O Tribunal Administrativo (TA) de Moçambique considera que o Governo continuou a desrespeitar regras de contração da dívida em 2018, permitindo que o país se mantenha como devedor de "alto risco", lê-se num parecer debatido ontem no parlamento. "Nos indicadores de sustentabilidade da dívida, designadamente dívida externa/produto interno bruto (PIB) e dívida externa/exportações, os respetivos rácios [69,5% e 190,5%, respetivamente] continuam acima dos limites estabelecidos, o que faz com que o país seja considerado de alto risco de endividamento e, por consequência, com restrições na contratação de novos créditos", refere.
A forma como o executivo moçambicano contrai empréstimos é analisada no parecer do TA à Conta Geral do Estado (CGE) de 2018, que está hoje e quinta-feira a ser debatida pela Assembleia da República (AR). No seu parecer, o TA, que em Moçambique assume também a função de Tribunal de Contas, faz outros alertas. Num outro ponto, assinala a obrigação que o Governo moçambicano assumiu de pagar a dívida de uma empresa, PMS - Plataforma Multiserviços, sem que a mesma tenha executado um projeto que lhe foi concessionado, como um dos exemplos de violação da lei.
A contração da referida dívida também foi feita sem que tenha havido uma avaliação prévia da viabilidade do projeto a executar pela empresa beneficiária.
Num outro caso, faltam provas de elaboração de relatórios económicos e financeiros de empreendimentos do Estado, bem como relatórios de desempenho operacional. O TA assinala ainda o incumprimento da imposição legal de colocação de 30% de obrigações de tesouro na Bolsa de Valores de Moçambique (BVM) visando massificar o acesso da população aos títulos de dívida do Estado.
Nesse sentido, devem ser responsabilizados os gestores do Estado que violam as regras de contração da dívida pública. No parecer à CGE de 2018, o TA alerta ainda para a prevalência de deficiências na organização das pastas dos justificativos de despesas do Estado, execução de despesas não elegíveis e classificação incorreta de despesas.
Verifica-se ainda a falta de comprovativos de receção de bens adquiridos e de relatórios ou pareceres de fiscais independentes, nos processos de pagamento de obras de construção civil.
Por outro lado, não há registo na CGE de 2018 da execução de alguns projetos de financiamento externo, ocorrida fora da Conta Única do Tesouro (CUT).
O TA critica também o facto de o Estado ter pagado em 2018 despesas de anos anteriores, sem que os encargos tivessem sido inscritos nas verbas de "exercícios findos ou despesas por pagar". O parecer observa ainda que foram celebrados contratos com pessoal, de fornecimento de bens, prestação de serviços e de consultoria, com violação das normas e procedimentos legalmente instituídos.
Em relação à receita, o TA nota que a CGE tem uma deficiente previsão de receitas próprias e falta de previsão orçamental dos montantes arrecadados nas rubricas de alienação de bens e receitas próprias. A dívida pública de Moçambique tem estado sob escrutínio apertado dentro e fora do país, desde que, em 2016, foram descobertos empréstimos e garantias soberanas secretamente validadas pelo anterior executivo moçambicano, no valor de 2,2 mil milhões de dólares (cerca de dois mil milhões de euros).
O dinheiro foi mobilizado com o propósito de financiar a operação de três empresas estatais de pesca e segurança marítima, mas a justiça moçambicana e dos EUA consideram que o dinheiro foi usado para pagamento de subornos, entre outros fins ilícitos. Moçambique e EUA abriram processos contra pessoas envolvidas na operação que levou à angariação dos empréstimos.(Lusa)