O Centro de Integridade Pública (CIP) – organização da sociedade civil que se dedica à defesa da transparência e boa governação – defende que o discurso inaugural de Filipe Nyusi sobre o combate à corrupção e promoção da transparência, durante a sua investidura como Presidente da República para o quinquénio 2020-2024, “mostrou-se vazio em termos de conteúdo e sem uma estratégia mobilizadora que possa conduzir os moçambicanos no ataque a este fenómeno (corrupção), que tem sido uma das principais causas do contínuo subdesenvolvimento do país”.
A tese está expressa numa análise feita por aquela organização ao discurso de investidura de Filipe Jacinto Nyusi, proferido no passado dia 15 de Janeiro, a partir da Praça da Independência, na capital moçambicana.
No documento, de três páginas, o CIP afirma que a única novidade trazida no discurso de tomada de posse é o facto de Filipe Nyusi admitir a distinção entre pequena e grande corrupção, considerando assim ser essencial para uma reacção penal à “medida da elaboração e implementação de políticas reformistas visando a promoção da ética e da integridade na esfera pública”, pois, no seu entender, “até há bem pouco tempo, o Chefe de Estado recusava essa distinção operacional”.
Lembre-se que, no seu discurso inaugural, após ser reconduzido para o segundo mandato como Chefe de Estado, Filipe Nyusi disse: “não haverá tréguas na nossa luta contra este mal (corrupção)” e que “não haverá pequenos e grandes corruptos, tocáveis e intocáveis”, porque “nos distanciaremos dos que pretendem substituir a acção institucional da justiça por uma operação de caça às bruxas”.
Porém, para o CIP, um discurso de investidura de um Chefe de Estado e de Governo não é a apresentação de um programa de Governo, mas “é um exercício de visão estratégica sobre o país”, por isso, “era sua obrigação que apresentasse uma estratégia mobilizadora que conduzisse toda a sociedade a envolver-se no combate à corrupção e a acreditar na vontade política de liderar esta acção”.
“Entretanto, mais uma vez, não foi apresentada uma estratégia de como o Governo pretende combater a corrupção que corrói o tecido social e económico do país. Ou seja, quais são as linhas mestras para esse combate ao nível da administração pública nos seus diversos escalões (pequena, média e alta administração); ao nível do poder executivo para os titulares de cargos governativos e políticos, isto é, ao nível da chamada grande corrupção”, explica a fonte.
Para o CIP, para combater a corrupção, o Chefe de Estado deve garantir a independência necessária à Justiça e apoio institucional necessário à Procuradoria-Geral da República (PGR) para levar a julgamento os acusados das “dívidas ocultas” e outros acusados de crimes de colarinho branco, como a antiga Ministra do Trabalho, Helena Taipo e o antigo Ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula.
Deve ainda: “permitir que membros da sua família (seu filho) que são implicados nas 'dívidas ocultas' sejam investigados livremente pelo Ministério Público, sem interferência política; vir a público esclarecer a acusação feita contra si, de ter recebido pelo menos um milhão de dólares da Privinvest; permitir que o partido Frelimo, o partido que Filipe Jacinto Nyusi preside, acusado de ter recebido 10 milhões de dólares da Privinvest com evidências muito fortes disso, seja investigado em processo-crime pela PGR”, considera aquela organização da sociedade civil.
Contudo, o CIP reconhece a abertura do Chefe de Estado em aceitar a realização de uma auditoria internacional às “dívidas ocultas”, realizada pela Kroll entre 2016 e 2017, porém, defende que, nos primeiros cinco anos, “muito poucos resultados foram alcançados no que diz respeito ao combate à corrupção” e cita a falta de recuperação de activos como exemplo da falta de acções concretas para o combate à corrupção.
“A recuperação de activos é central, quando se refere ao combate à corrupção, uma vez que transmite a ideia de que o envolvimento em práticas corruptas não compensa e serve de factor inibidor para potenciais agentes não se envolverem em actos desta natureza”, sublinha. (Carta)