Depois de 23 dias de espera, foi finalmente apresentado o Relatório da Comissão de Inquérito, criada para apurar as responsabilidades pelos erros de conteúdo, cometidos na produção do livro do aluno de Ciências Sociais da 6ª Classe, de distribuição gratuita.
E, como era expectável, a corda voltou a rebentar do lado operativo, tal como ocorreu em outras ocasiões. A Comissão de Inquérito, liderada pela Inspecção-Geral da Administração Pública, responsabiliza o Instituto Nacional de Desenvolvimento da Educação (INDE) e a Porto Editora pelos erros cometidos. Refere que o INDE, entidade que aprovou o livro, não observou todas as fases de avaliação previstas nas cláusulas contratuais e que a Porto Editora ignorou o relatório dos consultores.
Trata-se, na verdade, de uma narrativa que já circula na imprensa e nas redes sociais desde o início dos trabalhos da Comissão de Inquérito. Ou seja, a Comissão de Inquérito veio confirmar o que os jornais já tinham avançado: que Ismael Nhêze, Director-Geral do INDE, estava em situação de conflito de interesses; que a Comissão de Avaliação do Livro Escolar (CALE) não desempenhou o seu papel; e que as editoras mandam e desmandam na produção dos manuais escolares.
Por isso, a Comissão recomenda a exoneração de diversos quadros do Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano, nomeadamente, o Director-Geral do INDE, a Directora Nacional do Ensino Primário, a Secretária Executiva da CALE e o Chefe do Departamento de Gestão do Livro Escolar e Materiais Didáticos.
Entretanto, em nenhum momento a Comissão de Inquérito recomenda a exoneração da Ministra da Educação e Desenvolvimento Humano, a principal responsável pela gestão do sistema nacional de educação. Aliás, à luz dos resultados do Inquérito, Carmelita Rita Namashulua saiu imaculada nesta estória. Ou seja, ela nunca soube que Ismael Nhêze estava em situação de conflito de interesses; nunca esteve a par do processo de produção dos manuais escolares; e nunca se inteirou do funcionamento das unidades orgânicas do MINEDH. Em suma, Carmelita Namashulua nunca liderou o sector da educação.
Curiosamente, o Relatório de Inquérito foi lido pela própria titular da pasta da Educação, ao invés de ser apresentado pela Comissão de Inquérito. Refira-se, aliás, que os membros da Comissão de Inquérito nunca foram apresentados publicamente, tal como aconteceu com as anteriores Comissões de Inquérito. Namashulua não avançou as razões de ter sido ela a ler o documento e nem permitiu questões por parte dos jornalistas (o Relatório foi lido em 11 minutos).
Fontes do MINEDH afirmam que Carmelita Namashulua assumiu o papel de porta-voz da Comissão de Inquérito para afastar, definitivamente, qualquer responsabilidade no escândalo. Dizem ainda que a narrativa “vendida” à comunicação social sobre o conflito de interesses de Nhêze e inoperância da CALE, antes mesmo da conclusão do Inquérito, visava afastá-la da polémica.
Refira-se que este é mais um escândalo, cuja corda rebenta do lado operativo. Lembre-se que o escândalo da exploração sexual de reclusas no Estabelecimento Penitenciário de Ndlavela, despoletado pelo Centro de Integridade Pública, em 2021, culminou com a mudança de toda a equipa de gestão da cadeia e do Serviço Nacional Penitenciário (SERNAP), mas em momento algum “mexeu” com a Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Kida. O caso das “dívidas ocultas” também arrasou os serviços secretos sem afectar qualquer político.
Sublinhar que o Relatório de Inquérito ontem apresentado não avança quem será o responsável pela devolução dos 23 milhões de USD gastos na impressão de um livro que está prestes a ser incinerado, dois meses depois de ter sido descarregado nos portos nacionais. (A. Maolela)