Moçambique considerou ontem, nas suas alegações finais no julgamento sobre o caso das “dívidas ocultas”, a decorrer no Tribunal Comercial de Londres, ser “simples” que funcionários públicos moçambicanos foram subornados pelo grupo naval Privinvest.
O advogado Jonathan Adkin, que representa a Procuradoria-Geral de Moçambique, afirmou esta quarta-feira que “o caso é simples”. “O senhor [Iskandar] Safa e a Prinvinvest ofereceram e pagaram subornos a funcionários públicos e associados para obter transações e garantias assinadas. Como resultado destas transações e garantias, a República [de Moçambique] sofreu e continua a sofrer enormes perdas”, vincou.
Moçambique acusa a Privinvest e o proprietário, Iskandar Safa, de que subornar funcionários públicos, em particular o antigo ministro das Finanças Manuel Chang, para viabilizar contratos de financiamento a três empresas estatais (Proindicus, EMATUM e MAM) para a compra de braços de pesca e equipamento de segurança marítima.
A Privinvest nega ter cometido qualquer irregularidade, alegando que pagamentos realizados às pessoas em causa foram investimentos, pagamentos de serviços e contribuições para campanhas políticas.
Adkin invocou como provas correspondência entre o negociador da Privinvest Jean Boustani e Teófilo Nhangumele, o alegado consultor que mediou os contactos com Bruno Langa, amigo de Armando Ndambi Guebuza, o filho do ex-Presidente moçambicano Armando Guebuza.
Os três foram condenados em 2022 a 12 anos de prisão cada após um julgamento em Maputo por tráfico de influência e por receberem subornos para facilitar acesso ao antigo chefe de Estado.
O advogado britânico referiu também os depoimentos dos antigos funcionários do Credit Suisse Andrew Pearse, Surjan Singh e Detelina Subeva num processo nos Estados Unidos em 2019 a admitir ter recebido pagamentos ilícitos.
O Estado moçambicano estima que, até à data, sofreu perdas e responsabilidades de 2,1 mil milhões de dólares (1,95 mil milhões de euros no câmbio atual), segundo documentos apresentados ao tribunal.
Além de uma indemnização para compensar estas perdas e responsabilidade por pagamentos futuros relativos ao refinanciamento de obrigações, quer também 992 milhões de dólares (920 milhões de euros) para o caso de perder os processos levantados pelos bancos VTB e BCP sobre pagamentos em falta.
O banco russo e o banco português querem ser ressarcidos pelo financiamento dado em 2013 e 2014 às empresas públicas moçambicanas MAM e EMATUM. Moçambique argumenta que o alegado envolvimento de um funcionário do VTB, Makram Abboud, em pagamentos corruptos invalida os contratos, pelo que parou o reembolso. No total, Moçambique exige à Privinvest e respetivo proprietário 3,1 mil milhões de dólares (2,9 mil milhões de euros).
Antes do julgamento, o Governo moçambicano chegou a um acordo extrajudicial com o grupo UBS, dono do Credit Suisse, que resultou no perdão de cerca de 450 milhões de dólares (417 milhões de euros no câmbio atual) ao país africano.
De acordo com documentos hoje revelados pela defesa jurídica de Moçambique, o mesmo acordo implicou o pagamento de 142,8 milhões de dólares (132,4 milhões de euros) a outras instituições financeiras envolvidas no contrato da Proindicus.
Entretanto, Credit Suisse, a Privinvest e Safa também anunciaram ter encontrado "uma solução global para todos os litígios presentes e futuros entre eles”, permitido ao banco suíço e aos antigos funcionários abandonarem o caso.
A antiga diretora Nacional do Tesouro Isaltina Lucas, que também fazia parte do processo, chegou igualmente a acordo com Moçambique e o Credit Suisse para deixar de ser potencialmente responsável de qualquer indemnização. As alegações finais vão continuar até 21 de dezembro, mas a decisão do juiz Robin Knowles deverá demorar vários meses até ser anunciada. (Lusa)