Observadores do Consórcio Eleitoral Mais Integridade defendem que as Eleições do dia 11 de Outubro, ocorridas nas 65 autarquias do país, não foram transparentes, íntegras e imparciais e acusam os órgãos eleitorais de serem marionetes do partido no poder.
Segundo o “Mais Integridade”, constituído por sete organizações da sociedade civil, a votação da passada quarta-feira foi caracterizada por irregularidades que, mais uma vez, mancharam o processo e cristalizaram o descrédito dos órgãos eleitorais perante a sociedade.
Aliás, a plataforma desafia os órgãos eleitorais (Comissão Nacional de Eleições e Secretariado Técnico da Administração Eleitoral) a apresentar as planilhas de todas as Mesas de Votos e os respectivos Editais, pois, na sua contagem paralela, por exemplo, a Renamo venceu na vila de Chiúre, província de Cabo Delgado, com 50% dos votos.
Em conferência de imprensa concedida esta segunda-feira, em Maputo, o “Mais Integridade” disse ter registado um nível elevado de fraude e má conduta das autoridades eleitorais, dos Membros das Mesas de Voto e dos brigadistas do recenseamento eleitoral. Igualmente, diz ter registado o uso abusivo da Polícia para intimidar e expulsar observadores e delegados de candidatura dos partidos da oposição e desviar urnas para locais desconhecidos.
Uma das irregularidades detectadas pelo Consórcio Eleitoral foi a introdução de boletins de votos pré-marcados, por parte dos Presidentes das Mesas de Votos, delegados de candidatura da Frelimo, agentes da Polícia e observadores eleitorais ligados às organizações próximas ao partido no poder.
O consórcio diz ainda ter verificado o uso abusivo do “voto especial” por parte de agentes da Polícia e observadores eleitorais ligados à Frelimo, nas autarquias de Quelimane (Zambézia), Monapo, Mussoril e Nampula, que foram autorizados a votar em várias Assembleias de Voto sem mergulharem o dedo em tinta para provar que tinham votado.
Os observadores dizem ainda que o fenómeno das listas prioritárias, verificado no decurso do recenseamento eleitoral, teve seu efeito no dia 11 de Outubro, em que os respectivos eleitores perfilavam nas primeiras duas Mesas de Votos, cujos cadernos tinham 800 eleitores. Dizem, aliás, que os eleitores que não se deslocaram aos locais de votação foram substituídos pelos Presidentes das Mesas, que tinham a responsabilidade de introduzir boletins nas urnas.
Segundo o Consórcio Eleitoral, após o fim da votação, pelas 18h00, Presidentes de Mesa de Votos, em várias Assembleias de Voto, dos Municípios de Nampula, Nacala-Porto, Gurué, Quelimane, Cidade de Maputo e Matola, não iniciaram de imediato a contagem de votos, alegando que aguardavam ordens do STAE, facto que justificou a conclusão do processo pela manhã de quinta-feira.
Falta de cadeia de comando nos órgãos de gestão eleitoral
O Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” defende que o processo de credenciação, votação e apuramento dos resultados consolidou o argumento de que “não há uma cadeia de comando na CNE” e que a figura de Presidente e vice-Presidentes deste órgão “são apenas decorativas”.
“Todas as operações no terreno são coordenadas pelos directores provinciais do STAE e pelos presidentes da CPE [Comissão Provincial de Eleições], que recebem ordens dos Primeiros-Secretários do partido Frelimo e dos respectivos Chefes das Brigadas Centrais desse partido. Isso explica a grande impunidade com que os vários ilícitos eleitorais são praticados por parte dos membros e simpatizantes deste partido”, defende o relatório.
Os observadores eleitorais dizem, por exemplo, que a directiva emitida pelo STAE dois dias antes da votação, instruindo as Mesas de Votação a deixarem os eleitores sem cartões exercer o seu direito cívico, desde que os nomes constassem dos cadernos eleitorais, não foi acatada por todos os Presidentes das Mesas de Votação.
“Havia Presidentes de Mesa que aceitavam a directiva da CNE/STAE e havia outros que não aceitavam, isso retirou a possibilidade de voto a vários eleitores. Os casos de interpretação abusiva e discricionária desta medida aconteceram nos municípios de Cuamba e Lichinga (Niassa); Chiúre (Cabo Delgado); Monapo, Malema, Nampula, Nacala-Porto e Ribáuè (Nampula); Alto-Molocué, Morrumbala e Quelimane (Zambézia); Chimoio (Manica); Beira (Sofala), Chókwè (Gaza); Matola (província de Maputo) e na Cidade de Maputo”, descreve o relatório, sublinhando que, em muitas Mesas, os Presidentes selecionavam os eleitores que podiam exercer seu direito de voto sem cartão de eleitor.
Outra evidência de que não há cadeia de comando na CNE, diz o relatório, vem do processo de acreditação dos observadores: “foi simplesmente péssimo e concebido para dificultar a observação eleitoral”. O Consórcio diz que submeteu os pedidos de acreditação com pelo menos três semanas de antecedência, mas só recebeu parte das credenciais às 20h00 de terça-feira, dia 10 de Outubro.
“Os casos da província de Sofala, Nampula e Zambézia foram os mais preocupantes, o que criou enormes dificuldades ao Consórcio na logística de distribuição das credenciais às centenas de observadores no terreno”, defende, sublinhando que tal aconteceu porque as CPE não aceitaram o uso das credenciais emitidas durante o recenseamento eleitoral, apesar de a CNE ter garantido que as mesmas eram válidas para todo o processo.
“Nas Mesas de Voto dos municípios de Cuamba e Lichinga (Niassa); Chiúre (Cabo Delgado); Gurué e Mocuba (Zambézia); Beira (Sofala); Chimoio (Manica); Ilha de Moçambique, Angoche, Nacala-Porto e Nampula (Nampula), Presidentes das Mesas e agentes das Forças de Defesa e Segurança impediam que Observadores de «Mais Integridade» observassem a votação, apuramento e contagem dos votos. Uma das formas usadas era de exigir que, para além dos crachás, os observadores tivessem credenciais”, denuncia o Consórcio.
Os observadores lamentam ainda que a contagem e o apuramento de votos tenham acontecido em centenas de salas de aulas sem lâmpadas e/ou energia eléctrica: “a mesma CNE/STAE, que gastou milhões de Meticais na compra de carros para os seus membros seniores, para o aluguer de veículos, helicópteros, material de votação, etc., não conseguiu comprar lâmpadas para iluminar as salas de aulas e dar dignidade de trabalho a todos os envolvidos no processo”, lamenta.
Refira-se que o Consórcio Eleitoral Mais Integridade contou com 1.238 observadores em todas as autarquias do país e diz ter realizado a contagem paralela de votos em 16 municípios, sendo que os resultados serão divulgados oportunamente. (A. Maolela)