarros a partir de Nampula para a vila-sede de Macomia. Já em poder das encomendas, os quatro saíam à calada da noite para um ponto combinado não muito distante da vila de Macomia, onde deixavam as caixas, sacos e pastas contendo o material bélico e vestuário que mais tarde era recolhido por outros integrantes do grupo. O quarteto justifica a não denúncia da sua actividade à Polícia pelo receio de uma eventual vingança, através do assassinato dos denunciantes, a ser protagonizada pelos grupos dos atacantes em Cabo Delgado, conforme ameaça feita por um dos cabecilhas.

 

Outros bodes expiatórios

 

O primeiro sinal público da tentativa das forças governamentais de encontrar bodes expiatórios para o conflito armado em Cabo Delgado foi a detenção do empresário sul-africano Andre Hanekon, acusado de conivência com os protagonistas dos ataques em alguns distritos daquela província. Hanekon morreu recentemente em circunstâncias ainda por esclarecer, apesar de a autópsia dos serviços de medicina legal do Hospital Provincial de Pemba apontarem para ‘causas naturais’.

 

 Mas a família do falecido empresário sul-africano exige das autoridades moçambicanas uma nova autópsia imparcial e transparente, para que se saiba exactamente o que aconteceu. Antes da sua morte, Hanekon estava detido na cadeia de máxima segurança em Pemba, para onde tinha sido levado depois de um malabarismo judicial que se seguiu ao seu aparentemente encenado rapto num hotel no distrito de Palma, do qual contraíu ferimentos graves que foram o motivo do seu internamento num hospital rural antes de ser transferido para o Hospital Provincial da capital de Cabo Delgado.

 

Numa clara demonstração da impotência dos órgãos judiciais perante o regime, Andre Hanekom continuou detido mesmo depois de o tribunal ter emitido um documento autorizando a sua saída em liberdade condicional, mediante pagamento de uma caução.  A ordem do tribunal foi pura e simplesmente ignorada pelas forças de defesa e segurança! Outro bode expiatório do regime perante a sua impotência em descobrir o ‘remédio’ para a guerra em Cabo Delgado é o jornalista Amade Abubakar, detido pela PRM e depois entregue aos militares, quando em Macomia entrevistava pessoas fugindo dos ataques. Numa clara violação da liberdade de imprensa, e também no que pode ser entendido como uma vergonhosa subserviência da Justiça ao regime, Abubakar continua encarcerado em Pemba à espera de julgamento, apesar das fortes pressões internas e externas para a sua imediata libertação. (Humberto Mandlate)

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