O grupo extremista Estado Islâmico realizou um total de 384 ataques em Moçambique em 2021, que resultaram em 1.127 mortos entre civis, militares e terroristas, segundo um relatório divulgado ontem (01) pelo Departamento de Estado norte-americano.
De acordo com o Country Reports on Terrorism 2021, documento publicado pelo gabinete de contra-terrorismo do Departamento de Estado dos EUA sobre as actividades terroristas no mundo, o ano em análise ficou marcado, em Moçambique, pela tomada da vila de Palma, em Cabo Delgado pelo Estado Islâmico de Moçambique (ISIS-M) em Março de 2021, e pela posterior resposta das Forças Armadas de Defesa de Moçambique, com o apoio da Missão militar da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SAMIM) e da Forca de Defesa do Ruanda (RDF), que “recuperou vastas zonas do território ”sob o controle do grupo terrorista”.
“Em 24 de Março, o ISIS-M atacou a vila de Palma, no nordeste, criando milhares de deslocados internos enquanto o ISISM expandia o seu controlo sobre a província” e “em resposta, a TotalEnergies interrompeu as suas operações de gás natural na península de Afungi e declarou força maior, observa o relatório.
A partir de Julho do mesmo ano, o destacamento da Missão militar da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SAMIM) em Moçambique e da Força de Defesa do Ruanda (RDF) “auxiliou as Forças Moçambicanas de Defesa e Segurança (FDS) a reconquistar o território, incluindo Palma e Mocímboa da Praia, uma cidade portuária estratégica que o ISIS-M havia tomado em 2020″.
Esta resposta permitiu ainda ao Governo moçambicano anunciar a 30 de Novembro desse ano que “as tropas capturaram 245 suspeitos de terrorismo e mataram 200 terroristas em combate”.
Por outro lado, a dispersão do grupo terrorista esteve na origem de vários ataques a aldeias, inclusive em dois distritos da província do Niassa, vizinha de Cabo Delgado, aponta o Departamento de Estado norte-americano.
O relatório estima que o ISIS-M manteve [em 2021] cerca de 800 operacionais activos no norte de Moçambique e a designação abrangente do ISIS-M empregada no relatório inclui entidades tão diversas quanto os grupos armados; Ansar al-Sunna: Ajudantes da Tradição Ahl al-Sunna wa al-Jamaa ou al-Shabaab em Moçambique, entre outros.
O relatório detalha os principais incidentes terroristas ocorridos em 2021, a começar pelo ataque e tomada de Palma a 24 de Março desse ano, que provocou a deslocação de 50 mil pessoas.
Em 12 de setembro, o ISIS-M emboscou um comboio de forças ruandesas no distrito de Mocímboa da Praia, matando quatro soldados da RDF e ferindo outros seis e no dia 2 de Outubro raptou sete mulheres da aldeia de Nacate, distrito de Macomia.
“Em Novembro e Dezembro, o ISIS-M atravessou pela primeira vez a linha de limite que separa Cabo Delgado do Niassa” e “atacou várias aldeias nos distritos de Mecula e Marrupa”, segundo o texto do Departamento de Estado norte-americano, equivalente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros.
“No dia 15 de Dezembro, o ISIS-M teria decapitado um pastor cristão no distrito de Macomia e ordenado que sua esposa entregasse a sua cabeça às FDS”, detalha o relatório.
O relatório aponta “nova legislação para alterar as actuais leis de terrorismo” introduzidas pelo governo moçambicano, nomeadamente sanções penais para crimes relacionados com o terrorismo doméstico. No entanto, “não houve mudanças significativas em 2021 na capacidade de aplicação da lei em Moçambique”, lê-se. “A segurança das fronteiras continuou a ser um desafio para Moçambique, sem alterações significativas” em 2021, acrescenta.
O combate ao financiamento do terrorismo merece uma nota particularmente negativa do Departamento de Estado norte-americano, resultante da observação de “lacunas importantes de compliance técnico” e da inexistência de uma Avaliação Nacional de Risco (NRA), “factores que colocam Moçambique em risco de colocação em A 'lista cinzenta' do Grupo de Accao Financira Internacional (GAFI) de países nomeados publicamente como deficientes em medidas de financiamento ilícito”.
Em causa esta o facto de nao ter cumprdo 80 por cento das recomendacoes internacionais contra o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo.
O governo moçambicano “começou a colmatar estas lacunas através da elaboração de novas leis sobre terrorismo doméstico, branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, embora todas estivessem pendentes de conclusão no final do ano”, refere o relatório.
A província de Cabo Delgado enfrenta há cinco anos uma insurgência armada com alguns ataques reivindicados pelo grupo extremista Estado Islâmico.
A insurgência levou a uma resposta militar desde Julho de 2021 com o apoio do Ruanda e da SADC, libertando distritos junto aos projectos de gás, mas novas vagas de ataques têm surgido no sul da região e na província vizinha de Nampula.
O conflito já deslocou um milhão de pessoas, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), e cerca de 4.000 mortos, segundo o projecto de registo de conflitos ACLED. (Carta)