Em Abril desde ano, "Carta" escreveu em editorial: "Moza Banco com prejuízos de 45 milhões de USD em três anos: Quem põe o guizo ao gato?". É um texto que regista o descalabro da intervenção do Banco de Moçambique no Moza Banco e permite ao leitor olhar para o "big picture" e perceber a razão da não consolidação das contas da Kuhanha nas suas demonstrações financeiras relativas a 2019. Vale a pena reler:
A “Carta” de 13 de Abril referiu que o Moza Banco apresentou resultados negativos em 2019 = (-) 775 milhões de Meticais. Este resultado negativo deve ser adicionado aos prejuízos anuais, após a intervenção do Banco: -2017 = (-) 1.457 milhões de Meticais; 2018 = (-) 768 milhões de Meticais. Os prejuízos destes três anos somam 3 biliões de Meticais, equivalente a mais de 45 milhões de USD, que constitui perda real do valor do banco.
Aquando da intervenção, perante a perplexidade da comunidade empresarial, o governador do BM disse ter escolhido a melhor opção de gestão que havia no mercado para 'fixar' o banco. A recapitalização do Moza foi feita com 11.7 biliões de Meticais, cedidos pelo Banco Central ao Fundo de Pensões dos Trabalhadores do BM (Kuhanha), que adquiriu a maioria do capital do Moza. O relatório e contas do BM de 2017 mostra o registo deste empréstimo, realizado em violação da Lei Orgânica do BM. Quando as contas anuais do Banco de Moçambique de 2018 e 2019 forem disponibilizados ao público, como é seu dever, conhecer-se-ão os efeitos da consolidação destes prejuízos nas contas da Kuhanha e nas contas do Banco Central.
Faz agora sentido, o discurso do Presidente da República por ocasião da inauguração das novas instalações do Moza na baixa da Cidade de Maputo no dia 13 de Junho de 2019. Conforme então reportou o jornal Savana, a propósito da intervenção do Moza, o Presidente Nyusi declarou: “poderá haver debates sobre qual a melhor solução seguida...o importante é que os seus efeitos não lesem a ninguém, incluindo os accionistas fundadores”. Quando o Chefe do Estado pronuncia com este detalhe, quer indicar como o processo deve prosseguir. Passados 9 meses após a fala do Presidente, nada parece ter mudado, com excepção da perda de valor dos activos, que é uma realidade.
Há muita coisa ainda por esclarecer. Ora, o Banco de Moçambique é o Banco Central da República de Moçambique, com o capital integralmente subscrito pelo Estado e os cidadãos necessitam de ser esclarecidos sobre se estes prejuízos do Moza Banco corroem ou não os fundos do erário público, à guarda do Banco Central. Para isso, é essencial dispor publicamente a seguinte informação:
1-Informação do Conselho de Administração do BM, responsável por elaborar o relatório e as contas de gerência, que deve divulgar as contas auditadas consolidadas de 2018 (já passa mais de um ano sem serem divulgadas) e os prejuízos do Moza.
2- O Ministério da Economia e Finanças (MEF) na qualidade de gestor do Tesouro tem uma palavra a dizer sobre as contas anuais de 2017 a 2019 do BM, que, nos termos do art. 64° da sua Lei Orgânica, o Banco Central é obrigado a enviar até finais de Março do ano seguinte. O MEF certamente dispõe de informação que lhe é prestada pelo Conselho de Auditoria do Banco de Moçambique que exerce a fiscalização e a inspecção das actividades do BM, cujo PCA é indicado pelo Ministro das Finanças.
Na sequência das palavras do Presidente da República acima mencionadas, o Governo deve prestar esclarecimentos acerca da justeza e das consequências da intervenção do Moza. Em particular, como foi possível o BM ignorar a proposta feita pelos accionistas antes da intervenção do Moza, de aumento de capital privado e enveredar-se por um caminho desconhecido em que, através dos prejuízos do Moza, se continua a delapidar os escassos recursos públicos do BM.
As contrapartes do FMI em Moçambique são o Ministério das Finanças e o Banco de Moçambique. Em 2016, o FMI penalizou a economia e a sociedade moçambicanas por falta de reporting por parte do Governo relativamente aos três créditos tóxicos, ilegalmente contratados. Mas tolera a falta de reporting público das contas anuais do Banco de Moçambique, que são instrumentos bastantes para a gestão económica e financeira do país.
Também é notório que, há mais de três anos, assiste serenamente que um banco comercial continue objectivamente a ser dirigido pelo Banco Central, cujo Governador é também o PCA da sociedade anónima Kuhanha, sociedade que adquiriu a posição maioritária do Moza Banco, com recursos disponibilizados pelo Banco Central.
Estranha-se o silêncio do FMI perante os conflitos de interesse denunciados Comissão Central de Ética Pública em flagrante violação da Lei da Probidade Pública, e violação da Lei Orgânica do Banco Central, ao conceder empréstimo de 11.7 biliões de Meticais à Kuhanha. Esta situação que está a corroer os recursos públicos à guarda do Banco de Moçambique, por efeito da consolidação de contas. Afinal, quem põe o guizo ao gato? (Carta)