Desde o início de Março passado multiplicam-se, a cada dia, linhas de créditos (ou fundos) cujo fito é financiar/apoiar os agentes económicos, famílias afectadas pela desgraça (suspensão e falência de empresas e, por consequência, milhares de concidadãos no desemprego), motivada pela crise do novo coronavírus (Covid-19). Mas quantos fundos existem? Quais estão disponíveis? E que impacto económico deles se pode esperar?
Feito o levantamento, “Carta” concluiu que a lista é longa: há mais de uma dezena. Do trabalho feito, o Jornal constatou também que há poucos fundos já acessíveis e, desses poucos, o seu impacto não se faz sentir na economia. Concluímos ainda que, da quantidade de fundos em preparação, parte é, em verdade, uma gota de água no oceano e que há morosidade no desembolso de alguns fundos importantíssimos.
Alguns financiamentos são disponibilizados pelo Governo, outros por países e organizações internacionais. A lista é enorme. Mas vamos nomear por ordem cronológica.
A 23 de Março, todos nos lembramos, o Banco de Moçambique, prevendo o impacto da crise na economia, disponibilizou uma linha de financiamento de 500 milhões de USD, através de alguns bancos comerciais elegíveis. Esse fundo é o primeiro a ser disponibilizado pelo Governo, cujo impacto na economia não é muito visível.
O objectivo do Banco Central era aumentar a disponibilidade do Dólar no mercado nacional para permitir a realização de importações, reduzindo, em última análise, a oscilação da taxa de câmbio. Entretanto, para a desgraça do Banco de Moçambique, o Dólar não está a circular como deveria ser no mercado, alegam os agentes económicos filiados à Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA). Ora, quanto menor é a circulação do Dólar, maior é a depreciação do Metical, um fenómeno que é notório nos últimos dias.
Para esse impacto negativo, o sector privado diz, recorrentemente, que a estratégia do Banco Regulador falhou, pois, ao invés de emprestar aos bancos comerciais, a instituição poderia facultar os 500 milhões de USD por meio de venda directa ao mercado, algo que facilitaria o acesso da linha por parte dos agentes económicos.
Apoios do FMI
A 14 e 24 de Abril passados, o Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou dois financiamentos, já a serem aplicados pelo Governo, um no montante de 15 milhões de USD e o outro avaliado em 309 milhões de USD, respectivamente.
O FMI emprestou os valores com o objectivo de ajudar o Governo a suprir necessidades urgentes da balança de pagamentos (exportação e, principalmente, importação de bens) e fiscais (falta de receitas) decorrentes da pandemia Covid-19.
De acordo com as projecções do Governo, os 324 milhões de USD concedidos pelo FMI ainda se mostram insuficientes para o impacto económico e social desejado. Lembre-se que, para colmatar o impacto da Covid-19, o Executivo necessita de 700 milhões de USD.
Financiamento aos Algodoeiros
A 12 de Maio último, o Governo, através do Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Celso Correia, anunciou o desembolso de 240 milhões de Meticais para subsidiar os produtores de algodão. Passado quase um mês, “Carta” apurou que o Governo ainda não desembolsou a verba, embora o período de comercialização do algodão da campanha agrícola 2019/2020 tenha já iniciado, em Junho corrente. Todavia, o Presidente da Associação Algodoeira de Moçambique (AMM), Francisco dos Santos, disse ao jornal que o desembolso está iminente.
“Tanto quanto nos é dado a conhecer, o assunto está praticamente finalizado, pelo que aguardamos a recepção dos fundos a qualquer momento. As empresas devidamente registadas e autorizadas como agentes de fomento são elegíveis para veicular o apoio ao produtor, que é o beneficiário da medida”, assegurou Dos Santos em correspondência electrónica.
Em termos de impacto, importar reavivar que, após o anúncio do fundo, a AMM veio a público elogiar o apoio “histórico”, pois, permitirá elevar o valor das compras de algodão-caroço aos produtores para cerca de 1.1 mil milhões de Meticais, facto que representa uma enorme ferramenta de desenvolvimento a quase 1 milhão de pessoas do meio rural, que têm no algodão uma importante fonte de sustento.
A agremiação assinalou ainda que o apoio significa que, na próxima campanha de 2020/21, haverá mais produtores, motivados e a produzir mais algodão, prevendo-se, por essa via, um aumento no valor das exportações em pelo menos 12 milhões de USD (mais de três vezes o valor do subsídio).
Crédito às PME
A 15 de Maio passado, o Primeiro-Ministro, Carlos Agostinho do Rosário, anunciou mais duas linhas de crédito, das quais uma no montante de 1 bilião de Meticais e outra de 600 milhões do Fundo do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) para apoiar as Pequenas e Médias Empresas (PME).
Trata-se de dois fundos, ainda em “banho-maria”. Mas, segundo o Presidente do Conselho de Administração (PCA) do Banco Nacional de Investimento (BNI), que será responsável pelo desembolso de 1 bilião de Meticais, nos próximos dias anunciar-se-ão os requisitos para o acesso ao crédito por parte dos agentes económicos.
O PCA do BNI, Tomás Matola, considera o valor muito pouco, olhando para a quantidade de PME afectadas pela crise. E, como consequência, assinalou, o facto vai gerar insatisfação aos empresários.
Em relação ao Fundo do INSS (que também é uma gota de água no oceano), “Carta” contactou, esta segunda-feira (08), o Director-geral da instituição para saber em que estágio está a preparação da verba a ser disponibilizada por bancos comerciais. Todavia, até ao fecho desta edição, Alfredo Mauaie não se tinha predisposto a partilhar qualquer informação.
Fundo da República Portuguesa
Um dia antes do anúncio das duas últimas linhas de crédito, a Embaixada de Portugal em Moçambique comunicou que vai disponibilizar linhas de financiamento no valor de 1.08 milhão de Euros para os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa.
Em comunicado citado pelo jornal “O País”, para o caso concreto de Moçambique, o Executivo de Lisboa indicava que o país beneficiará de medidas de apoio directo em diferentes sectores, designadamente, o sector privado que se tem vindo a debater com impactos muito negativos na sua actividade económica, entre outros.
Fonte da “Carta”, ligada ao Ministério da Indústria e Comércio, esclareceu que a linha de crédito da República Portuguesa, a ser desembolsada pelo Banco Comercial e de Investimentos, Millennium bim e Moza Banco e enquadrada no Fundo Empresarial da Cooperação Portuguesa (FECOP), ainda não estava disponível, mas trabalhos estão a ser feitos para que seja cedido o mais rápido possível.
Indisponíveis estão ainda duas linhas de financiamentos avançados pela CTA. Dessas duas, uma estará focada ao agronegócio e a última visa ajudar as empresas afectadas pela crise a pagar o Imposto sobre Rendimento de Pessoas Colectivas (IRPC). De acordo com o Director Executivo da CTA, Eduardo Sengo, o primeiro será disponibilizado pelo Banco Africano de Desenvolvimento, mas não precisou a fonte da segunda linha. A CTA ainda não avançou outras informações, nomeadamente, sobre os montantes, bem como as condições de acesso, de uma ou outra linha, alegadamente porque ainda não foram aprovados.
Outro Fundo ao Agronegócio
Mais uma linha foi, a quatro de Junho corrente, anunciada pelo Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Celso Correia, no montante de 50 milhões de USD. O valor visa essencialmente financiar a indústria de produção de sementes. De acordo com “O país”, o montante, ainda indisponível, será disponibilizado a empresas com planos de produção e distribuição de sementes viáveis, através do Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável, como forma de reduzir o défice de produção nacional.
Como se pode depreender, dos 10 fundos que conseguimos apurar, apenas os 500 milhões de USD estão acessíveis na banca comercial nacional, embora seu impacto seja muito questionado. Além desse valor, estão também dois fundos que correspondem a 324 milhões de USD, providos pelo FMI, mas ainda aquém das expectativas do Governo. Os restantes sete ainda estão longe de ajudar o pequeno empresário que viu seu negócio ruir por efeitos da Covid-19, com destaque para o sector hoteleiro e restauração.
A serem disponibilizadas, algumas linhas são meramente uma gota de água no oceano, é o caso de 1 bilião (proveniente do Orçamento do Estado) e na responsabilidade do BNI e os 600 milhões do INSS. Todavia, todas essas linhas em conjunto poderão trazer um impacto considerável e positivo, mas se, de entre vários factores, forem disponibilizados o mais rápido possível. (Evaristo Chilingue)