Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI

Blog

sábado, 07 janeiro 2023 07:54

FONSECA AMARAL

No dia 5 de Janeiro de 1993, passam hoje 30 anos, Noémia de Sousa ligou-me, com voz embargada, a dar-me a notícia da morte, em Queluz, do poeta moçambicano Fonseca Amaral. Eu vivia, à época, em Lisboa, e não era incomum encontrar-me com Noémia de Sousa, Rui Knopfli, Eugénio Lisboa, Fonseca Amaral ou Ruy Guerra. Aliás, uma vez chamei atenção do Ruy para o facto de ele ser vizinho do Knopfli e da Noémia, seus companheiros de adolescência, nos anos em que o cineasta viveu em Lisboa. A última vez que vi o Fonseca Amaral foi numa tertúlia em casa do Lisboa, em finais de 1992. Estavam todos esses nomes ínclitos da nossa literatura, à excepção de Guerra.

 

A primeira vez que ouvi falar do Fonseca Amaral foi num texto evocativo do Rui Knopfli, no caderno de poesia “Caliban”, número 2, de novembro de 1971, que ele fazia editar, na companhia do poeta Grabato Dias. Escrevera o autor das “Mangas Verdes com Sal”: “Fonseca Amaral é, por direito e mérito próprios, um dos nomes mais altos e representativos da Poesia em Moçambique e, simultaneamente, por desleixo ou abulia, um dos menos conhecidos e apregoados, espécie de grande ausente nos vários certames em que vamos acrescentando pátina às nossas acanhadas glórias caseiras.” Assim começavam as “Notas para a recordação do meu mestre Fonseca Amaral”, nas quais se acrescentava: “Tímido, reservado, inseguro de si próprio, que não da sua poesia, membro daquela família de criadores que, cumprindo-se embora, se apagam e auto-anulam não se sabe bem porque estranhos caprichos da vontade, é o poeta em larga medida responsável pela pouca, ou nenhuma, divulgação de uma obra merecedora da mais vasta audiência”.

 

A geração que desponta para a literatura nos anos ulteriores à II Grande Guerra muito lhe deve. Esta geração (à falta de melhor termo, di-lo Knopfli) incluía José Craveirinha, Noémia de Sousa, Ruy Guerra (e Rui Guedes da Silva, Rui Nogar e o pintor António Bronze e o próprio autor daquela homenagem.

 

Todos me falavam do Fonseca Amaral. Todos diziam bem do Fonseca Amaral. O Craveirinha, a Noémia, todos. Em Janeiro de 1990, munido de um gravador e um bloco de notas, levado pela mão do meu amigo Álvaro Belo Marques, fui bater-lhe a porta. Sabia que era um homem de certo modo sibilino, esquivo, tímido.

 

A conversa que mantive com ele foi espantosamente agradável. Emocionante até, eu diria. Nascido em Viseu, em 1928, João da Costa Fonseca Amaral fora para Moçambique com apenas três anos de idade. A sua infância – e por aí iniciamos a nossa conversa – fora passada no Xipamanine, nas terras do “Ka Amaral” (seu avô) –, com amigos negros com quem falava Ronga. Também tinha amigos de outras origens e que se misturavam naquelas periferias: muçulmanos, indianos, chineses. Passará pelo Chamanculo e, depois, a ascensão social levá-lo-á ao Alto-Maé, ao Bairro Central e à Polana. Na adolescência foi vizinho do Eugénio Lisboa, que irá, muitos anos mais tarde, prefaciar o livro “Poemas”, editado postumamente em 1999, pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

 

Falámos da infância, da juventude, sobretudo da juventude literária. Pus-lhe, entre muitas questões, uma que também pusera à Noémia: por que razão é que eles haviam colaborado na revista da Mocidade Portuguesa?  Fonseca Amaral: “Por ingenuidade, por sacanice”. Disse-me ele: “Era uma sacanice ingénua”. Julgavam que poderiam tomar de assalto a publicação. Tinham o ideário oposto ao defendido pela Mocidade, tanto mais que alinham com o MUD-Juvenil e, mais tarde, são presos: ele, Rui Knopfli, Ruy Guerra, os mais jovens; ou aqueles que ele chamaria de “os trutas”: Henrique Beirão, Sofia Pomba Guerra, Sobral Campos ou João Mendes, todos eles deportados para Portugal, presos em Caxias.

 

Sem provas, seriam libertados após o julgamento, mas o João Mendes segue degredado para Cabo Verde. João Mendes, é preciso lembrá-lo, irmão de sangue de Orlando Mendes, irmão de coração da Noémia de Sousa, que lhe dedicará Sangue Negro. Influenciados pelos neo-realistas, irão estes jovens lançar “os tentames de uma literatura de raiz marcadamente moçambicana”, como assinalará Knoplfi. Não é alheia, no entanto, a figura de Augusto dos Santos Abranches, que traz a Moçambique a experiência do “Novo Cancioneiro” de Coimbra e que divulga, com Fonseca Amaral, autores neo-realistas, da “Presença” e do “Orpheu”. Uma verdadeira agitação cultural.  Aliás, Amaral começou a publicar poemas na página literária “Sulco” do jornal “Notícias”, dirigida justamente por Augusto dos Santos Abranches. Isto nos anos 40, na companhia do poeta Alberto de Lacerda.

 

Foi funcionário dos Caminhos de Ferro. Há, na história da nossa literatura, da nossa cultura e da nossa inteligência, muitas figuras que passaram pelos Caminhos de Ferro. Um dia tenho que me atardar sobre o Caminhos de Ferro na vida de escritores, jornalistas ou intelectuais, que tiveram um papel activo na história cultural e política de Moçambique. Há uma importância simbólica que precisa de ser melhor escrutinada.  

 

Contou-me o Fonseca Amaral que foi o Augusto dos Santos Abranches que levou muitos dos jovens a desenhar, entre eles, o Rui Knopfli. É curioso: não me lembro de termos falado de Cassiano Caldas (que também foi funcionário dos Caminhos de Ferro), uma figura decisiva para a geração da Noémia e do Craveirinha. Não só pelas leituras emprestadas, mas também pelo magistério político. Aliás, Noémia irá também dedicar a Caldas o seu livro. Seria, aliás, ela que me levaria a conhecê-lo. Infelizmente, não o entrevistei. Mas aí está outra grande figura irrefutável para a nossa nacionalidade, que fazemos questão de obliterar.

 

Em 1955, Fonseca Amaral vai para Portugal onde permanece 20 anos. Escreve para a “Voz de Moçambique”. Traduz. A sua produção própria é, a despeito, avara. Regressado nos alvores da independência, entre o Ministério da Informação ou o Instituto Nacional do Livro e do Disco (INLD), em tarefas sempre urgentes e agitadas, num tempo que avulta a falta de quadros, onde é preciso fazer tudo, Amaral também não escreve. Sente-se, no entanto, esgotado.

 

A sua poesia se constituíra numa linha de cota do que viria a ser a nova poesia produzida em Moçambique. Mesmo assim parecia-lhe datada, não lhe apetecia reuni-la. Insisti com ele: “Fonseca Amaral, eu quero lembrar-lhe isto que você sabe melhor do que eu: os seus textos, mesmo datados, revestem-se de importância histórica e documental. As gerações presentes não têm à disposição a sua poesia em livro.” Ao que ele irá retorquir-me: “Nelson, eu sempre fui um homem de produção muito escassa. Os poemas, alguns, são dolorosos; doem muito. Para já não quero sofrer. Os poemas custam-me muito. Não é o acto, a caneta, o papel e a máquina. Doem muito. E agora devo fugir à dor. Sofri muito”.

 

Lembro-me como se fosse hoje. Foi uma confissão pungente. Vi, na sua revelação, um homem sincero e honesto. E não quis escavar mais a sua dor. Porém, ainda quis saber se ele escrevia. Disse-me que sim, às vezes, por catarse: “Para me equilibrar. Não tem interesse. São coisas muito pessoais. Tem que ver com a vida afectiva”. Divergimos, então, do tema que lhe doía, falamos dos extenuantes 5 anos que vivera em Moçambique no pós-Independência, das suas frustrações, do seu esgotamento, do regresso a Portugal, onde a mulher tinha uma carreira que lhe garantiria a reforma. Foi muito amável e senti que tinha sido muito sincero ao lembrar as suas memórias da sua já longa trajetória.

 

A última vez que o vi seria no aludido convívio em casa do Eugénio Lisboa. Eu tenho na memória de que o jantar, no qual estavam a Noémia e o Knopfli, aconteceu em casa do Lisboa. O poeta Eduardo Pitta, que também participou do convívio escreve no seu livro de memórias de que a nossa pândega literária ter-se-á dado em casa do Knopfli. Estou dividido entre a lenda e a realidade. Vou manter para mim que foi em casa do Lisboa. Pouco importa agora isso. Recordo-me, sim, do Fonseca Amaral, ali, pela última vez. Ele subscreveria o mito: com aquele seu ar mefistofélico acompanhou, discreto e elusivo, aquele jantar festivamente moçambicano.

 

Hoje já ninguém fala do Fonseca Amaral. Os seus companheiros estão quase todos mortos. A nossa memória literária ou cultural é dolorosamente maniqueísta. Falta-nos parcimónia e critérios de valoração que tenham empatia e critérios de abertura. Falta-nos, no fim, uma memória que não seja assaz tribal. Temos a noção de que tudo é fruto de geração espontânea. Quis recordá-lo hoje, quando passam 30 anos sobre a sua morte, creditando-lhe, nesta brevíssima evocação, como o fizera Knopfli, e alguns outros, a importância capital que ele tem na construção do nosso cânone literário – do cânone literário moçambicano. Devemos-lhe isso. O magro espólio que deixou, e que felizmente se encontra reunido em livro, é dos mais significativos nos anos que marcam o nascimento daquilo que hoje chamamos literatura moçambicana, entre os anos 40 e 50 do século XX. Ele é um dos seus fundadores e merece o nosso preito.

 

Cidade do Cabo, 5 de Janeiro de 2023

JoaoNhampossanovaa220322

A Política de Terras aprovada pelo Conselho de Ministros através da Resolução n.º 45/2022, de 28 de Novembro, tem como objectivo geral “assegurar e garantir o acesso, uso e aproveitamento e posse da terra pelas comunidades locais, cidadãos nacionais e estrangeiros, na sua capacidade de utilizadores e investidores, bem como promover o seu uso racional e sustentável, contribuindo para o desenvolvimento sócio-económico, criação de bem-estar para as actuais e futuras gerações de moçambicanos.” Este objectivo encontra suporte no n.º 3 do artigo 109 da Constituição da República de Moçambique (CRM) que estabelece o seguinte: “Como meio universal de criação da riqueza e do bem-estar social, o uso e aproveitamento da terra é direito de todo o povo moçambicano.”

 

Nos últimos anos, tem havido vários conflitos de terra como resultado de processos de  atribuição de direito de uso e aproveitamento de terra (DUAT) extremamente problemáticos por transacções ou cedências de enormes extensões de terras às grandes empresas, incluindo as multinacionais, cuja actividade de exploração de recursos naturais e outros investimentos em agronegócios tem dado lugar, vezes sem conta, à perda injusta do DUAT das comunidades locais que residem nas zonas alvo de exploração dos recursos,  particularmente pelas corporações.

 

Em bom rigor, importa aqui lembrar que os direitos sobre a terra das comunidades locais são transmitidos às empresas e outras pessoas financeira ou economicamente poderosas sem qualquer intervenção e possibilidade de negociação por parte das mesmas comunidades que, recorrentemente, não beneficiam, em termos práticos, de qualquer percentagem na negociação celebrada entre o Governo e as empresas sobre o DUAT de que são titulares. Ademais, nesses casos, o processo de extinção de DUAT tem se manifestado ilegal, constituindo um indubitável acto de usurpação de terras das comunidades locais.

 

Ora, tendo em conta a realidade supra referida, a nova Política de Terras, de forma ousada, criou a possibilidade de negociação directa do DUAT entre os seus legítimos detentores e os novos interessados com vista à protecção dos direitos pré-existentes e benefícios directos por meio de intervenção autónoma das famílias na gestão dos seus direitos sobre a terra em causa, o que constitui uma clara abertura para a outorga legal de poderes às comunidades locais para negociarem os seus direitos sobre a terra no contexto da exploração dos recursos naturais e outros investimentos, senão vejamos:

 

O parágrafo 85 do pilar 7 da nova Política Nacional de Terras referente ao Reconhecimento, Titulação e Garantias de Direitos Pré-Existentes determina o seguinte: “A presente Política de Terras considera que a implantação de projectos económicos em áreas onde haja direitos pré-existentes não implica, necessariamente, a extinção destes direitos e nem dá lugar à expropriação de terras, devendo-se assegurar os procedimentos legais adequados em sede de negociação entre os novos interessados e os actuais ocupantes. Importa ainda a previsão de critérios claros que assegurem benefícios directos para a população local em virtude de investimentos privados sobre a terra e outros recursos naturais locais.”

 

Decorre do supracitado preceito da Política de Terras que o processo de reforma legal da legislação sobre a terra deve prever normas claras que estabelecem os critérios de negociação dos direitos sobre a terra por parte das comunidades locais, sem, no entanto, pôr em causa o princípio geral previsto nos nºs 1 e 2 do artigo 109 da CM de que: “A terra é propriedade do Estado e não deve ser vendida, ou por qualquer outra forma alienada, nem hipotecada ou penhorada.” Aliás, não pretende a nova Política de Terras abrir espaço para a venda da terra, senão a possibilidade de se conferir poder de negociação do DUAT pelos legítimos titulares em caso de implantação de projectos económicos, sobretudo, em matéria de exploração dos recursos naturais, dando, assim, oportunidade das comunidades locais beneficiarem directamente da riqueza existente nas terras sobre os quais detêm o DUAT nos termos previstos na CRM.

 

Entretanto, para que esse desiderato da nova Política de Terra seja eficaz e concretizado, é necessário que esteja prevista na Lei de Terra e no respectivo regulamento, incluindo a previsão legal da obrigatoriedade da intervenção do Provedor de Justiça, da Comissão Nacional dos Direitos Humanos, da Ordem dos Advogados de Moçambique e da representação da sociedade civil interessada na matéria, através de emissão de pareceres e recomendações, atendendo às atribuições e competências dessas instituições em matéria da garantia e defesa dos direitos humanos, dos direitos e liberdades dos cidadãos, da legalidade e, em última instância, da justiça, particularmente dos grupos vulneráveis como o são as comunidades locais.

 

Vale aqui insistir na ideia da obrigatoriedade de intervenção das supra referidas instituições de justiça, considerando que a realidade mostra que,  em Moçambique, existe uma tendência em alimentar a discriminação na questão dos direitos sobre terra, na medida em que se privilegia determinadas pessoas com status de natureza social, económica/financeira, político ou as elites em detrimento do grosso da população que é pobre, vulnerável e que não compreende os seus direitos relativos à terra do ponto de vista do direito positivo.

 

Portanto, não obstante os questionamentos que possam advir sobre os critérios, formas ou procedimentos da negociação em questão, dúvidas não restam de que a visão política para o estabelecimento legal de um poder de negociação dos direitos sobre a terra por parte das comunidades locais à luz do estabelecido no parágrafo 85 do pilar 7 da nova Política de Terras,  lido conjuntamente com alguns dos princípios previstos na mesma, como são os casos dos que constam dos pontos (ii) e (iii) do parágrafo 40, respectivamente, princípio do reconhecimento do acesso, uso e aproveitamento e posse da terra como direito humano básico, garantido pela Constituição e do qual ninguém pode ser privado ou retirado, salvo nos casos previstos e justificados nos termos da lei e princípio do respeito pelos direitos das comunidades locais, das famílias e outros titulares de direitos, adquiridos por ocupação, segundo o sistema consuetudinário e por boa-fé; revela uma clara vontade do Estado em garantir que determinadas pessoas não tenham benefícios sobre a terra à custa da violação dos direitos fundamentais dos legítimos titulares do DUAT e a consequente marginalização de determinadas comunidades locais e outras pessoas e benefícios das empresas conforme se verifica há muito até ao presente momento.

 

Por: João Nhampossa

 

Human Rights Lawyer

 

Advogado e Defensor dos Direitos Humanos

sexta-feira, 30 dezembro 2022 19:37

2023: seja bem-vindo!

Adelino Buqueeeee min

“Dentro de cada pessoa há dores que ninguém conhece, sacrifícios que ninguém viu, cicatrizes que ninguém cuidou. Há sentimentos que ninguém pode julgar porque ninguém chorou as mesmas lágrimas, sofreu a mesma dor... cada um de nós sabe o que tem no coração e ninguém no mundo pode se dar ao luxo de julgar”.

 

In anónimo 

 

O ano de 2022 já se foi ou já se vai. Cumpriu com os seus propósitos e nós, como bons cidadãos desta terra, devemos olhar para o céu e dizer “OBRIGADO”, obrigado por termos passado ou estarmos a passar de 2022 para 2023 porque, como sabemos, há muita boa gente que não conseguiu essa façanha. Muitos dos nossos amigos nos deixaram, vizinhos, irmãos, amigos e inimigos já não estão entre nós. Assim Deus quis, levante a cabeça e diga OBRIGADO SENHOR!

 

No balanço que cada um fará deste ano, muitos dirão: as minhas metas não foram cumpridas, esquecem que DEUS lhes dá oportunidade de continuarem com seus propósitos em 2023. Pense, caro amigo, naqueles que, não tendo cumprido com as suas metas de 2022, jamais o farão porque o altíssimo os chamou para junto de si! Que dirão os filhos, marido ou mulher dessa pessoa sobre a vida. Mais uma vez, não julgue o 2022, simplesmente, levante a cabeça e diga OBRIGADO.

 

A título pessoal, o ano de 2022 foi um ano de muito aprendizado, estive isolado na transição de 2021 para 2022 devido à Covid 19. Tive que ser operado a vista, sofria de catarata e, no processo de tratamento, descobri que sou diabético e, para tratar-me, Deus colocou à minha frente o Dr. Gilberto Manhiça, um grande Médico e Homem no sentido humanista. Obrigado Senhor por me ter colocado este homem para me curar.

 

No caso específico da vista, Deus colocou um cidadão estrangeiro de nome Kumar, o Dr. Kumar do Hospital o OLHO, homem de uma simpatia invulgar, conversador e, acima de tudo, também com alto sentido de humanismo. Conheci-o graças ao meu estado de saúde, doença de catarata, de contrário não teria conhecido este grande homem. Por isso digo: obrigado Senhor por tudo quanto passei neste ano de 2022.

 

Terminado o tratamento da vista, vim a saber que sofria de câncer, para tanto, Deus colocou no meu caminho o Dr. Karim Kumark do Yashoda Hospital, um oncologista de mão cheia. Mas, antes do Dr. Kumark, Deus colocou a Dra. Neyma, uma oncologista do Hospital Central de Maputo, uma Médica que me parece ter nascido com vocação para aquele trabalho. Por vezes fazia consultas à meia noite e ela esteve sempre disposta a ajudar-me, tudo porque estava doente, de contrário não teria conhecido a Dra. Neyma Oncologista do Hospital Central de Maputo, obrigado Senhor.

 

Neste percurso todo, redescobri a minha esposa depois de celebrarmos as BODAS DE PRATA, não era para menos, a minha mulher é de uma convicção e fé inabalável. Durante este período, incluindo agora, passamos a fazer orações no mínimo duas vezes ao dia e, nesse processo, ela é que assume a responsabilidade de orientar. Tive a oportunidade de dizer para ela: “não sei o que seria de mim sem ti”. É que, em vários momentos eu mostrei fraqueza e desânimo, pensei nas piores coisas, mas ela esteve sempre ali a moralizar-me e dar-me esperança, afinal, sem saber, Deus colocou-me um anjo na minha vida, por isso digo: obrigado Senhor, obrigado Noémia João Langa Buque!

 

Existe o risco de esquecer algum facto, nome ou lugar que me fez bem neste ano, mas isso não significa necessariamente o menosprezo por esse facto ou pessoa, por isso agradecimentos a todos, com realce a Yara Cassamo, uma jovem estudante que está na República da Índia. Esta jovem é imprescindível para quem demanda aquelas paragens por razões de saúde. Através dela, quero agradecer a muitas outras pessoas que directa ou indirectamente nos apoiaram nessa empreitada. Obrigado a todos, obrigado Yashok, kkkkkk.

 

Por tudo isto, durante muito tempo na cama, deu para pensar nos meus filhos, meus netos e olhar para eles e sentir o quanto sou amado. O ano de 2022 foi um ano difícil para mim, mas, por outro lado, foi um ano que serviu para abrir-me a vista para a felicidade. Convivi mais com meus filhos como nunca, privei mais com minha esposa como nunca, aprendi a conhecer melhor os meus netos e outros familiares e concluo dizendo que nada acontece por acaso nas nossas vidas, por isso obrigado Senhor e Adeus 2022, ficarão as saudades e ensinamentos!

 

Adelino Buque

ilidioNhantumbo min

Discursos políticos e desenho de políticas públicas são matérias entrosadas, mas separadas. Os políticos não devem tomar seus discursos políticos como dados adquiridos, presumindo que os cidadãos não percebem. Ou seja, que os cidadãos são tolos e que quem sabe bem das coisas é Eneas Comiche, Edil da Cidade de Maputo. Num discurso percebido como contraditório, Comiche afirma que a Cidade de Maputo “não deve ser usada como depósito de lixo” referindo-se a viaturas usadas, mas importadas e comercializadas no município que ele preside há anos, no mínimo em dois mandatos de 5 anos cada. Ele vai mais longe dizendo: “preocupa-me que sejamos depositários de lixo proveniente de países produtores de viaturas. São sucatas [...] que não sabemos qual é a origem e podem até ser resultantes do roubo e que não devíamos permitir que isso acontecesse”.[1]

 

Ele descobriu que o município que dirige tem parques de sucatas só neste último ano do seu segundo mandato? Ora, aos munícipes que ele governa, são alarmantes as incongruências dos discursos do Edil da Cidade de Maputo.

 

Dr. Eneas Comiche não é “cidadão comum” - e desinformado, nem consultor para recomendar a tomada de decisões sobre os destinos da Cidade de Maputo. Ademais, o Edil da Cidade de Maputo tem estatuto diferenciado dos demais presidentes dos actuais 53 municípios de Moçambique. E mais, Comiche não é consultor do Governo de Moçambique. Ele é sim, decisor eleito e dele se espera, responsabilidade e tomada coerente de decisões. Alguns pontos me atraíram para avaliar o discurso do Edil de Maputo como sendo de larga inconsistência, irresponsabilidade, e, acima de tudo, alguma ironia. Destaco quatro pontos: (i) proveniência e processo de importação de viaturas; (ii) atribuição de espaços para armazenamento e venda de viaturas; (iii) atribuição de licenças para venda de viaturas; e (iv) clientes das viaturas a que apelida de sucatas.

 

A importação de viaturas é grandemente feita na Cidade de Maputo, Município que Comiche dirige. Os navios transportadores de viaturas atracam no Porto de Maputo e as viaturas importadas são de proveniência que ele não desconhece. Me parece óbvio que os agentes alfandegários e importadores de viaturas não trabalhem com total desconhecimento do Edil da capital da República de Moçambique. Se Comiche não conhece a proveniência das viaturas, então que assuma não ser edil competente. O processo de registo de automóveis ocorre no município que ele dirige e sabemos que ele não desconhece, apenas me parece cínico ao discursar com tom de desconhecimento da proveniência das viaturas que entram pelo porto de Porto de Maputo. Ou os assessores dele o induziram a isso. Mesmo assim, não deixa de ser incoerente para o cidadão Comiche que cresceu, viveu, e ainda vive na Cidade de Maputo.

 

Dr. Comiche conhece o dia-a-dia dos residentes do seu Município em matéria de transporte. Bem o sabe que não existe sistema estabelecido e competente do sector de transportes. A zona metropolitana do Grande Maputo é governada por Comiche e equipa de governação por ele construída. Bem o sabe, Comiche, que sem as viaturas a que chama de sucatas, a classe média da Cidade de Maputo, não encontraria alívio do inexistente sistema de transporte. Bem o sabe, Comiche, que os autocarros que transportam passageiros na cidade de Maputo não permitiriam o funcionamento do aparelho do estado no horário entre 7H30 e 15H00. Que nos diga o Edil de Maputo por que razão permite a importação de tais sucatas, talvez porque ele goze das regalias fruto dos impostos dos cidadãos. Em 2021 Comiche prometeu FUTRAN, sistema de transporte com veículos suspensos, que estaria operacional até finais de 2022, em Dezembro aparece com discurso incoerente. Terá, entre 2021 e 2022, descoberto que FUTRAN seria sucata na Cidade de Maputo? Há falta de lucidez no seu discurso, por que razão terá omitido esse fracasso? Eesperamos FUTRAN operacional até 31 de Dezembro de 2022.

 

Em segundo lugar, de acordo com Eneas Comiche, “é notável a proliferação de parques de venda de viaturas usadas, com destaque para a Avenida Joaquim Chissano, Avenida de Angola e Avenida Acordos de Lusaka”. Finalmente, desde a sua tomada de posse, o Edil se fez sair do escritório e voltar a percorrer os bairros por onde passou em busca do voto nas eleições autárquicas de 2018. Será que nessa altura não existiam parques de venda de viaturas a que hoje apelida de sucatas? Sr. Edil da Cidade de Maputo, os eleitores não são tolos, bem o sabem que o que diz não passa de discurso contraditório. Quem foi que “vendeu” os espaços e quem foi que comprou as casas que se tornaram parques de venda de viaturas? O Edil Comiche, afinal não sabe que terra é propriedade do Estado e não pode ser vendida?

 

Em terceiro lugar, se Comiche é Edil da Cidade de Maputo, se esses espaços das avenidas a que se refere não têm DUAT, de quem é a culpa?  É que para além desses espaços que o Edil menospreza, aos locais ao lado desses parques, Comiche alguma vez foi verificar a existência de DUAT? De quem é o dever de atribuir e fiscalizar? Somente nessa visita ao distrito KaMaxaquene é que verificou que havia parques de venda de viaturas, avaliou o seu estado e chegou à conclusão de que se tratava de sucatas? Se o senhor Edil sabe governar devia, com antecedência, ter sabido que há importação de sucatas que ocupam espaços sem DUAT. As eleições estão à espreita e queremos ver as viaturas que farão parte da sua frota de campanha eleitoral. Somente hoje que Dr. Comiche visita KaMaxaquene é que percebe que autoriza ilicitudes?

 

O Edil de Maputo autorizou e hoje recua, quer parar de financiar terrorismo, lavagem de dinheiro, venda de drogas e outras actividades ilícitas? Só em Dezembro de 2022 é que se apercebeu que estava no espírito do “deixa-andar” nesse tipo de negócios? Afinal a sua polícia camarária não coopera com a Polícia da República de Moçambique? Afinal o Município da Cidade de Maputo não é o único em Moçambique com estatuto especial? Afinal o Dr. Comiche não acompanha o processo de descentralização quando se trata de assuntos preocupantes? Hoje, o Edil Comiche, finalmente, sabe que não devia permitir esse tipo de negócios, mas ainda permite. Quem foi que disse ao Dr. Comiche que aqueles negócios são ilícitos? Terá enviado inspectores da sua equipa de governação para fazer levantamento das ilicitudes dos parques de sucatas?

 

Em quarto lugar, o Edil de Maputo está apoquentado por assuntos que só faltando 10 meses das eleições autárquicas é que revela. Quem é que adquire essas viaturas? Afinal o Edil Comiche não sabe o que acontece no Município que Governa? Presidente Comiche não pode fazer ouvidos de mercador, os seus próprios funcionários compram viaturas nesses parques e, para ajudá-lo a saber da proveniência, declare que colabora com as alfândegas e irá saber detalhadamente, embora saibamos que o Senhor Edil sabe. Dr. Comiche sabe que seus munícipes esperam os resultados do que prometeu durante a campanha eleitoral em 2018, e mesmo nos seus anteriores mandatos.

 

Finalmente o Edil Comiche se preocupa com o meio ambiente. Só em Dezembro de 2022 percebeu a existência de sucatas importadas na cidade de Maputo. Terá também observado que as sucatas anteriores ao Acordo Geral de Paz de 1992 ainda estão nos passeios das avenidas do seu município? Como é que pretende remover as recém-importadas sucatas, ainda em circulação, quando ainda não conseguiu remover as sucatas que não conseguiu remover nos seus mandatos anteriores? Pode incluir como uma das suas prioridades do próximo possível mandato em 2023, a recolha de sucatas importadas. Entretanto, garanta aos munícipes que não irá usar lixo importado para sua campanha eleitoral. E irá, igualmente, atribuir DUAT aos demais cidadãos vizinhos desses parques que operam sem DUAT.

 

Dr. Comiche é livre de suas convicções anti-poluição, anti-terrorismo, anti-negócios ilícitos, mas que não se aproveite de pequenas visitas à KaMaxaquene para, aparentemente, desabafar. O Edil da Cidade de Maputo tem Partido, tem equipa de governação, tem assessores e aí pode desabafar, se realmente forem suas intenções. A Constituição da República atribui liberdade de expressão ao Dr. Comiche, mas que não tire benefícios da sua posição de edil para exprimir o que poderia achar estando fora do cargo que ocupa. Patrocinando terrorismo, tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e demais ilicitudes, pouco sabemos, mas sabemos que os donos desses parques e seus clientes pagam impostos e taxas que Dr. Comiche recolhe. O Edil de Maputo bem sabe que cobra taxa de lixo aos donos de parques e seus clientes, não estará desta forma a patrocinar ilicitudes? Enquanto isso, Dr. Comiche, aguardamos pela inauguração do FUTRAN neste mês de Dezembro de 2022.

 

[1] Vide jornal O País de 8 de Dezembro de 2022

quarta-feira, 28 dezembro 2022 07:46

Um Natal passado no silêncio

AlexandreChauqueNova

Já não sou propriamente um homem de euforias, as festas do Natal e do fim-de-ano não mudam muito a minha rotina. A cidade transforma-se, eu não. Há um entusiasmo na vizinhança, denunciado pela música alta demais, então tenho que fazer um esforço doloroso para suportar aquilo. As compras que vou fazer  são as mesmas de sempre, poucas, ao limite das possibilidades. Mas vai ser difícil dormir com este barulho todo, que não me permite sequer assistir a televisão ou ouvir transquilamente a Rádio.

 

Se não fosse o David  estaria lixado. Foi ele que ligou para o meu celular perguntando se queria dar uma volta, eu disse que sim, assim estaria livre deste inferno. David é um solitário como eu. Detesta barulho, nem que seja em festa. Cultiva o silêncio no bairro de Nhapossa onde vive numa casa sem muro de vedação, para quê o muro se eu sou um homem livre! Nem grades tem nas portas e janelas, não preciso!

 

Então veio no seu carro, um Mitsubichi Pajero velhaco, porém em condições de nos levar para onde queremos ir nesta noite de quarto crescente. Olhou para mim e disse, estás jovial! Respondi com um sorriso, ao mesmo tempo que lhe perguntava sobre a trajectória que iamos seguir. David não tinha mapa traçado, eu também não. O que queriamos era encontrar um lugar tranquilo, sem música e esse lugar não sabemos onde está.

 

Saímos da Fonte Azul e andamos ao calha. Passamos pela Ponte Cais - uma obra inquebrantável - cujas lâmpadas  de iluminação dependuradas nos postes, ao longo de toda a plataforma, tornam o lugar muito lindo à noite, sobretudo quando é contemplado a partir da zona da prancha. E hoje não está ninguém neste sítio que se tornou, durante tempos e tempos, um ponto importante de encontro da juventude, e o David disse, vamos ficar aqui um tempinho.

 

Sentamo-nos no passeio com as pernas suspensas para a água em maré cheia que se esbate na barreira, movendo-as em relaxamento  como quatro badalos que, mesmo cansados, ainda têm duas almas fortes que as sustentam. Parecemos fedelhos, mas  issos é mentira. As memórias que alimentam a nossa conversa não nos deixam enganar a ninguém, nem a nós própriios. Somos felizes assim, longe das nossas namoradas que decidiram passar com as suas famílias, e nós sozinhos.

 

A maré é calma, não se ouve nenhum som daqui onde estamos, a não ser o cantar do próprio silêncio e, de longe, o leve roncar dos motores fora-de-bordo das barcaças que vão e vêm com passageiros indo ao encontro dos seus sonhos e frustrações, cada um com o seu destino, como nós que estamos aqui, ruminando alegrias da infância e da adolescência e da juventude. Ninguém nos dá cavaco. Temos um catalisador no coleman que alimenta os nossos vaipes. Cada vez que vai um copo, vamos ficando mais lúcidos,  e assim amanheceu sem darmos conta, felizes da vida.

 

São cinco horas da manhã e já não dá para mais. Voltamos para casa animados  e satisfeitos pela decisão que tomamos de nos isolar,  e no dia 25 já não houve o barulho do dia anterior,  de modo que deu para repousar e agradecer a Deus por nos ter protegido.

terça-feira, 27 dezembro 2022 12:22

Efigénio Baptista: figura do ano 2022!

A eleição da figura do ano, no nosso País, não tem um padrão definido claro, através do qual, as pessoas deveriam procurar encaixar a figura proposta e, por via disso, oferecer espaço de debate público e criar-se um consenso. Cada organização escolhe a figura e justifica a sua escolha e assim vamos andando com figuras da nossa Pérola do Índico!

 

Devo dizer que não faz parte das minhas reflexões propor figura do ano e tão pouco discutir essa figura proposta seja por quem for. No entanto, este ano, abro excepção para propor como figura do ano o Senhor Juiz Dr. Efigénio Baptista, Juiz das “dívidas ocultas” que esteve em foco ao nível do País e do mundo. Não creio que antes deste caso fosse tão conhecido e badalado o Juiz Efigénio Baptista, mas, graças a este julgamento, qualquer cidadão nacional sabe que existe um cidadão de nome Efigénio Baptista!

 

A minha escolha não visa avaliar o seu desempenho como Juiz, não tenho essa capacidade e tão pouco me proponho a tão hercúlea tarefa, mas tão somente falo de um homem cujo nome saiu do anonimato e passou a ser parte do quotidiano dos moçambicanos e não só. Hoje, arrisco-me a dizer que o Juiz Efigénio Baptista é tão popular quanto os políticos, músicos e outras figuras que estão na boca do povo todos os dias.

 

Como disse, a escolha pessoal da figura do ano tem que ver com o facto de, na minha opinião, até a altura que ficou com o caso das “dívidas ocultas” não era tão conhecido, mas, o efeito dos órgãos de comunicação social, aliado ao interesse que o caso despertou no comum cidadão, este passou a ser parte dos debates populares em tudo quanto é canto deste Moçambique e não só.

 

Nesta classe de profissionais, de quando em vez emergem pessoas que se tornam figuras populares e ascendem a cargos de maior visibilidade, graças a causas que julgam. Foi assim com o Juiz Augusto Paulino que julgou o caso do assassinato do Carlos Cardoso. Depois deste caso, o Juiz Augusto Paulino ascendeu a Procurador Geral da República de Moçambique. Não estou a dizer que a ascensão seja automática, tudo depende da forma como a classe política for a avaliar o seu desempenho no caso. Se concluírem que foi de grande competência, naturalmente ascende e se concluírem que não foi competente, provavelmente volte à sua “vida pacata” de um profissional como outro qualquer.

 

Aqui, o caro amigo pode se questionar, se é preciso agradar os políticos para se ser nomeado para cargos superiores. O agradar a que me refiro não tem que ver com a satisfação de capricho de quem quer que seja, mas com a avaliação objectiva do sucedido. Lembrar que a nomeação de Procurador Geral da República, do Presidente do Tribunal Supremo, do Administrativo e outros é da competência do Chefe de Estado e não resulta da escolha da classe através dos seus pares e como é óbvio o Chefe de Estado é político.

 

Bom, aqui fica a minha opinião sobre a figura do ano de 2022. Repito, a minha escolha não tem que ver com a avaliação do desempenho do Juiz, não tem que ver com eu gostar dele ou não, tem sim que ver com o grau de popularidade que teve durante o ano de 2022, popularidade ganha no desempenho da sua profissão que, nem ele próprio, acredito, imaginava que pudesse estar nesse patamar de popularidade e, o mais importante, quer me parecer que a popularidade não o envaideceu. Pronto, para mim Efigénio Baptista é a figura do ano 2022!

 

Adelino Buque

Pág. 93 de 320