O Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD) exortou, na última sexta-feira, em Maputo, o Governo moçambicano para a necessidade de criar mecanismos normativos que permitam a adopção de medidas específicas e restritivas para desencorajar a mobilidade interprovincial, entre zonas de alto risco de propagação comunitária da Covid-19, e de medidas de maior controlo nos pontos de transição entre uma província a outra.
O apelo foi feito durante uma conferência de imprensa, que serviu para partilhar os resultados de monitoria da implementação das medidas do Estado de Emergência nos primeiros 11 dias do mês de Junho, com vista à prevenção e combate da Covid-19, tendo salientado que esta medida visa contribuir para a redução da propagação interprovincial desta pandemia, que tende a atingir a transmissão comunitária no país.
De acordo com a Pastora Felizarda Xirinda, Presidente do Conselho Cristão de Moçambique e colaboradora do IMD, apesar dos esforços, os primeiros 11 dias do mês de Junho foram preocupantes, tendo em conta o registo recorde de casos positivos da Covid-19, sendo 230 casos positivos, correspondendo a 47% do total de casos positivos, desde o registo do primeiro caso, a evolução de casos de propagação no seio dos profissionais de saúde e o facto de a província de Nampula ter sido considerada como tendo um padrão típico de transmissão comunitária.
“Preocupa o facto de a taxa de positividade, em Nampula, ser cerca de 19%, contra uma média nacional de cerca de 3% e, mesmo assim, esta província continua a não constar na lista das que mais amostras colheu neste período”, observou Xirinda, para quem outro dado preocupante tem a ver com o número de amostras colhidas na província da Zambézia que, apesar de ter registado apenas duas infecções até no dia 11 de Junho, é a segunda província mais populosa do país e tem uma forte ligação sócio-económica e fronteiriça com a província de Nampula, onde o número de casos positivos tende a subir.
Para o IMD, “apesar de Zambézia estar entre as províncias com menos casos positivos, há receio de se tratar um caso similar a Nampula, avaliando pela sua elevada densidade populacional e a intercomunicação comercial e social existente entre as duas províncias”, situação que, segundo defende a organização, remete à necessidade de se alargar o processo de testagem em particular para as províncias de alto risco.
“Entendemos, como IMD, que esta atenção deve ser alargada também para as províncias de Gaza e Sofala dado o forte potencial de risco, tendo em conta o histórico de fluxo migratório de e para África do Sul”, disse, chamando atenção para o facto de, apesar da tendência de propagação comunitária persistir, haver uma percepção errónea de que esta doença é um fenómeno das cidades.
Segundo o IMD, verificam-se ainda focos de postura de negligência de alguns cidadãos que continuam a promover convívios familiares dentro das suas residências, envolvendo um número elevado de pessoas. Há registo de casos de casas de pasto como bares, discotecas e restaurantes que estão a realizar eventos juntando um número elevado de pessoas, desobedecendo os limites de horário de funcionamento legalmente estabelecidos, bem como as medidas de segurança colectiva e individual.
“O mesmo se manifesta em relação a algumas práticas culturais como cerimónias fúnebres em que, apesar da melhoria de controlo a nível dos cemitérios, ainda persistem casos de aglomerações de pessoas nas residências familiares”, lamentou, na ocasião, Osman Cossing, Gestor de Programas do IMD, que acrescenta que estas situações exigem uma maior intervenção das lideranças comunitárias e uma massificação e aperfeiçoamento das mensagens de sensibilização para a adopção de medidas preventivas.
O IMD considera, no entanto, que não obstante este cenário, nos últimos 11 dias foi notória uma maior consciencialização do cidadão e das instituições em relação à necessidade do cumprimento das medidas de emergência, como são os casos da massificação do uso de máscaras, desinfecção regular das mãos, cumprimento de horários do funcionamento dos mercados, embora persistam alguns desafios em relação aos que deliberadamente desobedecem as medidas.
Neste período, segundo o IMD, foi notória ainda a intensificação das acções de fiscalização em todo o país por parte da Polícia da República, da Inspecção Nacional das Actividades Económicas (INAE), das autoridades municipais, apesar de se reportar alguns casos de excessos por parte da polícia, o que merece maior atenção por parte das autoridades competentes para o seu desencorajamento e responsabilização.
O IMD chamou a atenção especial para a situação de Cabo Delgado cuja população vive uma situação dilemática de um binómio dos efeitos dos ataques armados e o espectro da Covid-19. Para a organização, esta situação demanda um apoio humanitário, para se garantir às famílias mais vulneráveis, em particular nas zonas de incidência de instabilidade militar e nas zonas ou distritos onde se encontram os deslocados, de modo que tenham a devida assistência.
A organização alerta ainda para a necessidade de desenho e implementação de um plano de abrandamento gradual das medidas do Estado de Emergência, garantindo sempre a implementação de medidas de segurança individual e colectiva.
IMD com receios quanto à reabertura do sector de educação
No seu Relatório de Monitoria da implementação das medidas de emergência contra a Covid-19, partilhado esta sexta-feira com a imprensa, o IMD continua a primar por uma postura de cautela e cepticismo quanto ao possível abrandamento de medidas que possam possibilitar a reabertura das escolas devido a diversos factores dos quais aponta a precaridade do saneamento, aliado a numerosas turmas que caracterizam as escolas nacionais e ao impacto imediato que a medida vai ter no sector de transporte que já se mostra com diversas limitações.
Na óptica do IMD, a se fazer esta abertura é preciso que seja de uma forma faseada, iniciando-se com os subsistemas de ensino que não demandam maiores aglomerados, como são os casos da formação dos professores e enfermeiros, avançando gradualmente para os outros sistemas.
“É preciso que se adopte cautelas necessárias, para que esta retoma não contribua para a massificação da propagação da Covid-19, em particular num contexto em que se assiste um crescimento de números de casos de crianças e jovens em idade escolar com a doença”, disse na ocasião Osman Cossing.
Para Cossing, o que entra em desfavor neste sector são os desafios estruturais existentes que caracterizam o nosso sistema de educação dos quais a exiguidade de carteiras, falta de água para todas as escolas, a existência de alunos que ainda estudam ao relento ou debaixo de árvores, aulas ao ar livre para além do rácio aluno/professor que é um dos mais elevados do mundo, “daí existirem da nossa parte dúvidas e receios face a esta possibilidade”.(Carta)