Conheci-o em miúdo pelos ecrãs da televisão e quis a rota da vida que trilhasse os seus ofícios e nos tornássemos amigos. Simião Ponguane era um profissional de características humanas incríveis: sem complexos de geração nem de concorrência, principalmente os que se geraram entre a TVM e STV, quando esta última emergiu; um jornalista todo-o-terreno e de todos os temas; uma fortaleza de integridade moral e ética.
Enquanto os jornalistas da sua época “reformavam” do chamado jornalismo de rua, Simião Ponguane mantinha-se presente, por convicção e profissionalismo, para cobrir fosse política, economia, sociedade ou cultura. Certa vez, enquanto jornalista de economia, fui destacado para cobrir a apresentação dos resultados económico-financeiros da Mozal. Dez minutos antes do evento, lá estava o Simião Ponguane humilde, com o seu pulôver, microfone nas mãos e bloco de notas preenchido de perguntas provocatórias. Com aquele sorriso falso, interrompido com questões embaraçosas, obrigou a Mozal a ir a fundo e facilitou a vida dos colegas jornalistas que, a partir das suas questões, obtiveram linhas de abertura de jornal.
Não me sai da memória a parte introdutória da peça de Simião Ponguane: “O gigante Mozal tremeu, mas não caiu”, um recurso à figura de estilo para resumir as dificuldades transitórias atravessadas pela empresa.
Aberto a formas diferentes de pensar, outra vez me ligou: “Oh, Mucipo, que entrada fulminante para o teu debate na espectaculosa!!! – é assim que gostava de chamar a STV –. Isso é que é ser jornalista: incomodar e sacudir a poeira. Peço-te, envia-me os dados e as fontes do teu tema, hei-de querer seguir para os meus programas”.
No trabalho de televisão, o jornalista e o operador de câmara funcionam como gémeos siameses. Era habitual ver Simião Ponguane, mais velho e mais experiente, com o tripé pesado nas mãos e em plena sintonia com o seu operador de câmara, enquanto nós, os mais jovens, resmungávamos e discordávamos dos papéis de cada um. Ele ignorou os caprichos e “protocolos” de Director de Informação e continuou a fazer trabalho de rua com o tripé nas mãos, mantendo-se assim na África do Sul, quando foi enviado como correspondente.
Uma outra vez, coincidimos numa viagem internacional e, já o conhecendo, antecipava momentos disruptivos. Por razões de organização, fomos informados de que ficaríamos mais um dia, para completar o trabalho no tal país. Simião Ponguane logo se insurgiu e obrigou a organização a elaborar uma carta ao PCA da TVM, Armindo Chavana à época, para que fosse autorizado a estender a viagem. Simião Ponguane era assim: pontual, honesto, vertebrado e com um exagerado respeito institucional, chegando a devolver as ajudas de custo das viagens à contabilidade da TVM, caso sobrassem ou, por alguma razão desconhecida, fossem acrescidas.
A TVM era o seu grande amor, mas por ter sido fiel à profissão que escolheu, foi conduzido ao ostracismo. Nos últimos anos, já castigado pela doença, lamentava o condicionamento aos órgãos de comunicação social e lembrava com saudades os momentos de liberdade em que o lápis azul deixava espaços de respiração.
Encarou o maldito cancro com a coragem que sempre o acompanhou no jornalismo. Fiquei a dever-lhe uma visita no seu rancho, no bairro da Matola Gare, onde se refugiou para a convalescença. Terá de ser noutro lugar! Vá em paz, Simião Ponguane. A luta continua!!!
A indústria de produção de óleo em Moçambique tem, na minha opinião, o desafio de ombrear com os maiores “players” da área no mundo. Antes de 2007, altura em que se decidiu isentar alguns produtos alimentares, incluindo o óleo, até esta parte, o que terá feito o Governo para que a indústria nacional pudesse ter acesso à matéria-prima, sabido que, antes disso, a produção destas oleaginosas era exclusivamente para a exportação.
Por outro lado, os produtores de oleaginosas, como Girassol, Gergelim e Soja, são produtores familiares que recebem os insumos agrícolas dos fomentadores. São os fomentadores que determinam o destino da produção. O Governo de Moçambique terá feito essa análise e, se sim, qual terá sido a conclusão. Colocar o produtor nacional a competir na compra dessa matéria-prima com os industriais da China e Índia, grosso modo, destino da nossa produção?
O Governo e os governantes devem deixar de pensar que as “potencialidades” se comem. As pessoas não comem “potencialidades”, as pessoas comem os produtos que saem da terra que tem potencialidade de produzir e o processo de produção é bastante complexo. Quando o governo decidiu alavancar a indústria do açúcar, assim o fez. Lembram-se do que se fez? Hoje, a indústria do açúcar pode ombrear com qualquer indústria da região, mas houve trabalho de base, inclusive, desenvolvido de forma multilateral e com apoio do estrangeiro. As oleaginosas não merecem o mesmo apoio? Veja abaixo as constatações de governantes e outros interessados.
“Quase a totalidade importa o óleo bruto e faz a refinação em território nacional. O objectivo era usar a nossa soja, o girassol e o algodão. Pelo contrário, fomentamos a criação de refinarias. Nós não queremos continuar a potenciar essa veia de negócios”.
Silvino Moreno, citado pelo Jornal Notícias, edição nº 32.189 de 19 de Março de 2024
“Hoje em dia, cerca de 70 a 80% do óleo consumido em Moçambique é de palma e isso não é só em Moçambique; se olhar para todo o mundo, mais de 60 a 70% do óleo consumido é de palma e todos nós sabemos que a sua produção exige determinadas condições agroclimáticas encontradas maioritariamente no sudoeste da Ásia. Nós não temos essas condições agroclimáticas para a sua produção e a única opção que nos resta é migrar do óleo de palma para abraçar as oleaginosas que são economicamente benéficas, tanto para o produtor como para o consumidor. Se isso acontecer, então aí temos uma oportunidade e, sim, deve começar de algum lado e precisamos, digamos, de cinco a 10 anos a contar a partir de agora”.
Shridhar Krishnan, vice-presidente e Director-geral da OLAM para África Austral
“O país tem potencial para gerar um volume de negócios anual de dois biliões de dólares, nos próximos três anos, com base nas oleaginosas e seus derivados. O facto foi tornado público hoje, em Maputo, pelo Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, na cerimónia de divulgação das oportunidades da Cadeia de Valor das Oleaginosas.”
In Celso Correia, Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, citado pela RM 28/02/2022
A isenção do IVA nos produtos de primeira necessidade, como é o caso de óleo alimentar, sabão e açúcar, foi decretada em 2007 e com o seu fim para Dezembro de 2023. Aos olhos do comum cidadão, o período foi longo e, de facto, algo deveria ter mudado em Moçambique. No entanto, é preciso olhar para o estágio do mercado nessa área, antes e depois da isenção, sobretudo, o que terá sido feito para que o cenário mudasse!
Primeiro, é preciso dizer aqui e agora, de forma clara e objectiva, que a produção das oleaginosas aqui indicadas, Gergelim, Girassol e Soja, é feita por pequenos produtores familiares, através do fomento, praticado por Empresas, com interesse na exportação dessas oleaginosas, pelo que não se trata de um produto produzido para depois se procurar o mercado e vender. Os fomentadores destas culturas têm os potenciais compradores internacionais posicionados para a aquisição do produto, por isso não se trata de negócio pequeno, é negócio de biliões de USD e como é que o produtor industrial consegue a compra destas oleaginosas!
Se calhar, aqui seria de questionar se houve algum trabalho que visasse a protecção da indústria nacional de óleos na aquisição da matéria-prima local! Se não, como é que uma indústria emergente moçambicana pode competir com os compradores destas matérias-primas a nível do mundo. Será que os nossos governantes desconhecem essa realidade? Ou esperavam que os fornecedores de insumos aos produtores familiares, que o fazem com o objectivo de, a posterior, recolher a produção e exportar, deveriam fazer para a entrega na indústria local? E qual seria o benefício destes? Sim, porque, pelo que se sabe, o nosso Governo não investe na produção de qualquer cultura alimentar e muito menos na produção das oleaginosas. Como disse, trata-se de produção, maioritariamente, familiar, com base no fomento!
O Governo de Moçambique é especialista em descobrir “potencialidades”, mas nunca se questiona sobre como transformar essas “potencialidades” em real produto para fornecer ao mercado e fazer com que os moçambicanos tenham acesso a preços baratos. Senhores do Governo de Moçambique, as “potencialidades” não se comem, as pessoas não vendem “potencialidades”, vendem um produto concreto, palpável e que possa ser medido e transformado. Ver “potencialidades” em tudo é bom, a questão é o que acontece depois da constatação.
Adelino Buque
“Se fores ao novo Município da Matola-Rio questionar aos Munícipes de lá, logicamente, dirão: “estávamos bem sem a municipalização”, tal é o desencanto com aquela instituição democrática. Mas se fores à cidade de Chimoio fazer a mesma pergunta, a resposta será certamente oposta. O mesmo pode acontecer com os munícipes da Beira, que dirão, certamente, “valeu a municipalização”. A minha questão é ao nível da Organização dos Municípios, pois não se faz estudo de bons casos e de maus casos! Espero que a desilusão não me bata à porta!”
AB
Fiquei muito curioso quando abri a “Carta do Dia”, edição nº 1324, de 18 de Março de 2024, na primeira página, secção de política, com o título “Índice de desenvolvimento humano caiu nos últimos 10 anos”. Na mesma secção (política) vem outra matéria que diz: “aumenta preferência pela ditadura em Moçambique”, segundo o Relatório do PNUD de 2022, publicado na última sexta-feira, 15 de Março de 2024.
Devo destacar que tanto o IDH – Índice de desenvolvimento Humano como a preferência dos moçambicanos pela ditadura são da lavra do PNUD – Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento, uma instituição credível, até provas em contrário, até porque tem estado envolvido no apoio humanitário em Moçambique, pelo que estou em crer que não existe nada de mal nas suas constatações. Vamos por partes:
Índice de Desenvolvimento Humano caiu nos últimos 10 anos: se estivermos atentos ao desenvolvimento humano em Moçambique, esta cifra não surpreende, pode até surpreender pela positiva, pelo facto de ter subido três graus, mas logo vem a explicação desse facto, não tanto por mérito de Moçambique, mas por demérito da Serra Leoa, Iémen e Burkina Faso. O mau desempenho destes três países permitiu que Moçambique estivesse onde está hoje.
Não sendo propriamente novidade que o nosso Índice de Desenvolvimento Humano tende a cair, posso estar equivocado, mas parece-me haver pouco desempenho, no sentido de sairmos desse estágio. É que, segundo esse Relatório, Moçambique é o 11º pior país para se viver dos 193 países avaliados pelo PNUD. Isto não abona para os moçambicanos e pode ser o péssimo cartão-de-visita para o país. A questão é: afinal o que se passa na nossa Pátria Amada!
A segunda parte e mais curiosa é a preferência dos moçambicanos pela ditadura e aqui impõe-se uma reflexão séria sobre todas as nossas instituições democráticas. Quando os cidadãos inquiridos dizem preferir a “ditadura” algo de grave estará acontecendo entre nós. A questão é: o que será! A primeira coisa que me salta à vista é a forma como tem decorrido o processo eleitoral, com destaque para as eleições Autárquicas de 2023. Pese embora o Relatório se refira a 2022, isto pode significar que o próximo será pior em termos de rejeição da democracia em Moçambique.
Vejamos e analisemos os dados disponibilizados pelo PNUD. Os dados indicam que, dos inquiridos, 33,2% são pro-ditadura e 48,7% são pro-democracia. Em dados recentes, no entanto, a mesma instituição diz que, em 2018, a percentagem dos pro-democracia estava em 57;2% e que em 2021 o número baixou para 48,7%, ou seja, o interesse pelas instituições democráticas decresce a cada dia e a cada ano que passa. Essas instituições tornam-se irrelevantes para os moçambicanos.
Curiosamente, na quinta-feira, antes da publicação do PNUD, publiquei uma reflexão cujo título é “Assembleia da República: não dignifica!” Na reflexão, destilei as razões que me fazem dizer que a Assembleia da República não nos dignifica e, nas redes sociais, muitos internautas dizem que “a Assembleia da República nunca os representou” e o PNUD traz-nos este presente antecipado das eleições de 09 de Outubro de 2024. O que poderá significar isto!
Isto, na minha opinião, revela que as instituições democráticas moçambicanas, no seu todo, são irrelevantes e aqui pode significar que os partidos políticos moçambicanos não são dignos de nos representar nos diferentes órgãos de democracia. Por outras palavras, não vale a pena eleger o Presidente da República, pois os problemas continuam ou pioram. Não vale a pena eleger os Deputados da Assembleia da República, pois, eles não nos dignificam e tão pouco nos representam. Não vale a pena eleger as Assembleias Municipais, pois não resolvem nada daquilo que se espera deles, antes pelo contrário, preocupam-se em resolver os seus próprios problemas, recorrendo à extorsão ao povo. Veja-se o caso do novo Município da Matola-Rio, que entra com taxas exorbitantes para a regularização dos terrenos, das construções com as ameaças pelo meio!
Quem diz o Município da Matola-Rio diz todos os Municípios. São excepções casos em que, realmente, os Municípios resolvem os problemas dos seus munícipes. Destaque vai para dois Municípios, na minha opinião, que é Chimoio e Beira, o resto, desculpem-me, não me parece que estejam, efectivamente, interessados em resolver coisa alguma, por isso mesmo também a ideia de que o voto não vale para nada. Sendo assim, que fique perpetuado quem está no poder. Votar para quê!
Adelino Buque
O “Muro de Berlim” na liderança da RENAMO
I. A instalação do “muro de Berlim” na liderança da RENAMO marca o processo de democratização dentro do partido depois da morte do seu líder, Afonso Dhlakama. Na guisa da história político-constitucional da formação dos partidos políticos em Moçambique, a democracia constitucional moçambicana faz saber que tivemos – seguindo-se o Acordo Geral de Paz assinado em Roma (1992) e com a inauguração da democracia pluripartidária no contexto político – várias formações. A Guerra fratricida entre a Renamo e a Frelimo colocou a Renamo como promotora da democracia pluripartidária e, obviamente, em última análise como a mãe da democracia pluralista em Moçambique. Seria muita ingratidão do nosso lado (e do lado do Partido Renamo) negar hoje o indispensável contributo do General Ossufo Momade. (In)felizmente, acaba de conhecer um forte opositor que se intitula o mentor do processo de democratização do partido!
II. Venâncio Mondlane, o mais jovem deputado da AR pela Renamo – o queixoso de um processo eleitoral (“fraudulento” ou não) das últimas autárquicas em que o envolvia, o queixoso da justiça eleitoral moçambicana –, tem vindo a afirmar-se como um forte opositor à Ossufo Momade nos últimos tempos. Apesar de reunir os requisitos de elegibilidade que da lei constitucional se impõe, julgamos em nossa opinião que não deveria candidatar-se a Presidente da República, pelo menos para estas eleições de Outubro próximo. Em Ciências políticas, e em países onde a democracia se encontra mais ou menos consolidada, uma derrota eleitoral tem um significado; significa uma derrota política e uma derrota política deve merecer de quem a recebe um momento de “pausa política” para reflexão (nas academias chamamos a isso de ‘O ano Sabático’ no bom sentido). Essa “relutância” em forçar as coisas a ‘oito e oitenta’, a ‘tudo ou nada’ pode custar caro a este pequeno grande líder político e a Renamo em outubro próximo. Venâncio, apesar de estarmos juridicamente alinhado com ele – e nos parece: os tribunais, também – em matéria do cumprimento escrupuloso dos ‘Estatutos do Partido’, não pode se esquecer que é um político que exerce a política profissionalmente. Se ama a Renamo como quem ama a sua própria família devia saber que assuntos internos são para ser resolvidos ao nível do Partido, entre os seus… não pode expor politicamente o Partido dessa forma em nome do que os nossos egrégios avós considerariam por heroísmo e/ou patriotismo e os mais novos por ‘cidadania’. Essa deixa, serve também para Ossufo dirigindo-se a comunicação social sobre…
III. Dentro de um Partido político existe a chamada disciplina partidária. Quer queiramos ou não, temos de respeitá-la. Ela existe, justamente para ajudar os partidos a resolverem internamente os seus dilemas. Auguro momentos de paz e amor dentro do Partido. Queremos Partidos fortes. Uma concorrência democrática justa entre Partidos e candidatos. Vamos lá manter a calma e encontrar os melhores candidatos com menos manchas políticas. Eles existem. A Renamo de Dhlakama já sofreu muito, já teve um grande líder que sofreu muito com guerras externas, a sua memória não merece essas guerras internas! As imagens políticas de Ossufo vs. Venâncio andam muito desgastadas, muito beliscadas. O primeiro, porque – para além das sucessivas derrotas eleitorais enquanto presidente e candidato pelo partido – se tornou cego pelo poder antes mesmo de se tornar Presidente da República; o segundo, porque – para além da derrota eleitoral – tem pressa em se tornar Presidente do Partido e da República e, como sabemos, “a pressa é sempre inimiga da perfeição”. Mais: se no passado recente queixou-se das instituições de justiça com que confiança volta a queixar de Ossufo nas mesmas instituições de justiça da Frelimo? Para dar a conhecer a desordem e legitimar a Guerra no Partido??? Para isso é que tem servido a nossa “Justiça”, muito politizada. Parece-nos insensato. A estratégia em política é muito importante! Infelizmente, são os políticos que temos (os que saltam de galho em galho) e a comunicação social que se arma em esperta, deixa-se enganar pela Frelimo e dá cobertura ao espetáculo. Um oportunista, não tem ideologia que o limita. Já nos parece o Chega de André (A)ventura guiada por um bando de ignorantes e aventureiros. Talvez seja hora de a Renamo pensar em Elias Dhlakama – a quem felicito pela brilhante entrevista concedida recentemente ao nosso Jornal, o Semanário Canal de Moçambique – ou “ressuscitar” o líder do PDD, Raúl Domingos numa espécie de Renamo coligada moda ‘RENAMO União Eleitoral’ (Gerais, de 1999).
PhD in Law - Lisboa; Professor Auxiliar & Investigador da Universidade Católica de Moçambique. Antigo Director-Adjunto Pedagógico da Faculdade de Direito da Católica (UCM). Colunista do Jornal Impresso Canal de Moçambique (2012- ao presente).
Um país assim não tem esperança, não pode ter. O consumo de bebidas alcoólicas pela juventude em Moçambique atingiu o cume, bebe-se a descarada em todo o lado e a toda a hora, uma porcaria de bebida que está a levar, diante do olhar impávido do governo, milhares de jovens à loucura. Em muitos casos essas bebidas industrializadas que andam por aí, com fortes suspeitas sobre a sua qualidade, estão a matar, e matam pessoas de tenra idade que perdem a vida sem terem vivido.
Não sei como é que se explica que um governo inteiro como o nosso, permita a venda e consumo de “veneno” para destruir a “seiva da nação”. O que anda por aí em garrafinhas com nomes de rótulo como “Dinamite”, “Boss”, “Royal”, “Soldado”, “Tipo tinto”, é uma verdadeira promotora de chacina, mata aos poucos, o vício adquire-se imediatamente.
As mixórdias que enchem os armazéns e bancas e barraracas, tornando-se verdadeiras dinamites, são piores que a cannabis sativa, combatida ferozmente pelas autoridades policiais. A cannabis pode funcionar como medicamento, dela vai-se extrair o óleo de cânhamo, usado em alguns casos para combater o câncro, mas essas porcarias a que nos referimos, foram concebidas exclusivamente para matar.
A cannabis, no lugar de ser tratada como assunto criminal, ela é de forum social. Há camponeses que têm o hábito secular de “dar um shot” para ir trabalhar a terra, então não são criminosos. O assunto cannabis precisa urgentemente de uma outra discussão, talvez mesmo a nível do Parlamento. Mas quanto a essas “garrafinhas” que estão a massacrar jovens que vão morrer ainda imberbes, a posição do governo tem que ser radical para a salvaguarda da vida.
Entristeceu-se em tempos, ouvir uma governante de gabarito dizer que não se podia proibir a fabricação e venda dessa porcaria porque “eles pagam imposto ao Estado”. Então, em outras palavras, isso significa passar um alavará oficial para matar a nossa juventude, que efectivamente está a morrer aos pedaços perante o olhar impotente dos pais e da sociedade, e no final das contas do governo, a quem cabe a responsabilidade de nos proteger.
Mas os fabricantes e os agentes do Estado que promovem esta tragédia, podem estar a aproveitar-se das enormes fissuras que o nosso país tem. A juventude está desnorteada. Maior parte dela não trabalha, não tem ocupação. E nessas condições, torna-se vulnerável a tudo. Até as donzelas bebem isso e perdem completamente o controle de si, tornando-se, consequentemente, alvo dos oportunistas, caminhando também para a zona da morte.
É isso: amanhã podemos não ter homens suficientes para fecundar, pois, neste estado de coisas, esses “miúdos” nem força têm para subir uma mulher.
"E cada uma das Forças de Reacção Rápida que estamos a formar vai receber cinco milhões de equipamentos que vão permitir equipar tudo, menos o material letal”
Brigadeiro-general Nuno Lemos Pires, 20/05/2022
“Caso para perguntar ao Brigadeiro-General Nuno Lemos Pires, que utilidade tem o treino e as roupas militares, se há meios de defesa? Caro Brigadeiro-general, se não estão disponíveis a ajudar, por favor retirem-se de Moçambique. Vamos encontrar alternativas viáveis ao estágio actual da guerra. Saiam de Moçambique. Ao Governo de Moçambique, que haja clareza sobre o que queremos, Moçambique quer Paz, Segurança e Tranquilidade, o resto, o povo fará. Digam basta a esses espiões baratos dos recursos minerais e do gás. Esta reflexão traduz o pensamento do comum cidadão e não vincula qualquer instituição, seja pública ou privada”.
AB
“Estou aqui numa campanha de aprendizagem, uma vez que Moçambique e os seus parceiros em toda a SADC têm tido muito sucesso no combate à insurgência no norte do País. São resultados impressionantes. Não vou entrar muito em detalhes sobre o que o Presidente pediu, mas garantimos neste momento a ajuda em termos de uniformes e material não letal”.
No entanto, o general acrescentou que o fornecimento de equipamento às Forças de Segurança e Defesa (FDS) de Moçambique dependerá das negociações que serão feitas logo após o pedido formal que o Governo terá de apresentar.
General norte-americano Michael Langley, líder da AFRICOM
O recrudescimento dos ataques terroristas, na Província nortenha de Cabo-Delgado, nos Distritos de Chiúre e Macomia, depois de alguns meses de relativa acalmia, mostra que algo não está certo no combate ao terrorismo em Cabo Delgado ou mais generalizando, em Moçambique. Embora não seja especialista em assuntos militares, a forma como os terroristas retomaram os ataques e o efeito que estes ataques provocaram é deveras preocupante.
Os dados da OIM, Organização Internacional de Migração, indicam que, entre os dias 8 de Fevereiro a 3 de Março, registaram-se 99.313 deslocados por temerem ataques terroristas. Deste número, segundo a organização, citada pela Lusa de 05 de Março de 2024, 45.957 são crianças, representando 62% dos deslocados. A imprensa moçambicana, sobretudo a Televisão, mostrando as imagens dos deslocados em desespero, classificou o fenómeno como êxodo populacional, não era sem razão!
Se recuarmos no tempo, no início dos ataques terroristas a Mocímboa da Praia, em 2017 e se olharmos para a forma como as autoridades têm lidado com o assunto, podemos concluir, certo ou errado, que não há clareza sobre a solução para o terrorismo em Moçambique. É que foram mais de três anos de ataques terroristas em Cabo Delgado sem a resposta adequada por parte das autoridades governamentais e, depois de assumir-se, diga-se, com a seriedade necessária, conseguiu-se êxitos consideráveis. Entretanto, do nada, os ataques retomam com uma intensidade anormal. A pergunta que não quer calar é: terá havido algum relaxamento face às vitórias registadas ou os terroristas regressaram mais fortes que as nossas Forças de Defesa e Segurança?
Aliado a isto, os parceiros de cooperação na área de Defesa e Segurança de Moçambique, com destaque para a EU – União Europeia, com a aprovação de Moçambique, gastam rios de dinheiro nos treinos militares e equipamento não letal, mas os soldados moçambicanos não têm meios de guerra para usar depois de formação. Ora, que cooperação é esta? Porque o Governo de Moçambique permite este tipo de atitude? Hoje, mais do que roupas militares, Moçambique precisa de armamento para a sua defesa. Se a UE não está em condições de fornecer o equipamento letal, que deixe de treinar os nossos jovens. Procuremos cooperação militar com outros blocos económicos mais sensíveis aos problemas de Moçambique. Digam basta!
A presença das altas patentes da EU em Moçambique pode ser interpretada como do interesse Europeu e não de Moçambique. Os gastos que realizam, fala-se de mais de 90 milhões de Euros, não têm resultados práticos para Moçambique. Pior, os nossos jovens morrem em Cabo-Delgado, sem poder se defender correctamente, porque não possuem meios à altura, para fazerem face à capacidade bélica do inimigo. A União Europeia tem consciência disso, mas prefere olhar para o lado. Veja o que diz o académico Enio Chingotuane a propósito, passo a citar.
“O académico Énio Chingotuane entende que as forças militares moçambicanas devem ser treinadas e apoiadas com material bélico para combater o terrorismo. Chama a atenção, no entanto, para o perigo de investimentos necessários no desenvolvimento serem desviados para o sector militar. E tece a seguinte comparação: "Portanto, existe uma cooperação sim, mas é uma cooperação que te deixa na porta, portanto, vou te ajudar a chegar na porta, mas na porta já não te vou dar chave para entrares.”
O académico deu exemplos bem-sucedidos de apoios militares com material bélico letal em várias missões em África e questiona se a cooperação militar tanto da União Europeia como da SADC é completa. Moçambique, explica, apresentou uma lista de material bélico de que precisava. Mas "a SADC disse não, não vos vamos dar isso, nós queremos manipular esses instrumentos dentro da vossa casa", fim da citação.
Há coisas que, em razão das relações diplomáticas, o Governo de Moçambique não pode dizer, mas nós, como sociedade interessada e que sofre com os eventos de Cabo-Delgado, podemos dizer. Se a União Europeia não quer cooperar para o fim do terrorismo, que saia de Moçambique. Nós temos que ter clareza do que queremos para Cabo-Delgado e para Moçambique como um todo. Basta!
Adelino Buque