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quinta-feira, 09 dezembro 2021 07:54

Dívidas Ocultas: Advogados indignados com postura “delatora” do colega

Está turvo o ambiente na Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), uma das maiores e reputadas agremiações profissionais do país. Em causa está a autorização dada ao advogado Imran Issa para quebrar o sigilo profissional, durante a sua audição no julgamento do caso das “dívidas ocultas”, que decorre desde 23 de Agosto último, na 6ª Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo.

 

Imran Issa, refira-se, foi advogado de António Carlos Do Rosário (de 2013 a 2019), quadro da secreta moçambicana, tido como um dos principais cérebros do escândalo financeiro que levou o país à sarjeta. Foi na qualidade de ex-causídico do “Indivíduo A”, que Issa foi chamado à B.O. para contar o que sabe sobre os negócios do antigo PCA das empresas caloteiras.

 

Entretanto, a postura apresentada pelo causídico no Tribunal, nos dois dias da sua audição, deixou indignada toda a classe dos advogados, desde os que defendem os arguidos do caso das “dívidas ocultas” até aos que representam a OAM no julgamento, na qualidade de assistente do Ministério Público.

 

O primeiro a manifestar a sua indignação foi o advogado Isálcio Mahanjane, causídico de António Carlos Do Rosário. Para Isálcio Mahanjane, quem autorizou a quebra de sigilo profissional devia ter acautelado as questões éticas e de deontologia profissional.

 

De seguida, Alice Mabota, advogada de Khessaujee Pulchand, juntou-se ao debate, tendo dito que aquele era o “primeiro caso insólito” que estava a testemunhar, desde que abraçou a carreira em 1993. “Qualquer cidadão, hoje, vai dizer que o advogado não tem segredo porque, quando a porta se abre, tudo está estragado”, defendeu.

 

O juiz não gostou dos recados enviados à direcção da OAM, através das câmaras televisivas instaladas na tenda das audições. “Não se pode usar estas câmaras para transmitir o vosso descontentamento com a Ordem”, advertiu Efigénio Baptista, juiz que julga o caso das “dívidas ocultas”.

 

Ex-Bastonários também indignados

 

Entretanto, o debate invadiu as redes sociais, com os antigos Bastonários a liderarem o corro da indignação pela postura de Imran Issa. Tomás Timbane recorreu à sua página do Facebook para manifestar a sua indignação com o que viu na B.O.

 

“Estou incomodado, muito incomodado, com a prestação por um advogado de declarações, em tribunal, que constituem segredo profissional. Não ignoro que há casos em que isso pode ocorrer, mas só em situações limite. A confiança, que é determinada pela garantia do segredo, é a alma da relação entre advogado e cliente. Sem segredo não há confiança e sem confiança não há advocacia livre e independente. Sem advocacia livre e independente não há Estado de Direito”, disse Timbane, que liderou a agremiação entre 2013 e 2016.

 

Já Gilberto Correia, que geriu a OAM entre 2008 e 2013, entende que “em circunstância alguma, o Advogado deve aparecer publicamente como um mero delator do seu constituinte ou dos seus antigos constituintes”.

 

“Pode quebrar o sigilo para explicar factos que contribuem para a defesa da sua dignidade, direitos e interesses legítimos; mas não divulgar deliberadamente factos de que tomou conhecimento no exercício profissional e que saiba contribuírem para condenar o seu constituinte. O dever de segredo profissional é perpétuo, não tem fim, só sendo possível de ser afastado legalmente em casos excepcionalmente apertados definidos na lei, mas em meu entender nunca para permitir que o Advogado delate o seu constituinte”, defendeu Correia, também na sua página do Facebook.

 

Refira-se que, na sua audição, Imran Issa garantiu a autenticidade de todos os documentos, que António Carlos Do Rosário jurava terem sido forjados. Revelou, por exemplo, que a Txopela Investiments, uma das empresas usadas para a lavagem do dinheiro das “dívidas ocultas”, foi por si criada e que a mesma pertencia ao reu António Carlos Do Rosário. Disse ainda que António Carlos Do Rosário era o legítimo proprietário da empresa libanesa IRS, que integrou a Txopela Investiments. Garantiu que cortou as relações com o seu antigo cliente, quando começou a ser procurado pelo Tribunal do Líbano para explicar os contornos da offshore de António Carlos Do Rosário e que chegou a ser ameaçado de morte pelo antigo Director da Inteligência Económica. (Carta)

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