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quinta-feira, 21 novembro 2024 07:10

Eleições 2024: Das marchas às buzinadelas, Moçambique em manifestações populares há um mês

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Passam hoje, 21 de Novembro de 2024, 32 dias após o início das manifestações populares, convocadas pelo candidato presidencial Venâncio António Bila Mondlane, em protesto contra os resultados das eleições do dia 09 de Outubro, que dão vitória à Frelimo, partido no poder, e seu candidato Daniel Chapo, com mais de 73% dos votos.

 

Convocadas, inicialmente, em forma de greve geral, com intenção de paralisar a actividade económica, as manifestações logo cedo tornaram-se de rua e generalizadas, por um lado, por conta do assassinato bárbaro do advogado Elvino Dias e do mandatário do PODEMOS, Paulo Guambe, e, por outro, devido à intransigência da Polícia em permitir marchas pacíficas nas ruas de Maputo.

 

primeira convocatória às manifestações foi anunciada no dia 16 de Outubro (uma quarta-feira) pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, numa comunicação à nação feita através da sua página oficial do Facebook. A convocatória visava apenas a paralisação da actividade económica em todo o país e foi feita dias depois de as Comissões Provinciais de Eleições anunciarem a vitória da Frelimo e Daniel Chapo nas eleições presidenciais, legislativas e provinciais, contrariando os resultados da contagem paralela do PODEMOS, que dão vitória ao partido e ao seu candidato.

 

“Este é o momento chegado para anunciar, a todo o povo moçambicano, o passo a seguir (…): vamos começar nesta segunda-feira [21 de Outubro]. Quando forem 00h00, acionamos uma greve nacional geral, paralisação de toda a actividade pública e privada do Rovuma ao Maputo e do Zumbo ao Índico, em todo o território nacional”, anunciou, afirmando que o dia devia servir também para exibição de cartazes de repúdio à ditadura instalada no país há 50 anos.

 

No entanto, o assassinato do advogado e mandatário de Venâncio Mondlane, Elvino Dias, e do mandatário do PODEMOS (partido que suporta candidatura presidencial do político), Paulo Guambe, na noite do dia 18 de Outubro (dois dias depois do anúncio da greve geral), mudou o rumo da primeira convocatória, passando para uma marcha pacífica em repúdio não só aos resultados eleitorais, mas também ao duplo homicídio.

 

“Vai ser a primeira etapa, pacífica, em que nós vamos paralisar toda a actividade pública e privada. Vamos para a rua com os nossos cartazes, vamos manifestar o nosso repúdio”, anunciou o político, no sábado do dia 19 de Outubro, após visitar o local onde o seu assessor jurídico foi crivado com 25 balas.

 

A segunda-feira chegou e centenas de jovens apoiantes do candidato deslocaram-se à Praça da OMM (local onde ocorreu o duplo homicídio) com o objectivo de marchar em repúdio ao assassinato de Elvino Dias e Paulo Guambe. No entanto, no lugar de contar com a escolta da Polícia, os manifestantes encontraram nos homens da lei e ordem uma barreira humana por transpor.

 

Armadas e transportadas em BTR, as diferentes especialidades da PRM (Polícia da República de Moçambique), com destaque para Unidade de Intervenção Rápida, começaram a lançar gás lacrimogéneo e a deter ilegalmente dezenas de cidadãos. Da acção policial, não escaparam o candidato presidencial e os jornalistas, que também foram obrigados a inalar o fumo do gás lacrimogéneo e em directo em televisões estrangeiras, como a portuguesa RTP e a alemã DW.

 

Com o lançamento do gás lacrimogéneo sobre os manifestantes, ao candidato presidencial Venâncio Mondlane e jornalistas, começou o caos, que se espalhou por diversos bairros da capital do país, com destaque para os bairros de Maxaquene, Urbanização, Mafalala, Munhuana, que foram os primeiros “marcos” da resistência contra a brutalidade policial.

 

Marcha nos bairros e “os 25 dias de terror”

 

Cumprido o primeiro dia da manifestação, cuja marcha foi impedida pela Polícia, Venâncio Mondlane anunciou o prosseguimento das marchas, mas com a particularidade de estas serem realizadas em todos os bairros e distritos, como forma de evitar bloqueios da Polícia. O plano, disse, era proporcionar 25 dias de terror ao Governo da Frelimo, em homenagem às 25 balas descarregadas sobre Elvino Dias e Paulo Guambe.

 

A segunda fase, tal como foi apelidada por Venâncio Mondlane, decorreu nos dias 24 e 25 de Outubro, em todo o país, tendo se prolongando até ao dia 26 em alguns distritos, como foi o caso do distrito de Mecanhelas, no Niassa, onde a Polícia matou e feriu cidadãos sob olhar impávido e cúmplice dos membros da Frelimo, que iam comemorando a chacina dos seus compatriotas.

 

Foi nesta fase em que se assistiu aos primeiros casos de incêndio de unidades policiais, viaturas e sedes do partido Frelimo. Os bairros Luís Cabral, na Cidade de Maputo, e Trevo, na Matola, foram pioneiros no arremesso de pedras e queima de viaturas de particulares, enquanto na Localidade de Chalaua, distrito de Moma, província de Nampula, queimava-se Posto Policial e viatura da Polícia.

 

Com as manifestações populares a atingirem níveis assustadores – com a Polícia a executar pessoas a sangue frio e com os manifestantes a destruírem bens públicos e privados – o Governo começou a restringir o acesso à internet móvel e a bloquear as redes sociais. O ensaio da medida ditatorial começou no dia 25 de Outubro (sexta-feira) e materializou-se, com maior incidência, a partir do dia 31 de Outubro, no início da terceira fase das manifestações.

 

Aliás, a terceira fase, que durou oito dias, começou no dia 31 de Outubro e prolongou-se até ao dia 07 de Novembro. Nesta fase, os manifestantes foram orientados a marchar para a capital do país, com objectivo de ocupar as principais avenidas de Maputo. Os que não podiam deslocar-se à Cidade de Maputo, deviam manifestar-se em frente às sedes da Frelimo e dos órgãos eleitorais a nível distrital e provincial.

 

A marcha sobre Maputo teve lugar no dia 07 de Novembro, o último dia das manifestações nesta fase. Neste dia, a Avenida Eduardo Mondlane recebeu centenas de jovens oriundos de diversos bairros de Maputo e Matola e viu, pela primeira vez, o fumo negro da queima de pneus. Houve barricadas colocadas pelos manifestantes numa das maiores avenidas da capital.

 

Milhares de manifestantes foram bloqueados à entrada do centro da cidade de Maputo, concretamente nos cruzamentos das Avenidas Joaquim Chissano e Acordos de Lusaka, assim como junto à Praça da OMM. Igualmente, a Polícia impediu a entrada de centenas de jovens na cidade de Maputo, oriundos de diversas províncias do país.

 

Nesta fase, uma das mais violentas desde o início das manifestações (com maior número de casos de baleamento de civis por Polícias e de vandalização de bens públicos e privados), um agente da Polícia (que estava a paisana) foi morto pelos manifestantes com “pedradas” no Município da Matola, por alegadamente ter assassinado uma criança. Já a Fronteira de Ressano Garcia foi incendiada depois de um agente da Migração ter alegadamente matado um protestante.

 

A internet móvel, neste momento, começou a ser fornecida durante quase 11h por dia (entre as 08h00 e as 19h00), pois, à noite havia um “recolher obrigatório digital”. O acesso às redes sociais era feito com recurso à rede privada virtual, uma alternativa que continua actual em algumas horas do dia.

 

Até esta fase, sublinhe-se, a violência era assistida, com maior incidência, nas cidades de Maputo, Matola, Nampula, Nacala-Porto e Tete e nos distritos de Mecanhelas e Moma. Com menor expressão, também tinha sido registada na Cidade de Chimoio, em Manica.

 

“Panelaço” à noite e buzinadelas ao meio-dia

 

Concluídos os primeiros 11 dias de “terror”, Venâncio Mondlane convocou a quarta e última fase das manifestações que, nas suas palavras, seria dividida em diversas etapas, sendo que a primeira decorreu entre os dias 13 e 15 de Novembro, com objectivo único de bloquear portos, fronteiras e marchar nas capitais provinciais.

 

Com o espetro da violência a pairar, os portos de Maputo, Nacala-Porto e Matola estiveram quase encerrados, enquanto o da Beira funcionava a “meio-gás”. Já as fronteiras também funcionavam a “meio-gás”, excepto a de Ressano Garcia, na Moamba, que esteve encerrada durante as tardes e noites dos três dias e condicionada ao longo das manhãs.

 

A maior fronteira terrestre do país esteve literalmente tomada pelos manifestantes durante os três dias, que até tornaram o asfalto da Estrada Nacional Nº 4 em pista de dança. Nem o contingente militar enviado àquele posto fronteiriço foi capaz de intimidar os protestantes que, aliás, iam desfilando lado-a-lado com as diversas especialidades da Polícia e das FADM (Forças Armadas de Defesa de Moçambique).

 

Logo no primeiro dia da nova etapa das manifestações, a província da Zambézia entrou em cena, com a Polícia a impedir a marcha de apoiantes de Manuel De Araújo, Edil de Quelimane, lançando gás lacrimogénio e disparando balas de borracha e reais sobre os manifestantes. Acção causou tumultos e um adolescente de 16 anos de idade foi assassinado pela Polícia, quando se encontrava num mercado a comprar roupa usada para revender.

 

Já no distrito de Inhassunge, ainda na Zambézia, terra donde Elvino Dias é natural, manifestantes incendiaram o Comando Distrital da Polícia, duas viaturas (uma da Polícia e outra do STAE) e mataram o Vice-Presidente da Comissão Distrital de Eleições, indicado pela Frelimo.

 

Quando eram 21h00 de sexta-feira, 15 de Novembro, último dia das manifestações nesta fase, as panelas, vuvuzelas, apitos, latas e tambores entravam também no lote de meios de protesto, com a estreia do “panelaço” a nível dos bairros suburbanos de Maputo e Matola, depois de as mesmas terem soado no centro da Cidade de Maputo na noite do dia 04 de Novembro.

 

O festival da panela prolongou-se até segunda-feira e, na tarde da última terça-feira, Venâncio Mondlane anunciou um luto nacional de três dias em homenagem aos “mártires do panelaço”. O líder “espiritual” das manifestações explicou que, durante o luto, que decorre até amanhã, os manifestantes deverão trajar-se de preto e, ao meio-dia, os condutores devem paralisar as suas viaturas e buzinar por 15 minutos, enquanto os peões levantam os cartazes. Já pelas 21h00, as famílias deviam retomar o “panelaço”.

 

Dados recolhidos por organizações da sociedade civil em todo o país indicam que os protestos já causaram a morte de pelo menos 50 pessoas, na sua maioria civis assassinados pela Polícia. Até ao dia 05 de Novembro, a Associação Médica de Moçambique reportava 108 baleamentos, dos quais 16 haviam resultado em óbitos. Igualmente, reporta-se mais de 500 detidos.

 

No entanto, nesta terça-feira, o Presidente da República reportou a morte de 19 pessoas, das quais cinco polícias, e o ferimento de 807 pessoas, entre elas, 66 agentes da Polícia. Não revelou o número de detidos. Defendeu que os confrontos entre a Polícia e os manifestantes deveram-se à falta de observância de alguns pressupostos de uma manifestação.

 

Este é o retrato dos primeiros 15 dias das manifestações, que completam hoje 32 dias desde o seu início. Até amanhã, o país irá contabilizar 17 dias de manifestações, de um total de “25 dias de terror” anunciados por Venâncio Mondlane.

 

Até à sua última actualização, no dia 12 de Novembro, o Presidente da CTA (Confederação das Associações Económicas de Moçambique) anunciava um prejuízo de 24,8 mil milhões de Meticais à economia moçambicana, dos quais 2,8 mil milhões de Meticais frutos de vandalização. (Abílio Maolela)

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