O Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA), organização não-governamental, acusou o tribunal que julga um caso de corrupção que envolve uma antiga ministra moçambicana de “grave atropelo”, por impedir a captação de imagem e som.
“O MISA Moçambique entende que esta postura do tribunal, para além de violar a liberdade de imprensa e o direito à informação proclamados no artigo 48 da Constituição da República de Moçambique, representa um grave atropelo ao princípio da publicidade das audiências”, refere um comunicado de imprensa a que a Lusa teve hoje acesso.
Na nota, o MISA avança que o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo proibiu os jornalistas de filmarem e gravar o julgamento do caso em que a antiga ministra do Trabalho Helena Taipo e mais dez arguidos são acusados de desvio de mais de 113 milhões de meticais (1,6 milhões de euros) do Estado.
Segundo a organização, o tribunal começou por pedir a retirada dos jornalistas da sala de audiências, na terça-feira, primeiro dia do julgamento, tendo depois permitido o seu regresso “mediante negociações”.
As “negociações” passavam pela imposição de que não podiam ser captadas imagem e som durante os trabalhos.
“O MISA faz lembrar que só é possível aos media realizarem o seu trabalho sem restrições, quando munidos dos seus instrumentos de trabalho [equipamentos de captação de imagens, de som, entre outros]. A ausência de um destes instrumentos não permite a difusão de informação com o rigor que carateriza a profissão”, observa aquela organização.
A alegação de que o tribunal dispõe de prerrogativas legais que podem vedar a publicidade do julgamento, quando tal se julgar pertinente, é totalmente descontextualizada e fere de forma grosseira a Constituição da República, prossegue-se na nota.
“O MISA apela, por isso, a que o tribunal reconsidere a decisão restritiva por si tomada e reponha a lei, a bem da transparência do julgamento e do direito à informação dos cidadãos, legal e constitucionalmente consagrados”, lê-se no texto.
Os limites da cobertura jornalística dos julgamentos em Moçambique é matéria de grande controvérsia, com alguns juízes a assumirem que a lei apenas permite a tomada de notas, outros a aceitarem a gravação e som para transmissão em diferido e outros a entenderem que é autorizada a transmissão em direto das audiências de julgamento.
O juiz do caso das dívidas ocultas, considerado o maior julgamento na história de Moçambique, permitiu a transmissão em direto das audiências, defendendo o direito do povo à informação.
O Tribunal Judicial da Cidade de Maputo começou na terça-feira a julgar a antiga ministra do Trabalho Helena Taipo e mais 10 arguidos por alegada participação no desvio de 1,6 milhões de euros do Estado.
A antiga ministra (2005-2015) da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) e outros 10 suspeitos são acusados de ter desviado aquele montante das contas da Direção do Trabalho Migratório (DTM), uma das entidades na altura tuteladas por Taipo.
A antiga ministra é ainda acusada noutro caso de ter recebido cerca de 100 milhões de meticais (1,4 milhões de euros) de subornos em 2014.
Os alegados subornos corresponderiam a contrapartidas pelo favorecimento de empresas de construção civil e do setor gráfico em contratos com o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), entidade que a então ministra também tutelava.(Lusa)