O proprietário e administrador da construtora Walid Construções, Mohamed Fakih, disse segunda-feira ao Tribunal da Cidade de Maputo que foi o grupo Privinvest, sediado em Abu Dhabi, que pagou as obras realizadas nos imóveis de António Carlos do Rosário, ex-director de inteligência económica do serviço de segurança moçambicano, SISE, em 2013-2014.
Rosário é uma das 19 pessoas julgadas por crimes financeiros relacionados com o escândalo das “dívidas ocultas” de Moçambique. A PGR suspeita que a riqueza repentina de Rosário, e vários outros suspeitos, resultou de subornos pagos pela Privinvest.
A Privinvest foi a única contratante de três empresas fraudulentas ligadas à segurança, a Proindicus, Ematum (Companhia de Atum de Moçambique) e MAM (Gestão de Activos de Moçambique). Rosário tornou-se presidente do conselho de administração das três empresas.
As empresas obtiveram empréstimos de mais de dois bilhões de dólares dos bancos Credit Suisse e VTB da Rússia, com base em garantias de empréstimos ilegais emitidas pelo governo da época sob o então presidente Armando Guebuza.
Todo o dinheiro foi enviado para a Privinvest, que então forneceu às empresas barcos de pesca muito caros, navios de patrulha e outros activos. O superfacturamento permitiu à Privinvest gastar pelo menos 200 milhões de dólares em subornos.
Pela única vez neste julgamento, uma testemunha prestou depoimento por vídeo-conferência. Fakih tem nacionalidades argelinas, moçambicana e portuguesa, e actualmente vive em Argel. Graças à cooperação das autoridades judiciais argelinas, foi estabelecida uma ligação de vídeo entre os tribunais argelinos e moçambicanos.
Foi Rosário quem quis Fakih como testemunha, mas seu depoimento não pode ter feito bem a Rosário. Ele disse que Rosário é cliente da Walid Construções desde 2009. Entre 2012 e 2015, a Walid trabalhou em três projectos de construção para Rosário – uma casa grande no bairro nobre de Belo Horizonte, nos arredores de Maputo, e hotéis em Belo Horizonte e na zona oeste cidade de Tete.
Fakih disse que a Walid recebeu pouco mais de três milhões de dólares por esse trabalho. Mas esse dinheiro não veio de Rosário – foi depositado, em duas parcelas, em sua conta pela Logistics International, que faz parte do grupo Privinvest.
Por instruções de Rosário, toda a correspondência sobre pagamentos foi enviada ao alto funcionário da Privinvest, Jean Boustani – embora Fakih nunca tenha conhecido Boustani e nunca tenha tido nenhum contrato com a Logistics International.
Outra empresa efetivamente gerida por Rosário, e com laços estreitos com a Privinvest, a Txopela Investments pagou mais de 15 milhões de meticais (cerca de 234.000 dólares, ao câmbio atual) ao Walid, e esse dinheiro foi gasto na casa de Rosário em Belo Horizonte. Esta não foi a iniciativa de Walid. Fakih disse: “Eu não entrei em contato com Txopela. Só fiquei sabendo dos pagamentos do Txopela por e-mail”.
O dinheiro não era suficiente. Fakih disse ao tribunal que não ganhou um centavo em suas negociações com Rosário – muito pelo contrário. Ele disse que Rosário ainda deve 300.000 dólares a Walid por seu trabalho nos três projetos de construção.
Ele confirmou a autenticidade de uma série de e-mails trocados com os representantes de Rosário sobre o trabalho nas três obras. No ano passado, quando testemunhou, Rosário alegou que esses e-mails foram forjados.
Questionado pela promotora Sheila Marrengula sobre o que ele fez dessa alegação, Fakih respondeu que “o conteúdo dos documentos pode ser verificado. Não sei porque ele (Rosário) diz que podem ter sido forjados. Acho isso repugnante. Não me ensinaram a falsificar nada e não tenho interesse em falsificar documentos”.
“Se ele é crente, como diz que é (Rosario afirma ser muçulmano), então ele deve restaurar a verdade”, disse Fakih. A certa altura, Rosário também disse que nunca contratou os serviços da Walid Construções. “Como posso entrar na propriedade de outra pessoa e construir lá sem o consentimento dele?”, retrucou Fakih. “Ele deveria limpar a imagem da minha empresa. Suas declarações são falsas’. Fakih negou ter saído de Moçambique por causa das “dívidas ocultas”. Ele foi para a Argélia por “razões pessoais”, disse ele. (P.F., AIM)