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sexta-feira, 17 setembro 2021 07:30

ENZ, um “elefante branco” cuja má gestão já foi institucionalizada

Passam 10 anos desde que o Estádio Nacional do Zimpeto (ENZ), o maior e mais imponente empreendimento desportivo do país, foi inaugurado, porém, a sua gestão continua a ser feita de forma amadora, encarecendo cada vez mais o bolso do cidadão.

 

Depois de terem sido gastos cerca de 70 milhões de USD para sua construção, actualmente o Estádio Nacional do Zimpeto gasta, anualmente, milhões de meticais dos fundos públicos para a sua manutenção, entretanto, os resultados estão aquém das expectativas.

 

Esta quarta-feira, o país foi surpreendido com a decisão tomada pela Confederação Africana de Futebol (CAF) de interditar aquele recinto desportivo para acolher jogos oficiais da selecção nacional do futebol, em particular o jogo da quarta jornada da fase de grupos das qualificações ao Mundial do Qatar 2022. A 10 de Outubro próximo, Moçambique receberia os Camarões no Zimpeto, mas terá de indicar uma nova casa até ao final do dia de hoje.

 

Em causa está a má qualidade da relva, o principal palco do espectáculo futebolístico. No entanto, avança-se ainda o não funcionamento de torniquetes recentemente instalados, a ausência de uma vedação externa e as péssimas condições de saneamento como algumas das razões que concorrem para a reprovação daquele Estádio, com capacidade de albergar 42 mil pessoas.

 

Trata-se, na verdade, de problemas há muito identificados e noticiados, mas que nunca mereceram especial atenção de quem cuida do empreendimento: a Secretaria de Estado do Desporto, através do Fundo de Promoção Desportiva. Aliás, a decisão da CAF chega um ano depois de a mesma organização ter avisado a Federação Moçambicana de Futebol (FMF) da necessidade de se resolver os referidos problemas, com vista a se renovar a certificação do Estádio para acolher jogos oficiais. Mas debalde!

 

Uma interdição há muito esperada

 

Em conferência de imprensa concedida esta quinta-feira, o Secretário de Estado para o Desporto, Carlos Gilberto Mendes, desvalorizou e desdramatizou a decisão da CAF, alegando não constituir alguma novidade, pois, estava ciente que a qualquer momento o único Estádio moderno do Moçambique independente seria reprovado.

 

“A decisão tomada pela CAF não é uma decisão que nos surpreende. Só pode ter surpreendido quem não tem estado a acompanhar a gestão do Estádio Nacional do Zimpeto. Quando esteve cá a primeira equipa de inspecção, o acordo que tivemos era para nós fazermos esta primeira fase que culminaria nos dois últimos jogos que faltam por realizar [contra Camarões e Malawi]. Portanto, não nos surpreendeu e nem nos chocou o relatório da CAF, porque não era nada que nós não soubéssemos que poderia acontecer a qualquer momento”, disse o governante em alto e bom som.

 

Contudo, ressalvou que “não aconteceu no timing que nós queríamos, porque pretendíamos realizar estes dois últimos jogos”. Isto é, estava ciente que o Estádio seria interdito para a realização de jogos oficiais, porém, não esperava que fosse nesta campanha de qualificação ao Mundial do Qatar 2022.

 

Segundo Gilberto Mendes, após a primeira inspecção – realizada em Março de 2020 – a Secretaria de Estado do Desporto contratou empresas para aquisição e instalação de torniquetes; colocação da relva; reparação dos bancos dos suplentes, das bancadas, dos balneários dos atletas e dos árbitros; apetrechamento da sala de imprensa; assistência técnica da iluminação, do sistema hidráulico, do sistema de som, do gerador, dos componentes das telas gigantes e do sistema de videovigilância; e para importação de portões do perímetro de acesso ao Estádio. Entretanto, devido aos efeitos da Covid-19 e ao calendário da FMF não foi possível executar as obras na sua totalidade, avalias em 1.5 milhão de USD.

 

Aliás, Gilberto Mendes acusa a Federação Moçambicana de Futebol de ter desgastado o relvado do Estádio com a realização do torneio triangular em Junho último, um evento ganho pela selecção nacional e no qual tomaram parte também as selecções do eSwatini e do Lesotho. Entende, por outro lado, que a realização do jogo dos “Mambas” fora do país não irá alterar nada.

 

“Infelizmente, [os Mambas] vão ter de jogar fora, mas não muda muito. Vão jogar fora e todos vamos assistir de onde iríamos assistir se jogassem cá dentro: sentados no sofá em casa porque ninguém tem acesso aos campos. Portanto, jogar fora e jogar aqui, psicologicamente pode ter aquele factor casa, mas não sei se joga muito porque jogamos com Malawi fora da casa deles e perdemos”, defende, acrescentando que o país não reage às imposições da CAF.

 

Entretanto, o Presidente da FMF, Feizal Sidat, garante que a recepção do jogo da quarta jornada fora do país irá impactar financeiramente nas contas da instituição na ordem de 20% a 25% em relação ao valor que seria gasto se a selecção nacional de futebol jogasse no Estádio Nacional do Zimpeto. Referir que a FMF equaciona receber os seus jogos na vizinha África do Sul (Nelspruit ou Johannesburg) ou na Etiópia ou Quénia.

 

“Há uma coisa que é bom que fique assente: nós somos um Estado Soberano. Nós não estamos a reagir às imposições da CAF. Nós iríamos reabilitar o Estádio Nacional do Zimpeto, que foi uma decisão do Governo de Moçambique fazer aquele Estádio. Então, a reabilitação do Estádio Nacional do Zimpeto não é muito em função da pressão da CAF. É porque nós sentimos que nós próprios temos de reabilitar. Por isso, o Estádio tem 10 anos e está lá. Tem 10 anos e continua em pé. Então, não podemos continuar a nos autoflagelar constantemente”, atira, defendendo que o organismo que gere o futebol africano não se pode limitar apenas à reprovação de estádios, mas também deve ajudar financeiramente.

 

“O barulho que se faz em torno do Estádio Nacional do Zimpeto não nos pode turvar a mente sobre aquilo que é o nosso foco. Nós sabemos o que estamos aqui a fazer. O trabalho da Secretaria de Estado do Desporto não é gerir apenas o Estádio Nacional do Zimpeto. É gerir o desporto no seu todo”, acrescenta.

 

“Um elefante branco é um bicho raro” – Gilberto Mendes

 

Falando em torno da gestão do Estádio Nacional do Zimpeto, que continua a merecer críticas, Mendes disse que o Estádio foi e continua a ser bem gerido, sendo que o único problema está relacionado à sua grandeza.

 

“O ENZ é um monstro. Não é uma flat. É um monstro. Temos 115 casas-de-banho, 450 torneiras, 800 pias, 800 sanitas, 550 urinóis. Quando alguém rouba um parafuso num urinol e começa a deitar água, até a gente descobrir de onde vem água, a gente tem de passar por 550 urinóis”, afirma o dirigente, esclarecendo o alcance do termo “elefante branco”.

 

“Um elefante branco é um bicho raro, muito caro. Aqui quando se diz elefante branco é do tipo uma coisa que não serve para nada. De facto, temos um elefante branco porque aquele elefante é caro e nos é muito caro a nós todos”.(A. Maolela)

 

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