Dois moçambicanos de um grupo de três foram mortos no distrito nortenho de Karonga, acusados de propagação do novo coronavírus no Malawi, país vizinho de Moçambique. Trata-se de Vicente Torai, membro da PRM em Tete, que encontrou a morte prematuramente.
A segunda vítima mortal chamava-se Elias Modesto e trabalhava no distrito de Balama, em Cabo Delgado. Todos saíam de Tete e, no momento da tragédia, regressavam de Dar-es-Salam, na Tanzânia, onde foram buscar os seus carros importados do Japão.
De acordo com a polícia malawiana, os dois moçambicanos foram linchados por malfeitores à mistura com a população, no passado sábado, por volta das vinte e três horas, no povoado de Chiwowola, distrito de Karonga, no extremo norte do país, junto à fronteira com a Tanzânia.
O terceiro conseguiu escapulir depois de encetar uma fuga, mas a outra versão indica que ele se salvou graças à intervenção da polícia malawiana. “Carta” apurou que o sobrevivente se chama Milton Grande.
No distrito de Karonga, foram interceptados por um grupo de malfeitores que condicionou a sua viagem e, depois de muitas peripécias, foram conduzidos à casa de um líder comunitário onde foram linchados.
A partir do cruzamento de várias fontes em Tete e Lilongwe, “Carta” soube igualmente da destruição no local de uma viatura de marca Toyota com a chapa de matrícula AIW-781, pertencente a Elias Modesto. Os malfeitores também se apoderaram dos outros bens.
Os moçambicanos também foram acusados de chupa-sangue (blood-suckers), um boato que nos últimos anos fez vítimas mortais no Malawi. Este boato já levou à detenção de vinte e sete malawianos. Os restos mortais das vítimas já se encontram em Lilongwe, donde serão transladados para a cidade de Tete.
Até agora o governo malawiano ainda não se pronunciou oficialmente sobre este incidente, que se vem juntar a tantos outros protagonizados por alguns malawianos. A ministra moçambicana dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Verónica Macamo, disse esta segunda-feira, em Maputo, que o governo moçambicano aguarda a comunicação formal de Lilongwe.
O linchamento dos dois moçambicanos criou uma onda de dor e contestação no seio da comunidade tetense que acolhe centenas de malawianos que procuram abrigo do lado moçambicano, devido à crise económica no Malawi.
Desde 2013, a comunidade doadora suspendeu o apoio directo ao orçamento do Malawi depois da descoberta do escândalo financeiro, vulgarmente conhecido por cash-gate. Sessenta por cento do orçamento daquele país depende da ajuda externa.
A suspensão do apoio directo ao orçamento forçou milhares de moçambicanos a procurar abrigo nos países vizinhos, entre os quais Moçambique. Alguns destes vivem em Moçambique ilegalmente, mas num ambiente pacífico e de irmandade, tendo em conta os laços linguísticos e culturais.
Recorde-se que, há cerca de um mês, militares malawianos violaram a fronteira moçambicana e apoderaram-se de forma violenta de 543 sacos de carvão vegetal aos comerciantes moçambicanos, na região de Calomue, distrito de Angonia, província de Tete.
Depois do Malawi reconhecer a violação da fronteira pelos seus militares, as autoridades daquele país desembolsaram cerca de cento e sessenta mil meticais para ressarcir os comerciantes moçambicanos.
Historicamente, os desmandos protagonizados por alguns malawianos em território nacional datam dos tempos do primeiro presidente do Malawi, o ditador Kamuzu Banda, segundo se pode ler nalguns arquivos.(Faustino Igreja)