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quarta-feira, 16 novembro 2022 07:18

Falta de informação limitou oportunidades de negócios com Vale – denuncia CEP de Tete*

A falta de capacidade (técnica e financeira) tem sido apontada, geralmente, como a principal dificuldade enfrentada pelas empresas moçambicanas para ombrear com as estrangeiras no fornecimento de bens e serviços às multinacionais que implementam mega-projectos no país.

 

No entanto, esta visão é refutada pelos empresários da província de Tete que, nos últimos 15 anos, tiveram a oportunidade de conviver com a Vale, empresa de capitais brasileiros que se dedicava à exploração de carvão mineral no distrito de Moatize.

 

Segundo Hermínio Nhantumbo, Presidente do Conselho Empresarial Provincial (CEP) de Tete, a falta de informação é que mina o conteúdo local no país. Falando à nossa reportagem, no âmbito da avaliação do impacto sócio-económico da presença da Vale na província de Tete, em particular no distrito de Moatize, o Presidente do CEP de Tete afirmou que os empresários locais foram surpreendidos com a chegada daquela mineradora brasileira, devido à falta de informação, facto que contribuiu para o fraco volume de negócios feito por estes com aquela multinacional.

 

“A entrada da Vale surpreendeu todo aquele que é empresário na província, pois, não tivemos informação. A informação é a alma do negócio. Se souberes o que vai acontecer dentro de seis meses, acredito que se pode preparar para prover serviços a esse empreendimento”, defende, revelando que a informação foi centralizada na cidade de Maputo.

 

“A informação era centralizada na capital do país [Cidade de Maputo], no lugar de se informar aos empresários locais, onde ocorrem os projectos”, afirmou, apontando a actual situação dos sectores hoteleiro e imobiliário – que se encontram em crise – como o resultado da falta de informação.

 

“Hoje, qualquer empresário faz um estudo de viabilidade. Ou seja, desenha um projecto para implementar a curto, médio e longo prazo. Se tivesse havido partilha de informação, refiro-me à cronologia das actividades a serem realizadas pelo mega-projecto, os empresários ter-se-iam preparado para aguentar cada uma das fases da implementação do projecto”, explica.

 

Para Nhantumbo, capacidade cria-se, mas para tal é necessário preparar-se e incluir-se os “beneficiários”. “Sempre defendi que haja transparência nas possibilidades de negócio que vão entrando no território nacional, sobretudo nas províncias. (…) É muito importante que haja divulgação das janelas de oportunidade para que o empresário local tenha informação para poder prover dessa capacidade”, defende o empresário, referindo ser inconcebível que até serviços de jardinagem são provenientes da capital do país.

 

Mesma opinião foi manifestada por Sérgio Timóteo, Presidente do Pelouro do Agro-negócios no CEP de Tete. Timóteo defende haver muito secretismo na divulgação das oportunidades de negócio a nível das províncias e, como resultado, as multinacionais recorrem às empresas da capital do país, assim como do estrangeiro para a contratação de bens e serviços.

 

“A informação é sempre difundida para um punhado de gente, resultando em nepotismo. As pessoas que lideram estes projectos e que detêm informação privilegiada correm para abrir suas empresas e depois adjudicam a si mesmo esses negócios”, defende a fonte.

 

Entretanto, o Presidente do CEP de Tete sublinha ter havido alguns empresários que tiveram oportunidade de prestar serviços à Vale, sobretudo no sector de transportes e na imobiliária. “Mas, como moçambicanos, empresários de Tete, não podemos ficar com negócios residuais, nós temos de ficar com o negócio milionário, não podemos ser discriminados, por causa da suposta incapacidade”, atira.

 

Refira-se que, no ano passado, a Vale anunciou ter investido, em 2020, mais de 290 milhões de Meticais na aquisição de produtos e serviços a empresas nacionais.

 

O impacto da presença da Vale é negativo

 

Segundo Hermínio Nhantumbo, não é apenas nos negócios em que não sentiu a presença da Vale na província de Tete, mas também a nível social.

 

“Era suposto que, com este mega-projecto, houvesse diferenças no âmbito económico e social, sobretudo no melhoramento das vias de acesso e infra-estruturas. Mas nada mudou. Moatize de há 10 anos, é o mesmo de 2022”, afirma Nhantumbo, para quem a província de Tete devia ser declarada a capital económica do país.

 

“Tete é a província com maior número de mega-projectos no momento [de exploração de carvão mineral e geração de energia eléctrica], pelo que, não há dúvidas de que devia ser declarada a capital económica do país”, defende.

 

Mesma opinião tem outro empresário daquela província, que preferiu o anonimato. Defende que Moatize devia já ter ultrapassado os problemas que enfrenta no fornecimento de água, assim como no ordenamento territorial.

 

Aliás, o empresário entende que a exploração de carvão mineral devia ter gerado riqueza e aberto espaço para construção de uma nova cidade em Moatize, tal como aconteceu com a cidade sul-africana de Polokwane, erguida com base no dinheiro do carvão mineral.

 

Entretanto, Sérgio Timóteo entende que a Vale veio dinamizar a província de Tete, tanto do ponto de vista social, assim como económico. Aponta a contratação da mão-de-obra local como um dos grandes passos dados pela Vale, apesar de ter levado algum tempo para tomar tal decisão.

 

Devido a essa abertura da Vale em absorver a mão-de-obra moçambicana, afirma Timóteo, a empresa não foi obrigada a paralisar as actividades em 2020, quando a pandemia da Covid-19 obrigou a multinacional a repatriar a sua mão-de-obra estrangeira.

 

Sublinhar que a multinacional sul-americana vendeu os seus activos na exploração de carvão mineral em Abril último, alegando estar a apostar numa “mineração de baixo carbono”, num negócio que lhe rendeu 270 milhões de USD. (Abílio Maolela, em Tete)

 

*Esta reportagem foi produzida no âmbito da parceria entre o Centro de Integridade Pública e a Carta de Moçambique, no âmbito do jornalismo investigativo sobre a indústria extractiva

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