Está em debate desde ontem na Assembleia da República, em modo monólogo, a Conta Geral do Estado de 2022, que aponta para a mobilização, pelo Governo, de um total de 491.795,7 milhões de Meticais, dos quais 66,3% são fruto das receitas do Estado, 11,1% provenientes de donativos, 7,9% de empréstimos externos e 14,7% de empréstimos internos.
Em mais uma sessão em que se assistiu ao monólogo parlamentar (pela terceira vez desde o arranque da presente Sessão Ordinária), protagonizado por deputados da Frelimo, em virtude da ausência da bancada parlamentar da Renamo, os deputados do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) foram os únicos a discutir o conteúdo do documento elaborado pelo Ministério da Economia e Finanças e publicado em Maio último. A Frelimo limitou-se em saudações ao “brioso” trabalho realizado pelo Governo em 2022.
Para o MDM, na voz do seu porta-voz, Fernando Bismarque, a Conta Geral do Estado de 2022 é uma declaração de incompetência do Governo, “que se tem destacado ano após ano como campeão em violação dos princípios vertidos na Lei do SISTAFE [Sistema de Administração Financeira do Estado]”, tal como narram, anualmente, os Relatórios e Pareceres do Tribunal Administrativo.
Uma das violações detectadas pelo MDM, segundo Bismarque, é o facto de grande parte das informações apresentadas nas tabelas e gráficos terem sido copiadas de contas anteriores, “o que suscita dúvidas sobre a veracidade das informações apresentadas na Conta Geral do Estado de 2022”.
“A Conta Geral do Estado devia ser um documento relevante e credível, pois, permitir-nos-ia fiscalizar a execução orçamental, uma vez que nela devíamos encontrar informação financeira do Estado consolidada para avaliarmos o desempenho financeiro dos órgãos do Estado”, defende, alegando que seria exagerado esperar-se uma Conta Geral do Estado credível vinda do Governo da Frelimo.
Bismarque citou ainda o Relatório e Parecer da Conta Geral do Estado de 2022, elaborados pelo Tribunal Administrativo, que apuraram uma diferença de 700 milhões de Meticais nos dividendos distribuídos ao Estado pelas empresas MOZAL, Millennium BIM e CFM (Caminhos-de-Ferro de Moçambique). O montante resulta da diferença das informações fornecidas pelo Governo e pelo IGEPE (Instituto de Gestão das Participações do Estado).
“Estas discrepâncias fazem parte de um expediente para sacar dinheiro público, que tem sido usado para manipular a opinião pública, comprar consciências e patrocinar os esquadrões de morte”, defende o MDM, mostrando ainda preocupação pelo facto de algumas empresas participadas pelo Estado não efectuarem o desembolso dos empréstimos por acordos de retrocessão, acabando por repassar as suas dívidas ao Estado.
“O sector empresarial do estado há muito que deixou de ser uma mais-valia como mecanismo de arrecadação de receitas do Estado, através de dividendos. Tem sido um verdadeiro antro de corrupção em prejuízo dos moçambicanos”, sublinha a terceira maior força política do país.
Conta reflecte implementação do Orçamento do Estado – Frelimo
Enquanto o MDM não encontra motivos para aprovar a Conta Geral do Estado de 2022, a Frelimo defende que a mesma reflecte a implementação do Orçamento do Estado daquele ano.
Segundo Feliz Silva, porta-voz da bancada parlamentar da Frelimo, a Conta Geral do Estado de 2022 é um instrumento-chave do terceiro ano da implementação do Programa Quinquenal do Governo, “cujo cerne é a transição para uma economia mais diversificada e competitiva”.
Para Feliz Silva, o documento em debate oferece “um panorama detalhado da utilização dos recursos públicos” e “evidencia, tanto os êxitos alcançados, quanto os desafios encontrados” no decorrer do exercício económico de 2022.
Num momento em que economistas e empresários criticam o elevado endividamento público interno, por sufocar o sector privado, em particular as Pequenas e Médias Empresas, Feliz Silva defende que tal facto “é uma medida compreensível, dadas as circunstâncias complexas económicas que o país enfrenta”, destacando as limitações que o Governo encontra no acesso ao financiamento externo, assim como as consequências causadas pelos ataques terroristas e os desastres naturais.
Refira-se que, em 2022, a dívida pública passou de 890.752 milhões de Meticais para 924 mil milhões de Meticais, sendo que, a nível interno, evoluiu de 227.454,4 milhões de Meticais para 281.450,08 milhões de Meticais.
Governo volta a prometer melhorar os mecanismos de controlo
Quem também entende que a Conta Geral do 2022 apresenta a verdadeira posição financeira do Estado é o Primeiro-Ministro, Adriano Maleiane, que defende que a mesma apresenta ainda o desempenho financeiro programático, o fluxo de caixa do exercício anual e a avaliação do desempenho dos órgãos e instituições do Estado e de entidades descentralizadas.
Perante as críticas levantadas pelo Tribunal Administrativo e pelo MDM, o Governo voltou a prometer estar a trabalhar para corrigir as irregularidades detectadas e assegurar a aplicação rigorosa das normas e procedimentos da Administração Financeira do Estado, tendo em conta as recomendações do órgão responsável pela fiscalização das contas públicas.
“No que concerne à questão da dívida pública, reafirmamos que continuaremos a agir no sentido de desenvolver acções com vista a trazê-la para parâmetros sustentáveis, de modo a permitir que o nosso país possa ter acesso a financiamentos em termos e condições mais favoráveis”, reprometeu Adriano Maleiane, garantindo também que o Governo continuará a realizar auditorias à indústria extractiva, a fim de confirmar as despesas recuperáveis efectuadas pelas empresas deste sector.
“Acreditamos que a realização sistemática deste exercício irá melhorar a cobrança de receitas para o Orçamento do Estado, através de maior controlo nas despesas de investimento efectivamente realizadas nas diferentes fases dos projectos da indústria extractiva”, defende.
Refira-se que, contrariamente ao que era apanágio, o Tribunal Administrativo ainda não divulgou o seu Relatório e nem o Parecer da Conta Geral do Estado de 2022, embora tenham sido aprovados pelo Plenário daquele órgão em finais de Setembro passado. Igualmente, a Assembleia da República não distribuiu o documento aos jornalistas. Entretanto, a Conta Geral do Estado de 2022 será aprovada hoje, com votos da Frelimo. (A. Maolela)