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quinta-feira, 28 julho 2022 06:51

Governo de Pebane denuncia falta de comunicação com mineradora russa

Passaram os tempos em que as comunidades lideravam a lista de “descontentes” com a falta de comunicação com as empresas que exploram recursos naturais em Moçambique. Hoje, a lista integra também os governos distritais.

 

Em Pebane, um dos distritos da província da Zambézia onde decorrem projectos de exploração de recursos minerais, com destaque para as areias pesadas, o Governo distrital queixa-se da falta de comunicação com a empresa russa Tazetta Resources, que extrai areias pesadas naquele ponto do país desde 2019.

 

Segundo o Secretário Permanente do distrito de Pebane, Robert Armando, a mineradora russa pouco se tem comunicado com o Governo distrital, assim como não tem cumprido cabalmente as suas acções de responsabilidade social.

 

“Não estamos muito bem em termos de responsabilidade social com a Tazetta. Encontramos uma lista de coisas que eles colocaram no seu plano de responsabilidade social, mas que não constituem as necessidades do distrito”, disse Armando, citando o exemplo da distribuição de máscaras de protecção contra Covid-19, que supostamente a empresa citou como acção de responsabilidade social.

 

De acordo com aquele governante, à sua chegada, a Tazetta Resources usou uma estratégia de “dividir para reinar”, criando uma Comissão de Contacto, um grupo de indivíduos que servem de elo entre a empresa, o Governo provincial e a comunidade. Neste processo, disse Robert Armando, a Tazetta Resources prioriza a satisfação desses indivíduos que da população em geral e o Governo distrital não é “tido” e nem “achado” no processo de comunicação.

 

“Já tentamos chamar a empresa para ajudar a população, mas esta só pensa em beneficiar os membros da Comissão. Temos situações em que a empresa até pensava em construir casa para um líder comunitário, no lugar de fazer algo que ajude a população”, contou a fonte.

 

A Comissão de Contacto, afirma Robert Armando, é quem liderou o processo de compensação das populações afectadas pelo projecto de mineração, tendo escolhido, a dedo, as pessoas que deveriam ser compensadas e os valores que estas deveriam receber.

 

O dirigente não apontou os membros da referida Comissão de Contacto, mas “Carta” apurou que a mesma está baseada em Maputo, sendo constituída maioritariamente por antigos membros do Governo, antigos combatentes, com a presença de alguns nativos de Pebane.

 

À “Carta”, o Secretário Permanente do distrito de Pebane disse, por exemplo, que a Tazetta Resources não moveu qualquer palha para ajudar a população na reconstrução das estradas do distrito de Pebane que ficaram danificadas com a passagem do ciclone Gombe, que devastou as províncias de Nampula, Zambézia e Sofala.

 

“Depois do ciclone Gombe, tivemos a entrada principal da vila danificada e, como alternativa, usávamos algumas ruas do bairro. A Tazetta Resources também passou a usar essas ruas, movimentando suas máquinas. A TZM [mineradora chinesa ainda em implantação] é que nos ajudou a reparar as nossas estradas”, contou a fonte, sublinhando que a TZM irá, igualmente, reabilitar a principal rua da vila de Pebane.

 

O Governo distrital de Pebane denunciou ainda a intenção da Tazetta Resources de destruir uma estância turística que se encontra instalada fora da área concessionada à mineradora. Aliás, Robert Armando afirma que a referida estância turística foi instalada antes mesmo da atribuição daquela área à Tazetta Resources.

 

“A brigada do ambiente impediu essa pretensão da Tazetta e orientou a empresa a repor os solos retirados daquela área e a melhorar a via que dá acesso àquela estância turística”, contou o Secretário Permanente do distrito de Pebane.

 

Tazetta implementa seu plano de responsabilidade social de forma gradual – explicam os Serviços Provinciais de Infra-estruturas

 

\No entanto, os Serviços Provinciais de Infra-estruturas da província da Zambézia asseguraram à “Carta” não constituir verdade que a empresa russa não ajuda aquele distrito, dando exemplo da construção do depósito de medicamentos do distrito e da morgue do hospital distrital.

 

Segundo a entidade responsável pelo licenciamento de empresas mineiras que operam na Zambézia, a Tazetta Resources definiu um orçamento de responsabilidade social, que está a ser gasto gradualmente. Explicam também que, no princípio, a mineradora tinha inscrito, no seu plano de responsabilidade social, actividades não prioritárias para o distrito, como é o caso da construção da sede de associações, tendo sido definido um novo plano de responsabilidade social com o envolvimento do Governo distrital.

 

“A empresa tem feito muita coisa em Pebane. Aliás, é um dos poucos locais em que a empresa tem prestado muita atenção. Neste momento, estamos num processo de actualização do plano de responsabilidade social da empresa”, explicou Faira Jeta, técnica do Departamento de Recursos Minerais e Energia, nos Serviços Provinciais de Infra-estruturas da Zambézia, sublinhando que, no passado, havia problemas de partilha de informação com o Governo distrital, entretanto, já ultrapassado.

 

“Temos chamado atenção aos distritos para prestarem atenção aos valores anunciados pelas empresas como sendo de responsabilidade social, como forma de fazerem acompanhamento e auditoria às acções que são realizadas”, salientou.

 

Tazetta já teve processos judiciais por crimes ambientais

 

Por seu turno, o Procurador-Chefe provincial da Zambézia, Fred Jamal, disse à nossa reportagem que os desentendimentos entre a Tazetta Resources e o Governo distrital de Pebane são antigos e derivam, essencialmente, do protagonismo que o Governo distrital quer ter na definição dos planos de responsabilidade social.

 

O magistrado cita, por exemplo, o caso de um projecto de construção de uma escola técnica que ainda não saiu do papel, exactamente por não haver clareza de quem deverá decidir: o Governo distrital quer uma escola técnica, mas a Secretaria Provincial da Juventude e Emprego quer um instituto.

 

Contudo, Fred Jamal reconhece que a empresa tem enfrentado problemas na contratação da mão-de-obra, privilegiando pessoas provenientes das cidades de Quelimane e outras províncias do país, no lugar de contratar mão-de-obra local.

 

Segundo Fred Jamal, a Tazetta Resources já foi processada mais de três vezes por crimes ambientais, tendo sido condenada ao pagamento de multas e reposição de solos. Entre os crimes, destacava-se o facto de a mineradora impedir a população de aceder à praia, tornando-a numa propriedade privada.

 

Durante a realização dos trabalhos, “Carta” notou que a empresa tem drenado águas negras ao Oceano Índico e às lagoas artificiais criadas na área de mineração. As águas resultam do processo de limpeza das areias pesadas, que são extraídas do subsolo.

 

O Procurador-Chefe Provincial da Zambézia disse à “Carta” já ter manifestado esta situação junto das autoridades ambientais, mas estas sempre emitiram pareceres favoráveis, alegando que as referidas águas não tinham qualquer impacto ambiental.

 

“Carta” contactou a Tazetta Resources, através da sua sede na Cidade de Quelimane, capital provincial da Zambézia, mas sem sucesso. A mineradora russa exigiu que a nossa reportagem submetesse um pedido formal de entrevista e, de seguida, prometeu pronunciar-se na tarde do mesmo dia (sexta-feira). No entanto, até ao fecho desta edição, a empresa não tinha respondido à nossa solicitação.

 

Refira-se que o investimento da Tazetta Resources é avaliado em pouco mais de 16 milhões de USD, dos quais 3 milhões foram gastos durante a fase de prospecção; 5 milhões na construção de infra-estruturas para o processamento mineiro, equipamentos e reactivação do porto de Pebane; 4.9 milhões na implementação do plano de responsabilidade social; e 3.1 milhões serão investidos na recultivação da paisagem inicial. A área de exploração não envolveu reassentamento da população, apenas a compensação dos camponeses. (Abílio Maolela, em Pebane)

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