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segunda-feira, 06 maio 2019 08:27

Caso passaporte falso de Nini Satar: Detalhes de um julgamento “banhado” de contradições dos declarantes

Um mar de contradições marcou a sessão de audição aos declarantes, constituídos no âmbito do Processo Querela nº 963/19/A, relativo ao caso de falsificação do passaporte que permitiu Momade Assif Abdul Satar, mais conhecido por Nini Satar, fugir do país, em 2015.

 

 

Na última sexta-feira (03 de Maio), no prosseguimento do julgamento do caso, a 4ª Secção Criminal do Tribunal Judicial do Distrito Municipal Kampfumo (TJDMK), da cidade de Maputo, ouviu quatro declarantes, sendo dois funcionários do Serviço Nacional de Migração (Ermelinda Lucas e Gabriel Zacarias) e outros da SEMLEX (Aldo Constantino Da Costa e José Ngoenha), empresa que era responsável pela produção dos documentos de identidade e de viagem.

 

Na audição, que durou quase 10hrs (iniciou às 11hrs e terminou às 21hrs), os declarantes fizeram um autêntico “espectáculo” de “disse e não disse”. Aldo Constantino, Engenheiro Electrotécnico, visto pelo Tribunal como uma das peças-chave do processo por ser quem, na altura dos factos, conhecia todos os mecanismos de funcionamento da SEMLEX, foi confrontado por todas as partes com questões e provas, que lhe levaram a avançar e recuar nas suas declarações.

 

No princípio, Aldo Constantino afirmou que a ré Sidália dos Santos, funcionária do SENAMI, acusada de ter emitido o passaporte falso, “sabia fazer todos os processos para emissão de passaportes, excepto a limpeza da foto”, vista como uma fase crucial para emissão daquele documento. Mais adiante, disse que todos na fábrica partilhavam palavras-chaves e que era um processo normal, autorizado pela administração da SEMLEX. Garantiu ainda ser “impossível” emitir um passaporte sozinho.

 

Entretanto, perante a insistência de todas as partes envolvidas no processo, Aldo Constantino recuou nas suas declarações, dizendo que podia produzir aquele documento sozinho, em 15 ou 20 minutos.

 

O declarante afirmou ainda que, na altura dos factos, existiam limitações de actividades entre os funcionários do SENAMI afectos à fábrica de produção de passaportes, por um lado, e, por outro, sempre que surgia uma dificuldade, ele era solicitado para resolver o problema. Aliás, Aldo Constantino é quem formava todos os funcionários do SENAMI e gerava senhas dos funcionários daquela instituição, mas, de 2010 a 2017, usou a mesma senha (99999911).

 

No entanto, a fonte recuou no tempo para contar que, no dia 23 de Dezembro de 2014, recebeu um expediente de um taxista de nome Maurício, com quem sempre prestava diversos serviços. Afirmou ainda que, no dia anterior, efectuou uma chamada telefónica para uma funcionária do SENAMI, de nome Inocência, a perguntar sobre “o seu processo”, curiosamente, o dia em que se emitiu o passaporte 13AFE26 do réu Nini Satar.

 

Outras contradições

 

O mar de contradições continuou também com os outros três declarantes. Ermelinda Lucas, funcionária reformada do SENAMI, que esteve em serviço no dia 23.12.2014, disse ter recebido um lote de documentos estimados em 200 pedidos de passaportes, que terá digitalizado e enviado para o seu superior hierárquico.

 

Questionada se não terá visto o recibo de pedido do passaporte em causa, respondeu que “não se lembrava”, porém, sublinhou que só recebia documentos com a presença do requerente e que nunca viu Sahim Aslam e muito menos Nini Satar.

 

Por seu turno, José Ngoenha, da SEMLEX, citado várias vezes no depoimento de Aldo Constantino como quem tinha capacidade e direitos de intervir em todas as fases, decidiu fechar-se em copas, chegando mesmo a “enfurecer” os advogados dos réus.

 

Ngoenha disse que era formador e, por sinal, um dos primeiros técnicos formados pela SEMLEX, mas não se lembrava dos conteúdos da formação, mesmo depois de enumerá-los. A fonte contou ainda que em nenhum momento atribui senhas para trabalho, mas sim para o treinamento e que não tinha capacidade de intervir noutras fases.

 

Porém, mais tarde, disse que podia fazer todo o processo, excepto a codificação dos passaportes, facto que colocou a sala em “risos e piadas”. “Um engenheiro ou formador que não sabe o que ensina, então como ficam os seus formandos!”, admiraram os advogados.

 

Tímido e trémulo, Ngoenha foi dizendo e “desdizendo”, levando alguns advogados a levantarem a possibilidade de um processo autónomo, por não cooperar com o Tribunal. Ngoenha rejeitava tudo e menos nada, até das formações que deu.

 

O último declarante do processo querela com o número 963/19/A foi Gabriel Zacarias, que, à data dos factos, era Inspector no SENAMI afecto à fábrica. O código de Zacarias aparece no passaporte de Nini Satar, mas disse que não se lembrava e que nunca tinha visto os réus, a não ser pelos órgãos de comunicação social.

 

O declarante, formado em enfermagem, contou que também partilhava com frequência o seu código com funcionários efectivos e estagiários do SENAMI, mas que todas as fotos dos passaportes eram organizadas por ele e, em caso de dificuldades, chamava sempre o técnico da SEMLEX Aldo Constantino da Costa.

 

Depois de 10hrs de “disse não disse”, o juiz Eusébio Lucas, em consenso com todas as partes envolvidas no processo, marcaram a sessão das alegações finais para o próximo dia 14 de Maio do presente ano, nas instalações da B.O. (Omardine Omar)

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