Cerca de duas centenas de pessoas marcharam sábado, em Lisboa, contestando a violência e a liderança no país. A marcha começou junto à embaixada de Moçambique, em Lisboa, onde mais de 120 pessoas se concentraram para pedir “o povo no poder”, tendo terminado na Praça do Comércio.
Entoando palavras de ordem e empunhando cartazes, após cantarem o hino moçambicano, os manifestantes desceram até à Praça do Comércio. Já na zona ribeirinha, os manifestantes voltaram a entoar a “Pátria Amada”, repetindo por várias vezes o verso “nenhum tirano nos irá escravizar”.
No meio dos cartazes em que pediam “socorro”, “justiça” ou assinalavam que "quem adormece na democracia acorda na ditadura", também se liam críticas ao Presidente eleito, Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frelimo, partido no poder desde 1975.
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) anunciou em 24 de Outubro a vitória de Daniel Chapo com 70,67% dos votos nas eleições de 09 de Outubro para escolher o Presidente de Moçambique.
Venâncio Mondlane, apoiado pelo Partido Optimista para o Desenvolvimento de Moçambique (PODEMOS), ficou em segundo lugar, com 20,32% dos votos, e contestou os resultados, que ainda precisam de ser validados e proclamados pelo Conselho Constitucional. Mondlane foi apoiado por vários dos intervenientes na marcha.
Em declarações à Lusa, um dos elementos da organização do protesto, Ernesto Damião, em Portugal há três anos, considerou que “o povo chegou a um limite e está a dar um basta”. “O que nos trouxe aqui a protestar foi: primeiro, prestar solidariedade ao nosso povo e, segundo, demonstrar à comunidade internacional e ao povo português (…) a real situação que está a acontecer no nosso país e gostávamos que essas entidades prestassem atenção no que está a acontecer”, apontou Ernesto Damião.
Nesse sentido, o moçambicano lamentou que “muitas liberdades” estejam a ser limitadas no país e criticou a forma como a Frelimo tem gerido o país desde a sua independência. A manifestação nasceu de um projecto chamado Quid Iuris, criado por jovens moçambicanos.
Gilana Sousa, da Quid Iuris, saudou a adesão à marcha, que contou com “mais pessoas do que previa”. Questionada sobre o que motivou a manifestação, a jovem explicou que o principal móbil foram “os constantes assassinatos que têm acontecido”, mas também “a violência policial extrema” em Moçambique.
“Nós, por exemplo, conseguimos manifestar-nos. É um direito que está consagrado na Constituição da República de Moçambique, mas, neste momento, se os nossos irmãos se quiserem manifestar, muito provavelmente podem não voltar a casa com vida”, lamentou.
Gilana Sousa admitiu que as tensões em Moçambique se intensificaram depois das eleições de Outubro. “O povo queria uma mudança e, não conseguindo essa mudança, revoltou-se, mas parece que a revolta não está a ser bem recebida”, disse.
Um dos objectivos da manifestação, segundo Gilana Sousa e Ernesto Damião, passa por mobilizar as autoridades portuguesas para o diálogo com Moçambique. “Portugal e Moçambique têm relações externas muito fortes”, apontou Gilana, que defende que Portugal deve “colocar-se numa posição e dizer o que acha dessa situação”, bem como mediar um diálogo.
Também à Lusa, Joana Gemo, ligada a Venâncio Mondlane, considerou que tem faltado uma verdadeira oposição em Moçambique, que, na sua opinião, “sempre foi um país com problemas”. “Hoje em dia há uma oposição à altura”, disse, referindo-se ao candidato apoiado pelo PODEMOS: “Conseguiu fazer com que percebêssemos que temos poder”.
“Achamos que é o momento de lutarmos para acabar com a tirania em Moçambique. São 50 anos de sofrimento, 50 anos de assassinatos”, lamentou.
Joana Gemo, em Portugal há 17 anos, disse que, apesar de se sentir bem acolhida em território português, quer voltar para Moçambique, que considera ainda território inseguro.
Esta foi a primeira vez em que moçambicanos, residentes no estrangeiro, saíram à rua para repudiar actos de violência que acontecem no país, assim como a governação. Lembre-se que, nas suas comunicações virtuais no Facebook, Venâncio Mondlane tem convidado os moçambicanos residentes no estrangeiro a replicarem a contestação que se verifica no país. (Lusa/Carta)