Duas semanas após a morte de 12 garimpeiros ilegais, segundo dados oficiais do governo, e mais de 20, segundo fontes locais ouvidas pela “Carta”, o Comando Provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM), em Cabo Delgado, disse, nesta quarta-feira, 18, que diferentes elementos das forças policiais estão a investigar as motivações reais que levaram os garimpeiros em questão a invadirem, entre os dias 4 e 6 de Fevereiro do presente ano, a área concessionada à empresa Montepuez Ruby Minning (MRM).
Segundo Eugénia Nhamuchua, porta-voz da PRM, em Cabo Delgado, em entrevista aos órgãos de comunicação, as autoridades policiais detiveram há dias sete cidadãos entre nacionais e estrangeiros, supostamente, envolvidos na invasão à mina. De acordo com Nhamuchua, nos próximos dias serão apresentados os reais contornos da invasão à mina da MRM.
“Vamos, dentro em breve, trazer aos órgãos de comunicação social e a todos o que lá teria acontecido e evitar que situações de género voltem a ter lugar. Na avalanche que aconteceu semana passada, os garimpeiros estavam lá em massa. Nós queremos saber o que é que aconteceu, quais são as motivações. Criamos uma equipa que está no terreno a averiguar a verdade”, explicou.
Relativamente à situação do garimpo ilegal, a Montepuez Ruby Minning (MRM) manifestou preocupação recentemente, tendo emitindo um comunicado, em que dizia: “temos notado um exponencial aumento do número de mineiros ilegais que entraram na concessão da MRM nos últimos quatro dias. Foram cerca de 800 pessoas, incluindo mulheres e crianças, chegaram na periferia do poço. Ao que tudo indica, as mulheres e crianças, que são propositadamente destacadas pelos mineiros ilegais para impedir a Polícia moçambicana, foram coagidas a estar presentes”.
Por exemplo, na manhã do dia quatro de Fevereiro corrente, a MRM foi informada sobre o colapso de uma parede alta dentro de um dos poços operacionais na concessão de mineração da mineradora. O muro desabou devido à presença de um grande grupo de mineiros ilegais que entraram ilegalmente no poço. Além dos danos que os mineiros causam à MRM, estes actos têm vindo a matar e ferir os próprios mineiros. Dois ilegais ficaram presos no subsolo. Um perdeu a vida e o segundo sofreu ferimentos graves.
O último foi resgatado vivo pelos seus companheiros. O corpo do falecido foi recuperado também por garimpeiros. O nome e a origem do mineiro ilegal falecido ainda são desconhecidos. Ainda no mesmo local, lá para o cair da noite, ignorando o que acontecera pela manhã, outro grupo e invadiu e isso resultou num segundo incidente que ocorreu durante a noite de 4 a 5 deste mês.
Aqui também foi afectada uma parede alta do mesmo poço da MRM outro mineiro artesanal ficou preso no solo e morreu. A equipa da MRM mobilizou-se imediatamente junto da Polícia. O corpo já tinha sido recuperado por outros garimpeiros, mas não se sabia de quem se tratava. Com a colaboração da MRM, a Polícia identificou. Tratava-se de Assane Alberto, de Montepuez, 36 anos, casado, com quatro filhos e residente em Napai, Montepuez. Um terceiro mineiro ilegal morreu nas mesmas circunstâncias no dia seguinte, ou seja, cinco de Fevereiro.
Novamente, durante os dias 5 e 6 de fevereiro de 2020, a empresa foi informada sobre o colapso de uma parede alta dentro de um dos poços operacionais na concessão de mineração da MRM. O muro desabou devido à sub-cotação de um grande grupo de mineiros ilegais que entraram ilegalmente no poço, oito mineiros ilegais ficam presos no subsolo e foram fatalmente feridos.
A equipa da MRM compareceu ao local juntamente com a polícia local. Os corpos dos mineiros ilegais falecidos foram recuperados pelos mineiros ilegais. Eles foram identificados pela polícia como: Abdul Aby, 23 anos, de Montepuez; Bah Omar, 27 anos, da Guiné Bissau; Agostinho Mali, 23 anos, de Nampula; Ramadan, 35 anos, de Balama; Emílio Valentim, 31 anos, de Chiure; Nero Ricardo António, 26 anos, de Ancuabe; Estevão Alberto, 24 anos, de Ancuabe; Agostinho Luís, 23 anos de Namanhumbir. Mais detalhes são esperados. Esta presença a tempo inteiro da Montepuez Ruby Mining não é de hoje.
Em todas as situações idênticas, a MRM fornece assistência humanitária nas operações de resgate e recuperação, bem como sinalização no local e programas de conscientização às comunidades, alertando sobre os perigos da mineração ilegal. A recente escalada da mineração ilegal é preocupante porque há probabilidade de mais mortes serem registadas, ainda assim, a mineradora está empenhada em tudo fazer para evitar mais óbitos.
A MRM relembra a todas as partes interessadas sobre os múltiplos incidentes trágicos relatados em 2019, em que os mineradores ilegais arriscaram suas vidas com práticas, áreas e condições perigosas, resultando em numerosos desmoronamentos e perda de várias vidas. A escavação em solos macios e frequentemente húmidos, sem medidas de segurança adequadas, equipamentos de protecção e uma abordagem coordenada coloca os mineradores ilegais em extremo perigo.
As investigações anteriores da MRM sobre actividades ilegais de mineração renderam descobertas da escravidão moderna. Vários mineiros ilegais pesquisados são originários de Nampula, a cerca de 400 quilómetros de Montepuez, e são deliberadamente colocados em servidão por dívidas a sindicatos de contrabando de rubis.
O afluxo de mineradores ilegais danifica o tecido social das comunidades locais devido ao abuso de álcool e drogas, violência doméstica e sexual e problemas ambientais relacionados, entre outros. As fontes de água da aldeia estão a ser usadas e assoreadas para lavar o cascalho com rubi.
A MRM continuará a fazer campanhas para aumentar a conscientização entre as comunidades locais e os oficiais do Governo para ajudar a ultrapassar este problema. Essas informações são trazidas à sua atenção na esperança de que acções proactivas sejam tomadas de forma mais assertiva por um número maior de partes interessadas contra os financiadores, facilitadores e sindicatos por trás do comércio ilegal dos rubis moçambicanos. Essas partes exploram os mineiros ilegais e recebem uma parcela desproporcional dos recursos da mineração e contrabando de rubis ilegais.
Os mineiros ilegais são normalmente controlados e geridos por sindicatos e intermediários que tiram vantagem da pobreza e do desemprego. As investigações da MRM descobriram que os mineradores ilegais, alguns dos quais são jovens, são tipicamente recrutados por líderes sindicalizados ou intermediários bem financiados, que atraem seus recrutas com promessas de fortunas de mineração de rubi.
Os mineiros ilegais e/ou suas famílias podem ser solicitados a fazer um pagamento aos sindicatos a fim de obter a “oportunidade” e receberem os sindicatos transporte, comida e acomodação na área de Montepuez. Quando se percebe que eles não podem pagar essas taxas antecipadamente, os sindicatos se oferecem para fornecer um empréstimo que o mineiro ilegal deve pagar posteriormente por suas actividades de mineração de rubi, colocando assim o mineiro em dívida com o sindicato.
Os mineiros ilegais são então implantados em poços ilegais de mineração e sujeitos a condições abjectas e altamente inseguras, recebendo ferramentas, comida, água e acomodações.
As pedras recuperadas pelos mineiros ilegais devem ser “vendidas” através do sindicato e o mineiro ilegal recebe apenas uma fracção das somas envolvidas. Endividados com os sindicatos e sem dinheiro sobrando, esses mineiros ilegais não podem voltar livremente para casa ou se alimentar e se acomodar fora do sistema e, como resultado, os mineiros ilegais estão efectivamente presos à escravidão moderna.
A investigação da MRM concluiu que esses mineradores ilegais estão sendo deliberadamente colocados em servidão por dívidas por intermediários e líderes sindicalizados, que exploram condições de pobreza e desemprego em comunidades em dificuldades, praticando assim uma forma de escravidão moderna.
Lembre-se que, na semana finda, a Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) mostrou-se indignada com as constantes perdas de 11 vidas humanas entre os dias 4 e 5 de Fevereiro numa área de mineração concessionada à empresa mineradora Montepuez Ruby Mining (MRM), em Namanhumbir.
Segundo escreve a OAM no aludido comunicado, “estas ocorrências recorrentes causam indignação, pois é domínio público e das autoridades que o garimpo ilegal é ali praticado, mas não são tomadas medidas preventivas adequadas”. Indo mais, a OAM recorda que, em 2019, 14 garimpeiros ilegais morreram soterrados devido ao desabamento da mina, na mesma zona.
A OAM diz estar à espera que as autoridades governamentais e outras entidades relevantes realizem um trabalho com vista à investigação dos cabecilhas e intermediários dos referidos sindicatos, para evitar a exploração das camadas vulneráveis e perda de vidas de inocentes.
O posicionamento acima mencionado, na sequência do sucedido entre os dias 4 e 5 de Fevereiro de 2020, onde a MRM emitiu um comunicado lamentando o sucedido e acrescentando que “os mineradores ilegais são normalmente controlados por sindicatos e intermediários que tiram vantagens da pobreza e desemprego, através de financiamento de jovens em transporte, comida e acomodação nas áreas concessionadas à empresa”.
A tragédia de Fevereiro em Namanhumbir ocorreu na manhã do dia 4 de Fevereiro, quando dois cidadãos caíram no interior da mina, tendo um deles perdido a vida no local e outro contraído ferimentos. Adiantaram fontes populares na altura que, na noite do mesmo dia, mais dois cidadãos perderam a vida nas mesmas circunstâncias e que no dia 5 de Fevereiro outro desabamento ceifou oito vidas e fez vários feridos.
A OAM refere que, devido à tragédia, a Comissão de Direitos Humanos da agremiação foi criada uma equipa de trabalho que se deslocará ao local dos factos para apurar os contornos da situação e uma vez realizados os trabalhos, apresentará as conclusões e sugestões que se mostrarem pertinentes para evitar situações idênticas no futuro. (Carta)