A Assembleia da República aprovou, esta quinta-feira, as Leis de Revisão da Lei n.º 2/2019 e da Lei n.º 3/2019, ambas de 31 de Maio, relativas à eleição do Presidente da República e deputados e à eleição do Governador e dos Membros das Assembleias Provinciais, respectivamente, vetadas pelo Chefe de Estado, em Maio último.
As referidas leis, a serem aplicadas nas VII Eleições Gerais (Presidenciais e Legislativas) e IV das Assembleias Provinciais de 9 de Outubro próximo, foram aprovadas com os votos favoráveis das bancadas parlamentares da Frelimo e Renamo, contra oposição da bancada parlamentar do Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
Lembre-se que o novo pacote eleitoral havia sido aprovado por consenso em Abril último, porém, foi devolvido para reexame pelo Presidente da República, em finais de Maio, alegando que a aplicação das normas introduzidas “pelo nº 4A, do artigo 8, (…) e pelo nº 1 do artigo 196A, da Lei nº 2/2019, de 31 de Maio, suscitam dúvidas quanto ao mecanismo processual da sua aplicação”.
As normas em causa estão relacionadas à tutela jurisdicional e recontagem dos votos, ambas reclamadas pelos Tribunais Judiciais do Distrito e que o Conselho Constitucional chama para si, alegando serem da sua exclusiva competência. O mesmo aplica-se ao Projecto de Revisão da Lei n.º 3/2019, de 31 de Maio, sobre a eleição do Governador e das Assembleias Provinciais.
O Parlamento reapreciou as duas leis e eliminou os números 4A e 4B do artigo 8 e o artigo 54-A da Lei de Revisão da Lei n.º 2/2019, de 31 de Maio, e os números 4A e 4B do artigo 161 da Lei de Revisão da Lei n.º 3/2019, de 31 de Maio. Igualmente, decidiu eliminar a expressão tribunal judicial do distrito no n.º 1 do artigo 196-A da Lei n.º 2/2019, de 31 de Maio, e no n.º 1 do artigo 167 da Lei n.º 3/2019, de 31 de Maio.
Assim, a nova redacção das duas leis atribui à Comissão Nacional de Eleições (CNE) e ao Conselho Constitucional a exclusiva competência de mandar recontar votos nas mesas de voto, conforme o caso, retirando, em definitivo, o poder dos Tribunais Distritais sobre a matéria.
No entanto, a decisão de proibir os Tribunais de mandar recontar votos foi política e não jurídica, tal como defende o Parecer da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade, liderada por António Boene, futuro Juiz Conselheiro do Conselho Constitucional.
De acordo com o Parecer da chamada 1ª Comissão da Assembleia da República, o veto exercido pelo Presidente da República sobre o novo pacote eleitoral “é de natureza política por não ter como fundamentos razões de inconstitucionalidade, declarados em processo de fiscalização preventiva da constitucionalidade pelo Conselho Constitucional”.
“Assim, o veto político encontra-se consagrado no n.º 3 do artigo 162 da Constituição da República que estabelece que o Presidente da República pode vetar a lei por mensagem fundamentada, devolvê-la para reexame pela Assembleia da República”, defende a 1ª Comissão, para quem as duas leis, depois de reapreciadas, “continuam a não enfermar de nenhum vício de inconstitucionalidade ou de ilegalidade”.
Aliás, foi com base nos argumentos da 1ª Comissão, que a bancada parlamentar do MDM votou contra o reexame das leis. A bancada parlamentar do “galo” defende que os Tribunais de Primeira Instância (os do Distrito) devem ter as mesmas competências que a lei confere ao Conselho Constitucional, excepto a da validade e proclamação dos resultados definitivos.
“Não estão em causa estados de alma ou posições ideológicas, mas a defesa intransigente do princípio constitucional de acesso aos tribunais. Impedir que os Tribunais Judiciais do Distrito conheçam o mérito das reclamações dos partidos políticos e decidir pela recontagem é um duro golpe à construção de confiança e transparência do processo eleitoral”, defende a terceira maior força política do país.
Por seu turno, a Renamo disse estar a favor das alterações “políticas” no novo pacote eleitoral, como forma de “evitar a confrontação institucional com a figura do Presidente da República por causa de matéria que se quer urgente e importante para flexibilizar as eleições de 9 de Outubro”.
Segundo António Muchanga, membro do Grupo de Trabalho para Elaboração do Ante-Projecto de Revisão da Legislação Eleitoral, coordenado por Ana Rita Sithole, a Renamo votou a favor por ter conseguido alguns ganhos na revisão do Pacote Eleitoral, como a introdução de um período de descanso para os membros das mesas de votos entre as 18h00 e as 19h00; a introdução de urnas transparentes; a penalização dos que enchem as urnas; e autorização da presença de jornalistas e observadores eleitorais durante o apuramento distrital.
Já a Frelimo diz ter acatado o expediente político do Presidente da República por entender que Filipe Jacinto Nyusi “fê-lo no interesse da salvaguarda dos mais nobres valores da democracia, assegurando maior clareza entre as competências dos diversos actores do processo eleitoral”.
Segundo o porta-voz da bancada parlamentar da Frelimo, Feliz Sílvia, votaram pelo reexame das leis “porque acreditamos que a Assembleia da República, na sua missão legiferante, deve garantir que todos os seguimentos da sociedade tenham clareza das leis e assegurando, assim, uma maior eficiência e eficácia das leis e consistência por parte do aplicador”.
Refira-se que o novo pacote eleitoral foi aprovado momentos antes do encerramento da X Sessão Ordinária da Assembleia da República, que coincide com o fecho da IX Legislatura do Parlamento, iniciada em Janeiro de 2020. (A. Maolela)