A Fundação Helen Suzman (HSF) sustentou hoje que o ministro da Justiça sul-africano tinha o dever constitucional de garantir a detenção e acusação eficaz do ex-ministro moçambicano Manuel Chang por corrupção, condenando a decisão de extradição para Moçambique.
“O ministro foi obrigado a tomar medidas necessárias para garantir que haveria um processo e isso incluía o dever de se certificar de que o senhor Chang seria preso quando chegasse a Moçambique e não estaria imune a julgamento”, adiantou a organização não-governamental sul-africana.
“A decisão de extraditar o senhor Chang para Moçambique foi, nas circunstâncias, ilegal, irracional e inconstitucional”, referiu a Fundação Helen Suzman.
“A análise da decisão e das razões revela que a decisão do ministro não avança o Estado de Direito, a constitucionalidade e os direitos humanos na medida em que não há razão para acreditar ou crença declarada de que o senhor Chang será preso em Moçambique; ou que a justiça será feita ao extraditá-lo para Moçambique em vez dos Estados Unidos”, frisou.
A organização não-governamental sul-africana foi citada pelo requerente, Fórum para a Monitoria do Orçamento (FMO) de Moçambique, na sua contestação à decisão de Pretória em extraditar Manuel Chang para o seu país, por ter participado no processo do tribunal, em 2019, na qualidade de amigo do tribunal.
De acordo com a HSF, as obrigações internacionais no tratado de extradição com os Estados Unidos, assinado em setembro de 1999, e no protocolo de extradição da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), são “vinculativas” para a África do Sul.
“A corrupção é considerada um fenómeno transnacional que requer cooperação interestatal e erradicação efetiva por meio de esforços conjuntos de todos os atores da comunidade das nações e, particularmente, daqueles que adotaram, como o fez a África do Sul, as convenções e protocolos da ONU, UA, OCDE e SADC contra a corrupção”, adiantou.
“A África do Sul é, portanto, parte de um esforço global para erradicar a corrupção e comprometeu-se internacional e internamente a tomar medidas eficazes para investigar e processar a corrupção onde quer que ela ocorra”, frisou a Fundação Helen Suzman.
Nesse sentido, a organização sul-africana considerou que “a questão da imunidade, e se havia um mandado de prisão válido e evidências de que tal mandado será acionado para efetuar a prisão do senhor Chang à chegada a Moçambique, é portanto crucial”.
“Em relação à imunidade", explicou a HSF, "o memorando de 27 de julho de 2020 foi firmemente a favor do pedido de extradição dos EUA, sobre o pedido de Moçambique, inclusivé com base na imunidade do senhor Chang ou potencial imunidade em Moçambique”.
“Há um outro problema com as razões declaradas pelo ministro: é que ignoram totalmente o memorando de julho de 2020 e/ou afastaram-se da recomendação sem qualquer motivo”, frisou a organização não governamental sul-africana.
O Tribunal Superior de Gauteng, em Joanesburgo, está a ouvir hoje, por videoconferência, a contestação do Fórum para a Monitoria do Orçamento (FMO) à extradição do ex-ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang para o seu país, depois de ter adiado por duas vezes a audição do caso em 25 e 27 de agosto.
O FMO, organização que tem defendido a extradição de Manuel Chang para os EUA desde a sua detenção na África do Sul, a pedido de Washington, submeteu uma ação urgente à Justiça sul-africana a solicitar a revisão da decisão do ministro da Justiça sul-africano Ronald Lamola.
Em causa está a decisão anunciada em 23 de agosto à Lusa pelo porta-voz do ministério da Justiça sul-africano, Chrispin Phiri, dando conta de que a África do Sul decidiu extraditar para Moçambique o ex-ministro das Finanças Manuel Chang, detido na África do Sul em 2018, a pedido dos Estados Unidos da América (EUA) por fraude e corrupção no caso das dívidas ocultas.
Manuel Chang é arguido nos autos de instrução preparatória registados sob o nº 1/PGR/2015 e nº 58/GCCC/2017-IP que correm termos na Procuradoria-Geral da República de Moçambique, segundo o acórdão do Tribunal Supremo de Moçambique, em 31 de janeiro de 2019, que instruiu o pedido de extradição moçambicano, consultado pela Lusa.
As ‘dívidas ocultas’ - que, segundo o Ministério Público moçambicano, ascendem a 2,7 mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) - foram contraídas entre 2013 e 2014 junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.
Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.(LUSA)