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quarta-feira, 31 janeiro 2024 11:01

Mobilidade urbana em Maputo: regras do concurso são as do Banco Mundial – Maria de Fátima Arthur, do Projecto Move

Há pouco menos de duas semanas, a Federação Moçambicana de Empreiteiros (FME), através do seu Presidente Bento Machalia, deu uma conferência de imprensa para denunciar que o concurso público do Projecto Move-Mobilidade Urbana da Área Metropolitana de Maputo, cuja empreitada é financiada pelo Banco Mundial na ordem dos 250 milhões de USD, estava ferido de “vícios insanáveis”. 

 

No âmbito do Projecto Move, o Ministério dos Transportes e Comunicações (MTC) lançou, o ano passado, cinco concursos de contratação de empreitadas, sendo que duas empreitadas são no Município de Maputo, nomeadamente a reabilitação da Av. 24 de Julho e Av. Das Nações Unidas (ONU), e três empreitadas no Município da Matola, para pavimentação das estradas Intaka – Boquisso, Kongolote – Molumbela e Matlemele – Matibjwana. As obras de Maputo foram ganhas pela JJR Construções & Filhos Moçambique SA. e as obras da Matola foram ganhas pela chinesa China Jiangxi International Economic and Technical Cooperation Co. (CJIC), a quem a FME acusou de má conduta no mesmo processo.

 

Na colectiva com os jornalistas, Machaila não foi detalhado. Posteriormente, por solicitação do nosso jornal, ele forneceu-nos as suas “evidências” para os alegados vícios insanáveis do concurso.  

 

O primeiro vício, disse ele, tinha a ver com as regras aplicáveis. No entender de Bento Machaila, “o anúncio do concurso do jornal publicado pelo MTC e os documentos de concurso referem que as regras de contratação são as estabelecidas no Decreto 5/2016, que, entretanto, foi revogado e substituído pelo Decreto 79/2022, de 30 de Dezembro, que já havia entrado em vigor durante o processo, mesmo antes da submissão das propostas”. Sendo assim, alegar que o concurso foi dirimido com base em regras do Banco Mundial, disse ele, era uma violação grave.

 

Em segundo lugar, asseverou Machaila, “o empreiteiro chinês (CJIC) omitiu, no preenchimento do Mapa de Quantidades, um preço que representa 30% do orçamento da obra e, com a conivência de elementos no Ministério dos Transportes e Comunicações (MTC), foi-lhe adjudicada a obra para, posteriormente, negociar uma adenda que acabaria por encarecer a obra e superando o segundo concorrente”. O FME entende que essa alegada omissão do preço de um item relevante tinha contornos de corrupção.

 

Eventualmente, por causa do mesmo entendimento (o de que a legislação aplicável é a nacional, e não do Banco Mundial; a CJIC omitiu a cotação de um item relevante). A JJR contestou a integridade do concurso, tendo apresentado uma denúncia ao GCCC que, por sua vez, enviou um ofício ao MTC no dia 8 de Setembro de 2023 solicitando toda a documentação do concurso, incluindo as reclamações. Essa informação foi prestada pontualmente ao GCCC pela Unidade Técnica de Implementação do Projecto Move, dirigida pela Dra. Engenheira Maria de Fátima S. R. Arthur.

 

E como é que ela responde às alegações sobre os alegados vícios insanáveis? 

 

Ela explicou que, para todos os efeitos, as regras aplicáveis a este concurso são as do Banco Mundial.  E o facto de o Projecto ter publicado, em Março de 2023, no jornal Notícias, um anúncio de concurso onde se frisa que o mesmo será regido pelo Decreto 5/2016, de 8 de Março, não invalida a precedência das normas do banco, as quais clarificam os procedimentos da licitação.

 

“O anúncio do jornal foi apenas para efeitos de convite público. O Banco Mundial tem dois tipos de concurso: ‘pre-review’ e ‘pos-review’. No caso vertente, trata-se das regras ‘pos-review’. Mesmo assim, apesar da referência à legislação local, as regras do banco têm precedência sobre tudo o resto. Os documentos do concurso foram feitos com base nas regras do Banco Mundial. Lá estão plasmadas todas as instruções aos concorrentes e sempre com base nessas regras”, explicou ela.

 

Em suma, repisa a fonte, trata-se de um donativo do Banco Mundial, em caso de dúvida ou de conflito com os regulamentos nacionais, aplicam-se as Regras de Procurement publicadas em Novembro de 2020 e revistas, recentemente, em Setembro de 2023. “Igualmente, aplica-se o Guião para Prevenir e Combater Fraude e Corrupção nos projectos financiados pelo IBRD e IDA, assim como para Donativos, datado de 15 de Outubro de 2006 e revisto em Janeiro de 2011 e em Julho de 2016. Estas regras de Procurement estão reflectidas na Secção I - Instruções aos Concorrentes, etc.”.

 

Quanto ao facto de a empreiteira chinesa ter omitido a cotação de um item relevante no mapa de quantidades, Fátima Arthur disse que isso não era relevante.

 

“Após uma verificação minuciosa com o empreiteiro, reparamos que esse item havia sido cotado dentro de um outro. Houve um erro, que depois foi corrigido, e, ao fim e ao cabo, a proposta financeira em causa não aumentou com a correcção da tabela”, garante Fátima Arthur, mostrando estar de cabeça tranquila perante as alegações que são atiradas à unidade de implementação. "Na verdade, no curso da negociação com a empresa adjudicada, foi possível baixar os valores iniciais para cada uma das três obras da Matola, por entre 1 a 2 milhões de dólares, sobre o qual temos evidência", asseverou ela.

 

Ou seja, remata o Projecto Move, “a empresa China Jiangxi cumpriu com os requisitos do concurso e da legislação vigente e apresentou uma boa proposta técnica, assim como um menor preço nos três concursos da Matola, pelo que foi seleccionada empresa vencedora na avaliação, e depois de rebatidas as reclamações dentro do prazo, na adjudicação. A empresa que reclamou no GCCC (a JJR Construções) não teve o melhor preço nos concursos da Matola e, por isso, não venceu. Contudo, teve o melhor preço nos concursos de Maputo e foram-lhe adjudicadas as obras de Maputo". 

 

Calendário atrasado

 

Este imbróglio, que suscitou a denúncia da JJR ao GCCC e um recurso de contencioso junto do Tribunal Administrativo da Cidade de Maputo (reclamando a legalidade das adjudicações ao empreiteiro chinês), está a atrasar o Projecto Move, estruturante para Área Metropolitana do Grande Maputo. De acordo com o seu calendário, por esta altura, a empresa chinesa deveria estar a iniciar a mobilização.

 

Numa explanação exaustiva sobre os problemas apontados a este processo de licitação, elaborado pelo Projecto Move (datada de fim de Dezembro) e a que “Carta” teve acesso, lê-se: “os processos de reclamação, rebatidos sucessivamente pelo Projecto e pelo Ministério de Transportes e Comunicações, atrasaram a negociação dos contratos da obra da ONU e das três obras da Cidade da Matola, que deveriam ser pavimentadas de raiz até Novembro. Até ao momento, nenhuma obra foi iniciada. Porquê? Por causa dos expedientes legais em curso”.

 

De acordo com a nota do Projecto Move, no fim de Dezembro de 2023, o MTC recebeu um ofício do Tribunal Administrativo da cidade de Maputo notificando sobre um recurso contencioso interposto pela Construções JJR & Filhos Moçambique SA contra o Ministério dos Transportes e Comunicações. No mesmo período, o MTC recebeu uma nota do Gabinete Central de Combate à Corrupção solicitando a invalidação dos concursos do município da Matola, sob alegação de violação dos princípios atinentes aos procedimentos de contratação.

 

Na sequência do recebimento destes dois ofícios, o Ministério dos Transportes e Comunicações suspendeu a assinatura dos contratos com o concorrente seleccionado (a carta de aceitação dos preços revistos já foi encaminhada, em Dezembro, ao empreiteiro) até ao esclarecimento final do processo junto das entidades judiciais atrás referenciadas. Hoje é a data limite que o MTC tem para clarificar as questões colocadas pelo TA da Cidade de Maputo. “Carta” sabe que o MTC não vai invalidar os concursos, sabendo que os mesmos obedeceram aos critérios de isenção e transparência e, sendo assim, caberá a quem tem julgamento distinto exercer o ónus da prova. (Carta) 

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