Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI
sexta-feira, 20 setembro 2019 05:00

Fundo soberano não deve ser criado assente nas receitas do Gás – Castel Branco

 

As discussões à volta da criação do futuro Fundo Soberano continuam. O assunto, cujas discussões foram oficialmente lançadas pelo Banco de Moçambique (BM), em Março último, parece estar longe de ser, de resto, consensual na sociedade. Esta quinta-feira, foi a vez do economista e professor universitário Carlos Nuno Castel-Branco abordar o assunto.

 

Sobre o tema, Carlos Nuno Castel-Branco tem uma visão já cristalizada. Apesar de reconhecer a importância e pertinência do “banco de reservas” defende que o mesmo não deve ser criado sustentado apenas nas receitas que advirão da exploração dos recursos petrolíferos, tal é o caso do Gás Natural Liquefeito (LNG) da Bacia do Rovuma.

 

O posicionamento de Castel-Branco vem dias depois de o Presidente da República, Filipe Nyusi, nos comícios orientados na província de Nampula e Cabo Delgado, isto no quadro da campanha eleitoral ora em curso, ter afirmado que se socorrerão das receitas decorrentes da exploração dos recursos a serem extraídos em Cabo Delgado para criação do futuro Fundo Soberano.

 

Um Fundo Soberano inteiramente suportado pelos recursos minerais e quando a economia no seu todo não tem outras fontes de desenvolvimento, explicou o Professor Doutor, torna-se instável, muito por força da instabilidade de preços no mercado internacional. Para ter estabilidade, disse Castel-Branco, o Fundo deve ser, invariavelmente, alimentado por receitas provenientes de uma base económica mais diversificada.  

 

“O Fundo Soberano pode ter uma função dinâmica, nos períodos do «Bum», quando os preços sobem muito, aumentar a extracção de receitas para reserva e nos períodos do «bust», quando os preços caiem, usar-se as reservas, em vez de estar a aumentá-las significativamente. O Fundo Soberano pode ter uma função de estabilização, mas isso coloca um problema. Um Fundo Soberano suportado pelos recursos minerais, recursos primários desta natureza, quando a economia no seu todo não gera outras fontes de desenvolvimento também é muito instável e o Fundo pode estar continuamente sobre pressão da sociedade para aquilo que foi ganho ser usado no período seguinte para compensar a perda que a economia tem”, disse Carlos Nuno Castel-Branco.

 

“Mesmo que, a curto prazo, o Fundo Soberano consiga proporcionar alguma estabilização, de facto, não é uma alternativa para uma economia dependente de produtos primários por que essa dependência cria instabilidade e essa instabilidade vai reflectir-se no Fundo Soberano, por um lado, e nas pressões sociais para a utilização desse Fundo Soberano, por outro. Portanto, é um problema que tem de ser equacionado. Isso significa que o Fundo Soberano não é a solução, mas sim parte da solução numa economia que diversifica, que se articula melhor e que se torna mais focada na resolução dos seus próprios processos de acumulação”, acrescentou.

 

Num outro desenvolvimento, Castel-Branco anotou que, por mais que criemos o Fundo Soberano, não haverá, tal como disse, qualquer recurso para nele ser reservado devido à crise económica que se abateu sobre o país e pelos compromissos assumidos com os detentores dos títulos da dívida, resultante dos empréstimos contratados a favor da EMATUM, PROINDICUS e MAM. Nas suas previsões, disse o economista, é quase certo que na próxima década nem um vintém poderá ser reservado no Fundo Soberano.

 

Ainda na sua alocução, Castel-Branco, depois de uma vez mais reafirmar que a ideia da criação do fundo é meritória, advertiu que o Fundo Soberano não é alternativa à estabilização e reserva de uma economia que é muito dependente da exportação de recursos primários, tal é o caso do nosso país. 

 

“A outra questão é que nós não temos receitas para o Fundo Soberano. Como vocês sabem, estamos em crise, temos uma grande crise da dívida, os rendimentos dos projectos ainda não começaram e quando começarem a fluir e nos seus primeiros largos anos vão estar focados em pagar os investidores, em pagar a dívida já contraída, antes de começar a resultar em receita líquida para o Estado. Portanto, podemos formar um Fundo Soberano hoje, podemos formar um Fundo Soberano com legislação etc. A questão é onde está o dinheiro para pôr lá dentro? E isso, eu tenho a certeza que não vamos conseguir na próxima década. Ter recursos para isso", disse Castel-Branco. (I.B)

Sir Motors

Ler 3315 vezes