Recorrendo ao artigo 5 da Lei do Orçamento do Estado para 2019, que define que o Governo está autorizado a usar os recursos adicionais e/ou extraordinários para acorrer as despesas de investimento, redução da dívida e situações de emergência, o CIP afirma que as despesas para a realização de Eleições devem, por regra, ser incluídas na categoria de despesas de funcionamento, pelo que “não se trata de dívidas nem situação de emergência”.
Aliás, no entendimento do CIP, a classificação das despesas com Eleições na rúbrica de despesas de investimento, tal como vem expresso no Orçamento do Estado para 2019, contraria a prática dos outros anos eleitorais, quando estavam correctamente classificadas em despesas de funcionamento.
“Tendo em consideração que a Lei de Orçamento autoriza o Governo a financiar despesas de investimento e não de financiamento, não se percebe a racionalidade de incluir as despesas de Eleições como um dos destinos da aplicação do valor das mais-valias”, considera a fonte.
As Eleições Gerais que, pela primeira vez, irão eleger os governadores provinciais, estão orçadas em 14.6 mil milhões de meticais, sendo que o Governo tinha disponíveis apenas 6.5 mil milhões de meticais (44%) do valor.
Definir o valor a ser usado para pagamento da dívida e definir critério
O outro plano traçado, em plena campanha eleitoral, pelo Executivo de Filipe Nyusi, é o pagamento das dívidas ao sector privado nacional. Neste ponto, o Centro de Integridade Pública diz haver necessidade de se definir quanto destas mais-valias se pretende usar para o pagamento das dívidas aos fornecedores e qual é o critério que será usado, de modo a “garantir uma materialização transparente do pagamento destas dívidas”, pois, “no Relatório sobre o pagamento de dívida atrasada aos fornecedores de bens e serviços já estava previsto o pagamento de 6.915,3 mil milhões de meticais (39% do Orçamento do Estado e 60,9% provenientes das mais-valias da transacção entre a Eni e Exxon Mobil)”.
Já em relação ao terceiro plano anunciado por Filipe Nyusi, que é de alocar 16 mil milhões de meticais para redução do défice fiscal derivado dos choques que a economia nacional sofreu com os ciclones Idai e Kenneth, que se enquadra no cenário de emergência, aquela organização da sociedade civil defende a necessidade de se fazer um levantamento do referido défice fiscal decorrente do ciclone Idai e tornar a informação pública.
“Não se percebe de que valor efectivamente se trata e se houve um estudo que comprove esse valor. Ademais, há um compromisso assumido pelos doadores no âmbito da Conferência Internacional de Doadores, realizada na cidade da Beira no dia 31 de Maio, de desembolsar cerca de 1.2 mil milhões de USD (cerca de 1/3 do valor solicitado pelo Governo) e, neste encontro, o Director do Gabinete de Reconstrução pós-Idai, Francisco Pereira, explicou que ‘os 3,2 mil milhões de USD solicitados pelo Governo são para um programa de reconstrução de cinco anos ou mais, portanto para os próximos dois anos, o dinheiro que recebemos é suficiente (...)’”, explica a fonte.
“O Relatório de Execução Orçamental de Janeiro a Junho de 2019 aponta que os ciclones Idai e Kenneth afectaram a capacidade produtiva do sector da agricultura e destruíram infra-estruturas dos sectores de transporte, comunicação e turismo, obrigando a revisão das previsões preliminares e apontando para uma desaceleração do PIB real para 2,5% em 2019 sem, no entanto, mencionar as perdas fiscais decorrentes destas calamidades naturais”, anota.
Na sua análise, o CIP questiona ainda os critérios de gestão das receitas das mais-valias a serem destinadas às reservas orçamentais, uma vez ainda não estar estabelecido o Fundo Soberano, “que seria o mecanismo usado para tal”.
“Tratando-se de recursos extraordinários, há necessidade de seguir as directrizes estabelecidas nos dispositivos legais sobre o assunto, sob pena dos mesmos serem usados para despesas que não irão trazer benefícios adicionais e servir para satisfazer os interesses individuais ou de grupos que controlam o processo”, considera aquela organização, lembrando que não é a primeira vez que o país encaixa receitas provenientes da tributação de mais-valias, mas a gestão destas é pouco clara. (Carta)