Jogos Africanos do Cairo, 1991. Frente ao campeão africano do seu escalão, um ganês, Sinóia protagonizou o KO mais rápido da competição. O jogo começou. Lucas entrou decidido a não dar qualquer hipótese, partindo de imediato para o corpo-a-corpo. De repente...
passavam apenas 30 segundos do primeiro assalto e o ganês já havia sido enviado ao tapete. Uma sucessão de socos cruzados dirigidos à zona do estômago e um murro contundente ao queixo, lançaram-no ao tapete.
Lucas Sinóia, exímio no jogo à meia-distância, nem por isso se furtava ao corpo-a-corpo. Do seu registo de combates, ressalta o facto de raramente ter colocado pugilistas nacionais KO, em claro contraste com o que acontecia frente aos estrangeiros.
Interrogado sobre esse facto, respondeu: “nestas competições, tenho que demonstrar o que é a verdadeira auto-estima”, pois trago o país no coração.
CONTRASTE
Lucas Sinóia, natural de Tete, estatura sobre o baixo, é a “calmaria” em pessoa. Pouco falador, sempre pronto a fazer amigos, trata-se de um cidadão avesso a zaragatas e protagonismos.
Porém...
No ringue e após soar o “gong”, era um verdadeiro leão. Frequentou as escolas de boxe soviética, cubana e norte-americana, tendo sido, seguramente, dos melhores pugilistas moçambicanos de todos os tempos.
Deixou de ser praticante nos ringues, mas a modalidade nunca lhe saíu do coração, passando a ensiná-la aos mais novos.
Viu e trouxe ao país, algo impensável: o boxe feminino. Foi a partir dele, que nasceu por cá a “normalização” desta modalidade entre mulheres. O trabalho para (des)convencer paradigmas enraizados e que não constavam no “cardápio” da emancipação da mulher, seguramente que contou com o empenho do ex-pugilista.
Se há três/quatro décadas, era corrente a frase “o futebol não é para meninas”... imagine-se o pugilismo!
Dar força e expressão ao boxe no geral, foi a resposta de Sinóia, para se manter útil à modalidade e bem servir a terra que sempre amou. Foi ele quem motivou e clarificou as diferenças entre pugilismo e “mabanditismo”.
A tudo isto, é visível, juntou-se um conjunto de condições, como a dedicada Federação, liderada por Gabriel Júnior, mais o “boom” do surgimento de meninas corajosas e capazes de convencer amigos e familiares a apoiá-las numa modalidade antes subalternizada.
MULHER: MOSTRAR
E... DEMONSTRAR
Através de Rady Gramane e Alcinda Panguana, ficou demonstrado, na prática, que não faz sentido o “slogan” sexo fraco. As meninas deram e levaram murros, a pensarem no país. Não choraram pela dureza dos golpes.
E se no alto nível competitivo nos apresentávamos como uns coitadinhos, o que dizer agora em que as senhoras foram as principais responsáveis pelo nosso sucesso? E se equacionarmos, com realismo, o número de combates, alimentação, apoios e incentivos relativamente aos nossos opositores, veremos que face às condições investidas nas nossas medalhadas, poderíamos considerar que foram anões a derrotarem gigantes. Mas a falta de condições não ditou leis.
E por fim, também graças a Sinóia, fica demonstrado que atrás de lindas e corajosas mulheres... há sempre um homem forte!