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quinta-feira, 07 março 2019 06:17

Zucula diz que a sua única “culpa” foi confiar nos órgãos do IACM

Arrancou esta quarta-feira (06) no Tribunal Judicial do Distrito Municipal KaNhlamankulu, em Maputo, o julgamento do antigo ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula. No processo nº 457/17, do mês de Maio em 2009, Zucula é acusado de ter ordenado o pagamento de renumerações indevidas ao Conselho de Administração do Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IACM), no valor de 2.250 mil Mts, sem ouvir na altura seu colega das Finanças, Manuel Chang. De acordo com o Ministério Público, Paulo Zucula autorizou o reajuste dos subsídios dos membros do Conselho de Administração do IACM, de 2000 USD para 400 USD mensais para o PCA, na altura Aníbal Samuel, e de 1500 USD para 3000 USD para os restantes membros, sem o parecer do ministro que superintendia a área das finanças.

 

Na sua primeira intervenção em sede do julgamento, Zucula disse não ter conhecimento de como ocorreram os referidos pagamentos. Acrescentou que quando tomou posse como ministro dos Transportes e Comunicações, em 2008, soube que o regulador da Aviação Civil (IACM) enfrentava vários problemas, e que um deles dizia respeito ao fraco desempenho institucional devido a uma alegada falta de motivação, o que na sua óptica tratando-se de uma instituição que zela pela segurança aeronáutica impunha-se resolvê-los.

 

Alega-se que na altura existiam “guerras internas” entre os membros da Direcção do IACM, e que as remunerações não estavam sendo pagas por ter sido interrompida a contribuição dos Aeroportos de Moçambique, empresa que era a responsável pelo processo. Questionado pela juíza de causa, Zvika Cossa, sobre o método usado para autorizar remunerações, Paulo Zucula respondeu que o procedimento não clarifica que era da sua responsabilidade ouvir ou remeter o expediente do na altura ministro das Finanças, mas sim do requisitante.

 

Sustentando a sua defesa, Zucula afirmou que o IACM tem uma autonomia técnica, financeira e patrimonial, possuindo, por isso, Gabinete Jurídico e Conselho Fiscal, órgãos que teriam alertado aos executivos daqueles órgãos sobre eventuais irregularidades. “É meu entendimento que não era minha competência aprovar/autorizar aqueles pagamentos. Não sei como era tratado o assunto com o anterior ministro”, disse o antigo ministro dos Transportes e Comunicações no período 2008-2013, fazendo referência ao facto de os primeiros subsídios terem sido autorizados pelo seu antecessor António Munguambe.

 

"O requerimento era dirigido a mim e não ao ministro das Finanças. O resto era da responsabilidade do IACM”, frisou Paulo Zucula. No entanto, admitiu que os procedimentos administrativos daquela natureza na Função Pública envolvem diversas instituições. Adiantou ter entendido, naquele caso, que a Autoridade de Aviação Civil não tinha reunido todos os requisitos para efectuar os pagamentos.

 

Papel do antigo Gabinete Jurídico de Zucula

 

Questionado sobre o papel do seu Gabinete Jurídico naquele tipo de situações, Paulo Zucula afirmou que sempre dedicou-se aos assuntos relacionados com os contratos e concessões, não tratando de assuntos relativos a salários e/ou subsídios das instituições por ele tuteladas, uma vez que cada delas tem o seu Gabinete Jurídico.“Não era minha intenção impedir que o documento seguisse os trâmites legais. Alguém o fez. O IACM tem toda a competência técnica para perceber como devem ser tramitados os expedientes”, afirmou.

 

Acrescentou que era necessária a sua autorização, mas que esta não era suficiente para o IACM fazer os pagamentos em causa. “É o mesmo que acontece com um cheque que precisa de duas assinaturas, que não pode ser pago apenas com uma”, argumentou, reiterando ter confiado nos órgãos do IACM, nomeadamente os Conselhos de Administração e Fiscal, e também no Gabinete Jurídico.

 

Respostas “confundiram” a juíza

 

“Confusa” com as respostas do arguido, a juíza de direito confrontou-o com as suas declarações durante a instrução preparatória, quando admitiu ter sido induzido em erro devido à forma como o documento vinha explanado. O mesmo entendimento tem a antiga chefe de Gabinete do antigo ministro dos Transportes e Comunicações, Ema Chicoco, que na qualidade de Declarante confirmou ter transcrito o despacho do seu chefe para o IACM, convicta de que este era competente para tal acto.

 

Entretanto, entendimento diferente foi manifestado pelo então PCA do IACM, Aníbal Samuel, um dos beneficiários desses subsídios, que também na qualidade de Declarante confirmou ter submetido a proposta de alteração dos subsídios ao Gabinete de Paulo Zucula devido à necessidade que existia de melhorar as condições dos membros do CA, pois este órgão já exercia funções executivas no mandato de António Munguambe, reunindo três a quatro vezes por ano. Samuel disse que cabia a Paulo Zucula a competência de remeter ao Ministério das Finanças o documento e não à instituição que dirigia. Argumentou que o IACM é tutelado pelo Ministério dos Transportes e Comunicações, e não pelo das Finanças.“Nós só executamos o despacho do ministro que tutelava a nossa instituição”, disse, acrescentando que os subsídios pagos até àquela altura tinham sido aprovados pelo então ministro, com o parecer do seu colega das Finanças, e que o documento foi submetido pela sua instituição.Questionado sobre os critérios usados para o cálculo dos subsídios, Samuel disse que os mesmos resultaram de um estudo encomendado para o efeito, que teve apoio do Ministério, na altura dirigido por Paulo Zucula.

 

Ministério Público na ofensiva

 

Quem também atirou “pedras” a Paulo Zucula foi o Ministério Público, que quer vê-lo responsabilizado pelo acto por entender ser grave um ministro não ter conhecimento dos procedimentos administrativos, apesar de dispor de um Gabinete Jurídico para o efeito. Mas a defesa do antigo ministro considera injusto condenar o seu constituinte por um acto que nunca foi declarado ilegal. É entendimento de Damião Cumbana, advogado de defesa, que o despacho exarado por Paulo Zucula devia ter sido revogado, caso fosse considerado ilegal. “Pelo contrário, foi melhorado pelos seus sucessores”, disse o advogado, sublinhando que a decisão não tinha qualquer intenção de lesar o Estado, até porque o arguido não beneficiou de um único centavo no caso. Por isso, Cumbane acredita na absolvição do seu cliente, mas para tal pede ao Tribunal que analise o processo de cabeça fria e não com paixões, como aconteceu nos casos anteriores.

 

Mais pagamentos adiantados

 

O Processo 457/17, no qual Paulo Zucula é acusado de pagamentos indevidos, conta com outros arguidos provenientes do IACM, acusadas de pagamentos adiantados de salários e subsídios. Trata-se da antiga administradora não-executiva no IACM (2006-2012), Teresa Jeremias; a antiga directora-geral, Lucrécia Ndeve (2007-2010) e antiga a responsável pelo Departamento de Administração e Finanças, Amélia Dalane (2008-2010).

 

Segundo esclarecimentos do Tribunal, a fusão dos processos deriva da “economia processual”, tendo em conta que os factos ocorreram na mesma instituição e no mesmo ano. Teresa Jeremias é acusada de não ter reembolsado um crédito de 33 mil Mts, transferidos a favor das Linhas Aéreas de Moçambique, em 2009, para a compra de passagens para àquela Administradora, sua irmã e seu sobrinho para a província de Niassa, onde ia participar no funeral do irmão.

 

Lucrécia Ndeve é acusada de ter mandado emitir, igualmente em 2009, um cheque de adiantamento salarial a seu favor sem qualquer autorização. Amélia Dalene é acusada de cumplicidade por ter emitido cheques sem nenhuma autorização. As acusadas refutam as acusações que pesam sobre elas, com a justificação de que os pagamentos foram devidamente autorizados, e que o valor foi reembolsado. Teresa Jeremias refere que o reembolso do valor estava condicionado ao pagamento do seu subsídio (pago um ano e meio depois), enquanto Lucrécia garante ter pago no mês seguinte, após recepção do valor (Agosto). A leitura da sentença está marcada para o dia 25 de Março. (Abílio Maolela)

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