Chegou ao fim o ano de 2020. Com ele, um misto de sentimentos. Mas o denominador comum é que pouco há, no ano findo, pelo menos para a maioria dos cidadãos, para celebrar. Aliás, todos confluem na tese de que o ano de 2020 não é, de facto, de se guardar qualquer registo.
E porque chegou mesmo a recta final, é chegada a hora do balanço. Carta de Moçambique traz na edição de hoje os momentos que marcaram o presente exercício económico. A pandemia da Covid-19; os ataques terroristas em Cabo Delgado; os ataques armados em Manica e Sofala; a investidura de Filipe Nyusi para um segundo mandato e o processo de Desarmamento, Desmobilização, Reintegração dos guerrilheiros da Renamo são alguns acontecimentos que, invariavelmente, ficaram cristalizados na memória dos cidadãos do “Rovuma ao Maputo” e do “Zumbo ao Índico”.
O ano de 2020 arranca, praticamente, na esteira dos resultados das eleições gerais de Outubro 2019. Toma posse a 15 de Janeiro de 2020 Filipe Jacinto Nyusi para um novo ciclo de governação, no caso o segundo. Ao largo da Praça da Independência, isto no centro da cidade de Maputo, Filipe Nyusi é conferido posse pela Presidente do Conselho Constitucional, Lúcia Ribeiro. No seu discurso de ocasião (de investidura), Nyusi deixa a garantia de tudo fazer para defender e promover a paz no país.
A Frelimo e o seu candidato presidencial venceram confortavelmente as eleições gerais de 2019, tendo inclusivamente garantido uma maioria qualificada na Assembleia da República. Os partidos da aposição, nomeadamente a Renamo e o Movimento Democrático de Moçambique, contestaram os resultados eleitorais, tendo, inclusivamente, boicotado a tomada de posse de Filipe Nyusi.
Dois dias depois de tomar posse, ou seja, no dia 17 de Janeiro, Filipe Nyusi anuncia a composição do novo Governo. Em relação ao elenco anterior, 10 representavam caras novas e os restantes oito a continuidade. Carlos Agostinho do Rosário manteve-se como Primeiro-Ministro, Adriano Maleiane, Ernesto Max Tonela e João Machatine também foram reconduzidos aos cargos de ministros da Economia e Finanças, Recursos Minerais e Energia e Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, respectivamente.
Celso Correia, Helena Kida e Carmelita Namashulua permaneceram no Executivo, mas foram conduzidos a outras pastas ministeriais. Celso Correia saiu da pasta da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural para a da Agricultura; Helena Kida de vice do Interior para ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos; e Carmelita Namashulua deixou a pasta da Administração Estatal e Função Pública para chefiar a da Educação e Desenvolvimento Humano.
No que respeita às caras novas, muitas surpresas. Depois de presidir à Assembleia da República, Verónica Macamo era nomeada ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, em substituição de José Pacheco. Margarida Talapa, antiga chefe da bancada parlamentar da Frelimo na AR, foi conduzida ao Ministério do Trabalho e Segurança Social.
Na lista, incluem-se os nomes de Amade Miquidade (Ministério do Interior); Jaime Bessa Neto (Defesa); Armindo Tiago (Saúde); Gabriel Salimo (Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico Profissional); Ivete Maibasse (Terra e Ambiente); Janfar Abdulai (Transportes e Comunicações) e Edelvina Materrula (Cultura e Turismo).
O segundo mandato de Filipe Nyusi inicia, praticamente, ensombrado pelos ataques em Cabo Delgado e os perpetrados pela auto-proclamada Junta Militar da Renamo, liderada por Mariano Nhongo. Os ataques armados fizeram o Presidente da República, naquela que foi a sua primeira aparição pública após tomar posse, isto durante as celebrações do 3 de Fevereiro (dia dos Heróis Nacionais), pedir o apoio da população para combater a violência em Cabo Delgado. Na ocasião, Filipe Nyusi disse que a violência em Cabo Delgado tinha mão interna e externa, tendo, igualmente, deixado a promessa de perseguir sem cessar os terroristas.
O mês de Março inicia, praticamente, com a Covid-19 no topo da agenda nacional, decorrente do facto de nalguns países da região austral terem sido notificados casos da doença. Perante este quadro, o Presidente da República decidiu a 20 de Março anunciar uma série de medidas para evitar a entrada e propagação da Covid-19 no país, destacando-se o enceramento de escolas do ensino público e privado, a todos os níveis de ensino. O rol de medidas anunciadas pelo chefe do Estado começavam a produzir os devidos efeitos três dias depois. Ou seja, no dia 23 de Março.
Entretanto, um dia antes do início do “período de isolamento”, ou seja, no dia 22 Março, o ministro da Saúde, Armindo Tiago, anuncia o registo do primeiro caso do novo coronavírus no país. Numa lacónica comunicação, Tiago veio a público dizer que se tratava de um cidadão moçambicano, com mais de 75 anos de idade, que regressara recentemente do Reino Unido e que se encontrava em isolamento na sua residência.
Depois de uma titânica ginástica para se ocultar a sua identidade, o indivíduo de mais de 75 anos de idade veio a ser “desmascarado” pela sua esposa e em rede nacional. Era, na verdade, o Presidente do Conselho Municipal de Maputo, Eneas Comiche. A confirmação de que se tratava do actual mayor da capital moçambicana veio da sua esposa, Lúcia Comiche, que depois de ter sido infectada pelo seu marido, decidiu ligar para um canal de televisão privado da praça e revelar que era a cidadã infectada pelo primeiro caso diagnosticado com a doença no país, anunciada, a meio da tarde, pelas autoridades de sanitárias.
Aquando do anúncio do primeiro caso, Armindo Tiago dissera, à data, que haviam sido rastreados nos vários pontos de entrada no país um cumulativo de 338.427 pessoas de países com surtos de Covid-19, das quais 1.248 submetidas à quarentena.
A meio da madrugada do dia 23 de Março, os insurgentes deram mais uma prova da sua pujança, musculatura e ousadia. Uma vez mais, colocaram todo um Estado em sentido. Voltaram ao local onde tudo começou, no caso a Vila da Mocímboa da Praia, mas, desta vez, para içar a sua própria bandeira, cujas características se assemelhavam as do Estado Islâmico (EI).
Se em Outubro de 2017, irromperam vila adentro, atacaram unidades policiais e ainda destruíram diversas infra-estruturas (públicas e privadas), incursão que saldou em mortos e feridos, os terroristas voltaram e tomaram aquele estratégico distrito, tendo, inclusivamente, assaltado o quartel militar das Forças de Defesa e Segurança (FDS). No interior do quartel, os insurgentes, numa clara demonstração de bravura, chegaram mesmo a içar a bandeira.
A 30 de Março, no quadro da prevenção e combate à pandemia da Covid-19, o Presidente da República decidiu decretar o Estado de Emergência e com a duração de 30 dias. O Estado de Emergência teve o seu início às 00:00 horas do dia 01 de Abril e terminou às 00:00 horas do dia 30 Abril.
Essencialmente, Nyusi justificou a decretação do Estado de Emergência com a necessidade da protecção da vida dos cidadãos. Filipe Nyusi reforçou e anunciou um novo pacote de medidas restritivas, cuja regulação foi posteriormente assegurada pelo Conselho de Ministros (CM).
No rol das medidas, dentre várias, o chefe de Estado proibiu a realização de eventos públicos e privados, excepto os inadiáveis; encerrou os estabelecimentos de diversão; a obrigatoriedade do uso da máscara; quarentena obrigatória de 14 dias para pessoas que chegassem a Moçambique oriundas de países que tivessem casos positivos da doença ou que tenham tido contacto com pessoa infectada; reforçou a limitação da circulação interna de pessoas em qualquer parte do território nacional; reforçou a suspensão das aulas presenciais desde o ensino pré-escolar ao universitário no ensino público e privado; e ainda a participação em funerais e cultos religiosos de mais de 50 pessoas.
Os moçambicanos nem haviam ainda assimilado as medidas restritivas impostas pelo Estado de Emergência, entradas em vigor a 1 de Abril, eis que são surpreendidos por uma horripilante notícia. E não podia ter vindo de um outro teatro, senão o operacional norte. Na audácia que lhes é característica, os terroristas desencadearam no intervalo de 07 a 12 de Abril uma série de incursões armadas no distrito de Muidumbe. Durante as investidas, decapitaram, cobardemente, 52 pessoas na aldeia de Xitaxi, alegadamente, por se terem recursado engrossar as suas fileiras.
No distrito de Muidumbe, além da Vila sede do distrito (Namacande) visaram, entre outras, as aldeias Mienguelewa, Mautide e Ntchinga, esta última referência por ter albergado uma importante base militar da Frente de Libertação de Moçambique, a Frelimo, durante a luta de libertação nacional.
Depois de falhadas tentativas de abafar o sucedido, o Governo foi forçado a vir a público prestar informações sobre o massacre, numa atabalhoada comunicação encabeçada pelo ministro da Defesa Nacional, Jaime Neto, que, para além de confirmar o massacre dos 52 jovens, rendeu homenagem aos “jovens audazes e patriotas que deram uma lição de pertença à pátria”.
Aliás, o ministro da Defesa disse, à data, que o massacre era em retaliação às “pesadas baixas” que os extremistas estariam a sofrer em resultado das investidas das Forças de Defesa e Segurança, tendo, inclusive, anunciado o assassinato de 128 terroristas entre os dias 07 e 12 de Abril.
Dias antes da comunicação do ministro da Defesa, o Comandante Geral da Polícia da República, Bernardino Rafeal, depois muita hesitação, tinha vindo a público anunciar a morte dos 52 jovens na aldeia da Xitaxi, acontecimento que classificou como tendo sido uma acção “bárbara do terrorismo”.
Em meados de Abril, o Governo moçambicano anunciou que precisava de 700 milhões de USD para fazer face à pandemia da Covid-19. O valor era destinado a suportar, entre outros, a componente de prevenção e tratamento da doença; a construção de unidades sanitárias e ainda cobrir o défice no Orçamento do Estado, decorrente da baixa na arrecadação de receitas.
No dia 24 de Abril, o Fundo Monetário Internacional (FMI) aprovou o desembolso de USD 309 milhões no âmbito da Facilidade Rápida de Crédito (RCF) para ajudar Moçambique a suprir as necessidades urgentes da balança de pagamentos e fiscais decorrentes da pandemia da Covid-19.
A 27 de Abril chega o balanço dos primeiros 100 dias de governação de Filipe Nyusi. Numa comunicação à Nação, Filipe Nyusi passou em revista os primeiros 100 dias do seu segundo mandato. Na sua avaliação, Nyusi disse que os primeiros 100 dias do seu novo ciclo de governação foram condicionados pela pandemia da Covid-19 e os ataques armados em Cabo Delgado bem como em Manica e Sofala, na região centro do país.
Ainda na comunicação que proferiu à Nação, Filipe Nyusi disse que, não obstante as adversidades, a “vida em Moçambique não parou”.
Entretanto, a avaliação do estadista moçambicano esteve longe de colher consenso no seio da sociedade, com uma franja a atribuir nota negativa por não ter respondido cabalmente aspectos como consolidação do diálogo político e a unidade nacional, provisão de serviços sociais básicos, promoção do emprego e melhoria da produtividade.
O mês de Abril termina praticamente com mais uma comunicação do Chefe do Estado. Antes do fim do período de excepção, Filipe Nyusi voltou a dirigir-se à Nação para avaliar o primeiro mês do Estado de Emergência e definir os novos passos que deviam ser seguidos pelos moçambicanos. Nem mais, Nyusi decidiu pela prorrogação do Estado de Emergência por mais 30 dias.
Na altura, o país registava 76 casos positivos do novo coronavírus e sem qualquer vítima mortal.
Filipe Nyusi disse que optou pela prorrogação do Estado de Emergência por mais 30 dias depois de ter sido aconselhado pela Comissão Técnico-Científica. Aliás, o PR mostrou-se contrariado pelo facto de as medidas anteriormente anunciadas não estarem a ser cumpridas na íntegra pela esmagadora maioria dos cidadãos.
No dia 15 de Maio, o Primeiro-Ministro, Carlos Agostinho do Rosário, anunciou uma série de medidas para reanimar a economia em resposta aos choques provocados pela pandemia da Covid-19, destacando-se a disponibilização de fundos através do Banco Nacional de Investimento (BNI). O BNI disponibilizou uma linha de crédito de um bilião de meticais a ser concedido em condições concessionais ao empresariado nacional.
A hora zero de 31 de Maio começou a vigorar a segunda prorrogação do Estado de Emergência. Na altura, Nyusi justificou a prorrogação na necessidade de controlar a propagação da pandemia no país e evitar que fossem accionadas medidas de nível 04, ou seja, o lockdown. A ideia era achatar a curva de crescimento da doença.
Nesta altura, todas as províncias do país já tinham casos positivos da doença. O cumulativo de casos positivos da doença estava situado em 233, dois óbitos e 82 indivíduos recuperados.
Decorrente do apelo internacional, o país havia recebido 309 dos 700 milhões de USD que solicitara da comunidade internacional para ajudar na prevenção e combate à pandemia da Covid-19.
O mês de Junho começa com o encerramento da primeira, das 16 bases, do maior partido da oposição no âmbito do DDR. Tratou-se de uma base situada nas proximidades de Dondo, província de Sofala, onde foram retirados materiais perigosos, armamento e antigos guerrilheiros.
Para além dos representantes do Governo e da Renamo, o encerramento da primeira base da Renamo foi testemunhado pelo Presidente do Grupo de Contacto e enviado especial do Secretário-Geral das Nações Unidas, Mirko Mazoni.
Longe da habitual azáfama, o país parou no dia 25 de Junho para celebrar o 45 aniversário da Independência Nacional. Durante as festividades, Filipe Nyusi deu o ponto de situação dos ataques armados em Cabo Delgado e ainda o andamento do processo que tem vista o Desarmamento, Desmobilização e Reintegração dos guerrilheiros da Renamo.
Na ocasião, o Chefe do Estado anunciou que o processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração dos cinco mil guerrilheiros do maior partido da oposição será concluído em Junho de 2021.
Em plena celebração do dia da independência nacional foi detido, por agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM), o jornalista Omardine Omar, sob alegação de ter violado o decreto presidencial sobre o Estado de Emergência, no contexto da prevenção e combate à pandemia da Covid-19. O jornalista da “Carta de Moçambique” foi detido em pleno exercício da sua actividade.
Três dias depois das celebrações do dia da Independência, Filipe Nyusi voltou a lançar a mão à Constituição da República (CR) para prorrogar, pela terceira vez, o Estado de Emergência por mais 30 dias. O novo Estado de Emergência começou a vigorar a 30 de Junho e o seu término fixado para 29 de Julho.
A nova prorrogação veio manter as medidas restritivas de nível 03 e adequar de forma faseada algumas medidas com impacto na economia, permitindo que alguns sectores de actividade pudessem funcionar.
Entre outras, Filipe Nyusi anunciou a retoma faseada das aulas presenciais e dos voos internacionais para países seleccionados, mas em regime de reciprocidade. Entretanto, manteve a proibição da realização de espectáculos; festas; bem como locais de culto e bares. Contudo, autorizou a abertura de museus e galerias.
O sábado de 11 de Julho terminou de forma trágica na cidade de Maputo. A meio da tarde, à saída do escritório na Av. Josina Machel, era baleado Agostinho Vuma, Presidente da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA). Agostinho Vuma foi baleado por desconhecidos quando saía do edifício onde funciona a sua empresa, tendo, seguidamente, sido evacuado para uma unidade hospitalar privada da capital moçambicana.
Uma testemunha ocular, que falou a jornalistas depois do sucedido, disse que, antes de ser alvejado a tiro, Agostinho Vuma terá pronunciado o nome “Salimo”. Da unidade hospitalar para onde foi socorrido depois do baleamento, Vuma foi evacuado para a vizinha África do Sul para a continuação dos tratamentos médicos.
No dia 16 de Junho, no quadro da terceira prorrogação do Estado de Emergência, Filipe Nyusi voltou a falar à Nação. O objectivo era avaliar os primeiros quinze dias e desenhar perspectivas para os restantes treze dias que separam do fim do estado de excepção. Concretamente, Filipe Nyusi dirigiu-se à Nação para recuar da decisão do regresso faseado das aulas presenciais.
É de salientar que o regresso faseado das aulas presenciais anunciado por Filipe Nyusi esteve sempre ensombrado pelo boicote dos pais e encarregados de educação, que, desde à primeira hora, não se mostraram a favor da decisão, precisamente por partilharem da opinião de que os estabelecimentos de ensino não ofereciam as condições para o efeito.
Até à altura em que o PR falou à Nação, as autoridades sanitárias apontavam que o país havia registado um total de 1.383 casos positivos da Covid-19, sendo 53 registados nas últimas 24 horas. Do total de casos registados no país, 1.239 são de transmissão local e 144 importados. Deram a conhecer que sete pessoas estavam internadas, 380 recuperadas e nove haviam já perdido a vida.
A 30 de Julho, o Executivo de Filipe Nyusi anunciou o alargamento do programa SUSTENTA para todas as províncias do país. O objectivo do SUSTENTA é estimular a economia rural, através da integração das famílias rurais no desenvolvimento de cadeias de valor sustentáveis, com base agrícola e florestal, de forma a melhorar a sua renda e qualidade de vida, com respeito pela conservação ambiental.
Agosto inicia praticamente com a declaração de um novo Estado de Emergência, no contexto da prevenção e combate à pandemia da Covid-19. O novo Estado de Emergência, no caso o segundo, começou a produzir os seus efeitos no dia 08 de Agosto 2020, estando o seu término previsto às 23:59 horas do dia 06 de Setembro de 2020. Apesar de muito discutida, a segunda vaga do Estado de Emergência veio marcar o alívio das medidas restritivas em todo o território nacional. Ou seja, a retoma gradual de alguns sectores de actividade.
O PR dividiu o desconfinamento em três fases. A primeira fase contemplou actividades de baixo risco (18). A fase dois, em que fazem parte actividades de médio risco, arrancou a 01 de Setembro de 2020. E a fase três, que incluía as de alto risco, teve o seu arranque no dia 01 de Outubro 2020.
A 06 de Agosto, o país parou para celebrar o primeiro aniversário do Acordo de Paz Definitiva e Reconciliação de Maputo assinado pelo Governo e Renamo. Nos discursos pela passagem do primeiro aniversário, os signatários (Filipe Nyusi e Ossufo Momade) renovaram o compromisso de respeito escrupuloso dos acordos celebrados.
Até à celebração do primeiro aniversário do Acordo de Paz Definitiva e Reconciliação de Maputo, haviam sido desmobilizados 520 antigos guerrilheiros da Renamo e encerradas duas bases na região centro do país.
No dia 11 de Agosto, os terroristas divulgaram imagens em que documentavam a tomada do porto de Mocímboa da Praia, decorrentes de ataques perpetrados pelo grupo dias anteriores. No seu canal de propaganda, os terroristas divulgaram imagens de soldados, alegadamente das FDS, assassinados e ainda diverso material bélico capturado também do exército moçambicano.
A 18 de Agosto regressaram as aulas presenciais nas instituições de ensino superior; nas academias e escolas das Forças de Defesa e Segurança; de ensino técnico-profissional; nas instituições e centros de formação de saúde; e formação profissional pública. Ainda na primeira fase do relaxamento, regressaram os “cultos presenciais”, obedecendo, à data, ao limite de 50 pessoas.
A primeira fase do relaxamento das medidas foi, igualmente, marcada pela retoma, entre outros, da emissão do Bilhete de Identidade, Carta de Condução, Documento de Identificação do Residente Estrangeiro, Passaporte (apenas para os estrangeiros).
O penúltimo domingo de Agosto (23) foi negro para a classe dos escribas. A meio da noite era atentado um importante pilar do Estado de Direito e Democrático, a imprensa. Indivíduos desconhecidos reduziram a cinzas a redacção do Jornal Canal de Moçambique, sediada no centro da capital moçambicana.
Indivíduos, até aqui não identificados, arrombaram as instalações daquele órgão de comunicação social e, de seguida, atearam fogo, que só veio ser debelado pelo Serviço Nacional de Salvação Pública (SENSAP). No local foram encontrados dois bidões de combustível, de 20 litros cada, que se acredita terem sido usados pelos malfeitores durante a acção.
Além de condenação de vários seguimentos da sociedade moçambicana, ainda de organizações internacionais, motivou uma onda de solidariedade consubstanciada pela doação de diverso material de escritório e ainda valores monetários para a reconstrução da redacção daquele semanário independente.
Na onda de condenação e repúdio destacou-se o comentário do antigo Presidente da República, Armando Guebuza, para quem não se lutou pela independência para queimar jornais. Armando Guebuza classificou a situação do Canal de Moçambique como sendo “terrível”, ressalvando a necessidade da defesa da liberdade e que tudo devia ser feito para que ela permaneça.
No dia 04 de Setembro, no quadro da prevenção e combate à pandemia da Covid-19, o presidente decretou a Situação de Calamidade Pública e por tempo indeterminado.
A Situação de Calamidade Pública veio substituir o “controverso” segundo Estado de Emergência, que vigorou de 08 de Agosto a 06 de Setembro. O novo instituto jurídico resulta da recente revisão da Lei de Gestão e Redução do Risco de Desastres, cujo regulamento entrou em vigor no passado dia 01 de Setembro.
A Situação de Calamidade Pública, que assinalou a retoma faseada das actividades económicas no país, manteve a proibição no que diz respeito aos aglomerados, interdição de eventos em espaços de diversão e, ainda, a norma que determina que os mercados são permitidos funcionar das 06h às 17h.
Ainda manteve a interdição da realização de modalidades desportivas com ou sem expectadores, com excepção de treinos dos clubes do principal campeonato de futebol e de atletas ou equipas que tivessem compromissos internacionais que retomassem as actividades a 15 do mesmo mês. Aliás, a 15 de Setembro, as praias voltaram a estar abertas para os banhistas, no entanto, estava proibida a prática do desporto de grupo, espectáculos musicais e venda e consumo de bebidas alcoólicas.
Por outro lado, o chefe do Estado anunciou o reinício da emissão de documentos pessoais, incluindo vistos temporários e passaportes.
Em meio à declaração da situação de calamidade pública, veio a 08 de Setembro a leitura da sentença do caso da auto-proclamada Junta Militar da Renamo. O antigo deputado da Renamo, Sandura Ambrósio e mais quatro arguidos, foram condenados a penas suspensas de cinco anos por apoio ao movimento dissidente da Renamo, liderado por Mariano Nhongo.
Tratou-se de Sandura Vasco Ambrósio, António Bauazi, Gabriel Domingo, Eugénio Domingos, Aníva Joaquim, que vinham acusados pelo Ministério Público (MP) do crime de conspiração contra a Segurança do Estado. Domingos Marrime, o sexto co-réu, foi absolvido pelo tribunal por insuficiência de provas.
Em sentença datada de 08 de Setembro, os cinco arguidos foram considerados culpados pelo crime de conspiração contra a Segurança do Estado ao financiar a Junta Militar da Renamo.
Um dos réus, no caso António Bauazi, momentos após ouvir o veredicto do Juiz Carlos Teófilo, disse que estavam a passar por aquela situação precisamente porque o partido Renamo não tinha presidente, numa clara alusão a Ossufo Momade.
Na ressaca do julgamento dos membros da auto-proclamada Junta Militar emerge uma nova “peça” no tabuleiro político nacional. Henriques Dhlakama, filho mais velho do falecido presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, anuncia que se vai candidatar à presidência do país nas eleições Gerais de 2024. A candidatura veio fazer subir de tom a crítica em torno da liderança de Ossufo Momade, que vinha já acusado pelos seus detractores de gerir de forma “desastrosa” o partido.
O primogénito de Afonso Dhlakama sustentou a sua motivação de concorrer às presidenciais na vontade de evitar que o país entre “num precipício”.
O anúncio da candidatura por parte de Henriques Dhlakama gerou alguma agitação no seio do maior partido da oposição, realidade que obrigou Ossufo Momade a emitir um parecer em torno do assunto.
Ossufo Momade disse, na altura, que a candidatura do filho do líder histórico do partido não representava qualquer ameaça para a Renamo. Momade avançou que Henriques Dhlakama não estava a fazer mais nada senão o usufruto de uma prerrogativa que a lei fundamental, a Constituição da República, lhe reserva.
Os ataques terroristas em Cabo Delgado voltaram também a ser tema de conversa em Setembro, mas desta vez no velho continente. Precisamente na sede do Parlamento Europeu (PE), em Bruxelas. O tema foi levado a debate pelo eurodeputado Ricardo Rangel.
Após acalorados debates, o órgão, em resolução, defendeu a 17 de Setembro a necessidade do Estado moçambicano tomar medidas “eficazes” e “decisivas” para combater os ataques terroristas na província de Cabo Delgado, região centro do país.
À data, o órgão anotou que olhava com elevada preocupação o facto de a insurreição armada estar a ganhar apoio entre as organizações terroristas regionais e internacionais.
Um dia antes da discussão do tema “Cabo Delgado” pelo Paramento Europeu, através do Ofício nr. 1818/ GMNEC/995/2020, datado de 16 de Setembro último, da lavra de Verónica Macamo, ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, o Governo de Maputo solicitou apoio nos domínios da formação, logística para as forças de combate ao terrorismo, equipamento de assistência médica em zona de combate e capacitação técnica de pessoal.
Os apoios nestes domínios visavam, de acordo com o Executivo moçambicano, reforçar as medidas de resposta militar e de segurança e ainda evitar o avanço dos terroristas e restabelecer a lei e ordem naquela estratégica província do país.
No início do mês de Outubro, a União Europeia (UE), na pessoa do seu respectivo embaixador em Maputo António Sánchez- Benedito Gaspar, respondeu positivamente ao pedido de apoio solicitado pelo Governo de Moçambicano para combater os ataques terroristas na província de Cabo Delgado, região norte do país.
Na altura, a par de confirmar que os pedidos de Maputo haviam recebido resposta favorável, Benedito Gaspar disse que não estava na agenda a vinda de militares europeus ao território nacional.
Depois de pouco mais de ano e meio, o Banco de Moçambique (BM) submeteu, no passado de 13 de Outubro, o draft do modelo do Fundo Soberano (FS) a ser adoptado pelo país à auscultação pública. A ideia da auscultação é colher contribuições para o enriquecimento da proposta técnica.
Na essência, o regulador do sistema financeiro nacional propõe um Fundo Soberano que assenta no “acumular” da “poupança” e na contribuição para a “estabilização fiscal”.
A criação do Fundo Soberano surge numa altura em que se estima que o país venha arrecadar cerca de 96 biliões durante a vida útil dos projectos de Gás Natural Liquefeito (GNL).
No dia 25 de Outubro, o Presidente da República anunciou a trégua de sete dias, período ao qual mostrou abertura para iniciar conversações com Mariano Nhongo. Filipe Nyusi dissera, na altura, que ordenara às FDS a cessarem na perseguição aos comandados do líder daquele movimento dissidente da Renamo.
Dois dias depois, concretamente a 27 de Outubro, Mariano Nhongo, em declarações à jornalistas a partir da parte “segura”, avançou que só iria dialogar com o PR caso este publicasse o documento por ele (Mariano Nhongo) enviado, no qual vêm vertidas as preocupações do grupo. Para Mariano Nhongo, a publicação do aludido documento é peça chave, pois, deve ser do conhecimento do povo.
A classe médica, a Ordem dos Médicos e a Associação Médica de Moçambique insurgiram-se por falta de equipamentos de protecção individual dos profissionais que se encontram na linha da frente contra a Covid-19.
A morte do médico António Mujovo, contaminado por Covid-19, foi a gota de água que fez transbordar o copo. António Mujovo era assessor do actual ministro da Saúde, Armindo Tiago.
A classe médica revoltou-se por entender que a morte do Dr. António Mujuvo poderia ter sido perfeitamente evitada se tivesse tido material de protecção e tratamento hospitalar adequado.
O mês de Outubro termina com o líder da auto-proclamada Junta Militar da Renamo, Mariano Nhongo, a anunciar o fracasso da aproximação com o Governo de Filipe Nyusi, tendo em vista o estabelecimento de um diálogo entre as partes.
Mariano Nhongo disse que a aproximação falhou por sucessivas violações da trégua de sete dias por parte dos elementos das Forças de Defesa e Segurança. A trégua de sete dias decretada por Filipe Nyusi terminou a 31 de Outubro.
A 11 de Novembro, graças à ditadura do voto da bancada parlamentar da Frelimo, o Parlamento moçambicano aprovou a rectificação do Orçamento do Estado referente ao exercício económico de 2020.
Concretamente, a rectificação orçamental teve por objecto a incorporação de recursos adicionais no montante de 28,7 mil milhões de Mts. Do global, cerca de 5,4 mil milhões de Mts são provenientes de recursos internos e 21,3mil milhões de Mts de recursos externos.
Com a correcção, a despesa do Estado passará dos anteriores 345, 4 mil milhões Mts para 374, 1 mil Mts, um aumento de 33,9% para 41,9% do Produto Interno Bruto (PIB). As despesas de funcionamento situar-se-ão em 231,0 mil milhões de Mts contra 228, 3 mil milhões de Mt da lei anterior. Já as despesas de investimento passam dos anteriores 70,9 mil milhões de Mts para 90 mil Mts e as operações financeiras dos 46,0 mil milhões Mts da lei para 52,4 mil milhões de Mts.
Por consenso, algo pouco comum no órgão, a Assembleia da República aprovou no dia 11 de Novembro a lei que Estabelece o Regime Jurídico Especial de Perda Alargada de Bens e Recuperação de Activos, um desejo antigo do Ministério Público (MP), que vinha clamando por uma base legal para combater a grande corrupção.
A lei que Estabelece o Regime Jurídico Especial de Perda Alargada de Bens e Recuperação de Activos, por objecto, estabelece o regime especial e os mecanismos de identificação, rastreio, apreensão, confisco, congelamento, recuperação, repatriamento e gestão de activos pelo Estado, resultante de actividade ilícita.
E porque os ataques em Cabo Delgado provocaram uma onda de deslocados, o Governo foi convocado à Assembleia da República para dar o ponto de assistência às populações. Na ocasião, o Primeiro-Ministro, Carlos Agostinho do Rosário, revelou que o número de deslocados, em meados de Novembro, estava em cerca de 500 mil pessoas, que se haviam refugiado nas províncias de Cabo Delgado, Niassa, Nampula, Zambézia, Manica, Sofala e Inhambane.
Dezembro praticamente inicia com aprovação do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado ambos para o ano de 2021. As despesas do Estado para o exercício económico de 2021 estão fixadas em 368. 585, 1 milhões de Mts, o correspondente a 32% do Produto Interno Bruto (PIB). Em termos de receita, a proposta aponta para 265. 596,1 milhões de Mts, equivalente a 23,4% do PIB.
No que respeita ao défice, o documento que temos vindo a citar aponta para um (défice) estimado em 102.999,0 milhões de Mts, equivalente a 9,1% do PIB.
A 04 de Dezembro foi encerrada a base Militar da Renamo localizada no distrito de Mabote, província de Inhambane. Os guerrilheiros entregaram o material bélico que usavam nas suas incursões e passaram à vida civil, no âmbito do DDR. O encerramento da base de Mabote foi marcado pela adesão ao processo do brigadeiro João Machava, que desempenhava as funções de porta-voz da Junta Militar da Renamo.
Desde a retoma do processo de DDR a 04 de Junho último foram encerradas um total de seis bases do maior partido da oposição. Aguardam pelo processo de DDR 3700 guerrilheiros.
Depois de muita hesitação, e acordos de cavalheiros entre as bancadas da Frelimo e Renamo, o parlamento moçambicano constituiu, no passado dia 15 de Dezembro, a nova Comissão Nacional de Eleições (CNE). O ponto alto do processo de definição da nova constituição do órgão foi assinalado pela eleição dos sete membros provenientes da sociedade civil, acto que motivou a zanga da bancada do Movimento Democrático de Moçambique, tendo boicotado o informe anual do Chefe do Estado e da sessão de encerramento dos trabalhos da AR.
Os sete membros da sociedade civil vêm juntar-se aos 10 provenientes dos partidos políticos com assento no parlamento. A CNE é constituída por 17 membros.
Pela sociedade civil foram eleitos os cidadãos Alice Banze; Carlos Matsinhe; Dauto Ibramugy; Paulo Cuinica; Salomão Moiane; Rui Cherene; e Apolinário João. No que respeita aos indicados pelos partidos políticos, a Frelimo escolheu Carlos Cauio; Rodrigues Timba; Abílio da Conceição; Eugénia Fernanda e António Foca. A Renamo apostou em Fernando Mazanga; Maria Anastácia da Costa Xavier; Abílio da Fonseca; e Alberto José. Por seu turno, o MDM indicou Barnabé Nkomo.
Um dia depois da eleição dos novos membros da CNE, o mais alto órgão legislativo do país “vestiu-se da gala” para acolher a sessão reservada ao informe anual do Presidente da República sobre a Situação Geral da Nação.
Depois de três horas, Filipe Nyusi sentenciou: “o Estado da Nação é de resposta inovadora e renovada esperança”. Filipe Nyusi considerou 2020 um ano atípico, condicionado pela pandemia da Covid-19 e ainda os ataques terroristas em Cabo Delgado e os perpetrados pela auto-proclamada Junta Militar da Renamo. Apesar destes constrangimentos, sublinhou o chefe de Estado, o país não ficou de braços cruzados.
A partir do pódio da Assembleia da República, Filipe Nyusi assegurou que o país vai continuar a “consolidar a paz” e “unidade nacional” bem como para mantê-lo na rota do desenvolvimento.
Um dia após o informe sobre o Estado da Nação, Mariano Nhongo manifestou disponibilidade para dialogar com o Governo, mas exigiu garantias de que os seus homens não seriam sequestrados.
A 17 de Dezembro, depois de uma campanha eleitoral electrizante, com jogos de bastidor à mistura, realizaram-se as eleições na Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA). O empresário Agostinho Vuma, que concorria à sua própria sucessão, conseguiu a sua reeleição ao cargo de presidente da agremiação.
No escrutínio, Agostinho Vuma, pela “lista A”, derrotou o também empresário Álvaro Massinga, que concorria à presidência do órgão suportado pela “lista B”. Agostinho Vuma, que vai para um segundo mandato (agora de quatro anos), foi reeleito com 68 votos contra 47 votos de Álvaro Massinga, num acto eleitoral em que tomaram parte 115 membros, entre associações, federações e câmaras.
No passado dia 29 de Dezembro, o antigo ministro da Finanças, Manual Chang, completou os precisos dois anos em que se encontra detido na prisão de Modderbee, arredores em Joanesburgo, na vizinha África do Sul.
Manuel Chang foi detido a 29 de Dezembro de 2018 no Aeroporto Internacional O.R Tambo, em Joanesburgo, em trânsito para Dubai, a pedido da justiça dos Estados Unidos da América (EUA), pelo seu envolvimento no escândalo das chamadas dívidas ocultas, que lesaram o Estado moçambicano em cerca de 2,2 mil milhões de USD.
Fonte familiar disse, esta semana, que o antigo ministro das Finanças se encontra “emocionalmente forte” e a gozar de “boa saúde”. (Ilódio Bata)