A antiga Primeira-Ministra, Luísa Dias Diogo, defende que a retoma do financiamento ao Orçamento de Estado, por parte do Fundo Monetário Internacional (FMI), representa o regresso da disciplina macroeconómica ao país, pelo que adverte aos moçambicanos que os próximos dias serão “dolorosos”.
Diogo defendeu esta tese, ontem, em Maputo, à margem da cerimónia de premiação dos vencedores das Startupper 2021-2022, um concurso promovido pela petroquímica francesa, TotalEnergies. Lembre-se que o FMI aprovou esta semana um acordo de financiamento de 470 milhões de USD com o governo, o primeiro a ser celebrado desde a eclosão do escândalo das “dívidas ocultas”, em 2016.
Segundo Luísa Diogo, uma das áreas que poderá sentir medidas dolorosas é dos combustíveis, na medida em que o Governo deverá encontrar formas de equilibrar os interesses dos consumidores, distribuidores e importadores, de modo que não falte combustível nas bombas, pois, “isso seria a pior coisa que podia acontecer com um país”.
“[Com o regresso do FMI], penso que temos de esperar duas coisas: a primeira, a disciplina macroeconómica, que muitas vezes é dolorosa. É melhor nos anteciparmos que há medidas que são dolorosas e há também resultados que valem a pena”, começou por dizer a fonte.
“Este retorno do FMI coincidiu com a guerra da Ucrânia e isso também faz com que haja medidas dolorosas em relação a algumas coisas, como preços dos combustíveis. Por isso, o governo deve encontrar formas de saber equilibrar as coisas entre os consumidores, distribuidores e importadores deste produto-chave para a nossa economia. Não podemos correr risco de chegarmos a uma bomba e não encontrarmos combustível. Isso seria a pior coisa que podia acontecer com um país”, acrescentou.
Contudo, a fonte sublinha que a história da economia moçambicana foi feita com reformas, algumas delas “piores do que esta”, por isso entende que a coisa mais importante é explicar aos moçambicanos o que irá acontecer nos próximos dias.
“Os moçambicanos sabem que o seu país toma medidas de reforma e transformações, o importante é receberem explicação. Serem explicados que estamos a fazer isto, porque teremos este resultado. Portanto, qualquer decisão que é tomada tem de ser explicada, primeiro, a todos que participam no processo e, depois, aos cidadãos”, explicou.
“É preciso não cansar de explicar. Explicar no parlamento, através da comunicação social e aos jornalistas (para que possam entender o assunto, de modo a saberem tratar melhor a informação). Portanto, é importante que as medidas que são tomadas sejam explicadas aos cidadãos. É preciso dizer quanto tempo vão durar e onde elas irão desaguar, para que possamos caminhar no mesmo barco”, repisou.
“A estratégia de endividamento deve ser ajustada, olhando para a capacidade que o país tem para pagar”
Entretanto, se o regresso do FMI representa a retoma da austeridade, por outro lado, a ex-governante entende que a chegada daquela instituição da Bretton Woods abre espaço para o país procurar, novamente, o financiamento para os seus projectos de desenvolvimento.
“A segunda questão é que temos de estar preparados na procura de financiamento, porque o farol (que é o FMI) já deu o sinal. No caso do Banco Mundial, a sua reacção é imediata e ele abre várias janelas, pelo que podemos ir pela via dos projectos, de apoio à economia, de programas, etc. Ou seja, é preciso abrirmos o nosso leque de iniciativas”, afirma Diogo.
No entanto, nesta nova janela de oportunidades, a economista defende que o país deve alargar a sua carteira de financiamento, buscando outras parcerias, pois, “o mundo é grande e ele oferece grandes e muitas formas de financiamento”.
Questionada se esta abertura ao financiamento não poderá “escancarar” as portas para que o Governo torne a dívida pública cada vez mais insustentável, Diogo respondeu: “se fosse para irmos buscar a dívida a qual nós estamos estrangulados, neste momento, não precisávamos do FMI. Nós precisamos do FMI para irmos buscar a dívida que corresponde a nossa capacidade de endividamento”.
Segundo Luísa Diogo, o país precisa redefinir a sua estratégia de endividamento, buscando financiamento que está em condições de honrar com os seus compromissos, porque, neste momento, não está em condições de pagar uma dívida comercial.
“Nas nossas estratégias de endividamento, temos a dívida comercial, que é bom Moçambique começar a esquecer. Não somos capazes de pagar a dívida comercial. Mas, quando nós dizemos, vamos buscar no Banco Mundial um financiamento, que leva o número de anos que leva, prazo de diferimento, a taxa de juro de quase 1%, é quase um donativo. Portanto, a estratégia de endividamento do país deve ser olhada e ajustada, olhando para a capacidade que o país tem para pagar. Por isso, é preciso endividar com responsabilidade”, rematou.
Refira-se que o actual stock total da dívida pública moçambicana é de 13.955,1 milhões de USD, o equivalente a 78,6% do Produto Interno Bruto (PIB), sendo que a dívida externa é de 10.391,6 milhões de USD e a interna é de 3.563,4 milhões de USD.
Sublinhar que o acordo de princípios entre o Governo e o FMI foi alcançado em Março último, prevendo reformas macroeconómicas e estruturais no período 2022-2025. (A. Maolela)