Moçambique tornou-se, nos últimos anos, o destino menos preferencial dos refugiados, com destaque para os provenientes dos países da região dos Grandes Lagos (Ruanda, Burundi, Sudão e República Democrática do Congo) e do Corno de África (Eritreia, Etiópia e Somália), que nos princípios do ano 2000 escalaram o país, fugindo de guerras civis e da fome nos seus respectivos países.
Dados apresentados ontem pelo Director do Instituto Nacional de Apoio aos Refugiados (INAR), Cremildo Abreu, revelam haver redução de novas chegadas e aumento de saídas de refugiados no país, com destaque para o Centro de Refugiados de Maratane, na província de Nampula, que viu o seu efectivo reduzir em 51 por cento nos últimos seis anos.
Falando em Maputo, numa conferência de imprensa conjunta com o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, no âmbito da comemoração, hoje, 20 de Junho, do Dia Mundial do Refugiado, Abreu defendeu que as saídas que têm sido testemunhadas nos últimos anos enquadram-se na implementação de soluções duradouras por parte do Governo e parceiros, nomeadamente, o repatriamento voluntário dos refugiados; o reassentamento em terceiros países; e a sua integração nas comunidades.
Segundo o Director do INAR, o repatriamento voluntário deriva da melhoria das condições de segurança nos países de origem, enquanto o reassentamento em outros países é realizado a pedido dos refugiados e conta com ajuda do ACNUR. Revela, aliás, que nos últimos três anos, o Centro de Refugiados de Maratane não recebeu qualquer pedido de exílio e que, neste ano, ainda não acolheu sequer um refugiado.
Perseguições e barreiras na obtenção do Estatuto de Refugiado no centro da discórdia
Entretanto, os argumentos do Director do INAR são rebatidos pelos refugiados, que apontam, por um lado, as más condições de acolhimento do Centro de Refugiados de Maratane e, por outro, a degradação das condições de segurança a nível interno, como um dos principais motivos da sua saída em massa.
Albert Bikorimana, refugiado ruandês que marcou presença no encontro, contou à “Carta” que muitos compatriotas seus fugiram de Moçambique após receberem ameaças de morte por parte de elementos ligados à Embaixada Ruandesa em Maputo, dando exemplo do rapto de Ntamuhanga Cassien, em Maio de 2021, e do assassinato de Revocant Karemangingo, em Setembro do mesmo ano.
A fonte disse ainda que alguns ruandeses regressaram ao seu país, não por vontade própria, mas devido a pressões que recebiam diariamente de alguns funcionários da representação diplomática ruandesa em Moçambique.
De Maratane chegam relatos de fome, de deficientes condições de saneamento, dificuldades de assistência médica e medicamentosa e falta de oportunidades de emprego. Aliás, Albert Bikorimana revela que seus filhos têm sido excluídos dos concursos de ingresso no Aparelho de Estado, embora tenham nacionalidade moçambicana.
Já Luala Msekani, refugiado da República Democrática do Congo, apresenta outros factores que podem concorrer para a fuga de refugiados no país, como é o caso das barreiras que encontram na atribuição do Estatuto de Refugiado, assim como na aquisição da nacionalidade moçambicana, por parte dos refugiados que se encontram no país há mais de 10 anos.
No caso da aquisição da nacionalidade moçambicana, por exemplo, Msekani diz haver muitos refugiados que requereram a atribuição desta, mas que nunca tiveram sucesso. Alguns dos processos deram entrada ao INAR, quando a instituição era tutelada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação e outros foram submetidos depois de esta ter passado para a tutela do Ministério do Interior, em 2019. Mas todos se encontram arquivados.
“Comemoramos esta data [20 de Junho] com a esperança de ver alguns dos problemas que nos apoquentam a ser resolvidos, brevemente. Referimo-nos, primeiro, à falta do estatuto de refugiados, que vai regular as nossas vidas; e aquisição de nacionalidade moçambicana para quem vive há mais de 10 anos em Moçambique”, disse Msekani, em representação dos cerca de 28 mil refugiados que vivem em Moçambique.
Governo promete responder a cada pedido
Em resposta, o Director do INAR garantiu que o Estatuto do Refugiado é um direito que assiste àquele grupo social e assegura que o Governo tem respondido aos pedidos submetidos, seja de forma satisfatória ou não. No entanto, reconhece a lentidão que tem caracterizado estes processos.
Quanto aos pedidos de nacionalidade “arquivados”, Cremildo Abreu disse apenas que todos os processos decorrem mediante determinados procedimentos, razão pela qual a resposta pode não chegar com flexibilidade desejada.
“O Governo apoia os refugiados no acesso à educação, saúde e permite que estes entrem no território nacional e ficamos satisfeitos por ver que a vida está a decorrer de forma segura. Porém, em certos momentos, aquela resposta pode não chegar com aquela flexibilidade. Todos os processos decorrem mediante determinados procedimentos”, defendeu.
Referir que, apesar do país ser pouco apetecível para os refugiados, continua caminho predileto dos imigrantes ilegais que tentam, todos os dias, chegar à vizinha África do Sul, beneficiando-se do sistema corrupto instalado nos serviços de migração e na Polícia. (A. Maolela)