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quarta-feira, 04 outubro 2023 09:51

Os difíceis caminhos para a PAZ em Moçambique!

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“Em termos mais objectivos, Moçambique não conhece a PAZ desde o ano 1498, altura em que os portugueses escalaram o país, pese embora, a exploração e expansão efectiva se tenha dado no século XIX. A Luta para a Libertação de Moçambique teve início a 25 de Setembro de 1964 e os Acordos para a Independência a 07 de Setembro de 1975.

Depois do Colonialismo Português, seguiu-se a Guerra patrocinada por estrangeiros, mas que eram os moçambicanos a matarem-se uns aos outros. Esta guerra teve início a 30 de Maio de 1977, cujos acordos definitivos foram assinados a 06 de Agosto de 2019 entre o Governo de Moçambique e a Resistência Nacional Moçambicana, o chamado Acordo Definitivo de Paz".


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Moçambique conheceu o início da ocupação portuguesa em 1498, mas seria no Século XIX que inicia uma exploração intensiva das colónias africanas, devido à perda de influência no Brasil e na Índia. É preciso notar que desde a ocupação portuguesa em 1498, Portugal nunca tinha enfrentado uma revolta digna desse nome, sendo em 1961 a primeira vez em que há uma insurreição armada em Angola. Em Moçambique, a insurreição armada teve início a 25 de Setembro de 1964, na nortenha província de Cabo Delgado.

A luta de Libertação Nacional teve como seu presidente o Dr. Eduardo Chivambo Mondlane e seu vice-presidente o Reverendo Uria Simango. Por motivações que, sendo relevantes, não serão abordados nesta reflexão sobre “os difíceis caminhos para a paz em Moçambique”, a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique e o Governo Colonial Fascista Português viriam a assinar o Acordo de Lusaka em Setembro de 1974, que deu lugar à declaração de cessação de guerra a 08 de Setembro de 1974.

Nos acordos de Lusaka, entre a FRELIMO e o Governo Colonial Fascista Português, estabelecia-se o calendário da Independência Nacional, que passava pela criação do Governo de Transição, que teve como líder Joaquim Alberto Chissano. Como disse antes, a insurreição armada foi declarada pelo Dr. Eduardo Chivambo Mondlane e os Acordos de Lusaka foram assinados por Samora Moisés Machel, sendo seu vice-presidente Marcelino dos Santos.

A independência Nacional viria a ser proclamada a 25 de Junho de 1975, pelo Presidente da FRELIMO, Samora Moisés Machel, e a designação do Estado Moçambicano seria a de República Popular de Moçambique. Esta decisão da FRELIMO criou alguma instabilidade no seio da comunidade portuguesa que receava pelas relações com o novo Governo e estima-se que aproximadamente 170 mil portugueses se teriam retirado de Moçambique, sendo que alguns foram para Portugal e outros refugiaram-se nos países vizinhos como a África do Sul, Rodésia de Ian Smith e Malawi. Seria, precisamente, na Rodésia de Ian Smith onde decidem organizar-se para lutarem contra a independência de Moçambique.

Desta decisão, resultara a criação da RENAMO – Resistência Nacional Moçambicana, que teve como seu primeiro líder André Matade Matsangaissa. Esta guerra tem início a 30 de Maio de 1977 e o apoio logístico foi patrocinado pela Rodésia de Ian Smith. Repare que o início da Guerra entre o Governo da República Popular de Moçambique e a RENAMO – Resistência Nacional Moçambicana acontece em menos de dois anos de independência nacional. O suporte humano foi totalmente moçambicano, começou com um pequeno contingente e muito rapidamente atingiu números astronómicos!

No ano de 1980, a Rodésia de Ian Smith colapsa e a ZANU proclama a independência. A Rodésia passou a chamar-se Zimbabwe e a RENAMO foi obrigada a retirar-se daquele território para a África do Sul do Apartheid. Com a intensificação dos combates, o Governo de Moçambique decide estabelecer o Acordo de Paz com o Regime da África do Sul do Apartheid, que foi assinado a 16 de Março de 1984. O acordo previa, entre outros, a cessação do apoio à RENAMO por parte da África do Sul, o que não chegou a acontecer, pois, a África do Sul intensificou o apoio e a RENAMO por esta altura chegou aos 20 mil homens. Veja abaixo os alvos preferenciais da RENAMO e o trabalho que o Presidente Samora Moisés Machel realizou em contrapartida.

“A Renamo atacou um grande número de entidades governamentais, tais como administrações distritais, escolas e hospitais. Além disso, destruiu também várias estradas e vias de comunicação. Estas acções tiveram um enorme papel desestabilizador na economia, uma vez que não só obrigaram o governo a concentrar importantes recursos numa máquina de guerra, mas principalmente porque levaram ao êxodo de muitos milhares de pessoas do campo para as cidades e para os países vizinhos, diminuindo assim a produção agrícola.

Em Dezembro do mesmo ano (1986), o presidente Samora Machel teve um encontro internacional em Lusaka, Zâmbia, com Hastings Banda, Kenneth Kaunda e Robert Mugabe, presidentes do Malawi, Zâmbia e Zimbabwe, respectivamente. Machel conseguiu convencer Banda a cessar o seu apoio à Renamo. Na sua viagem de regresso a Moçambique, o Tupolev Tu-134, avião cedido pela União Soviética no qual Machel viajava, junto com muitos dos seus colaboradores, despenhou-se em Mbuzini, nos montes Libombos, localizados em território sul-africano próximo à fronteira com Moçambique. O acidente foi atribuído a erros do piloto russo, mas ficou provado que este tinha seguido um rádio-farol, cuja origem não foi determinada. Este facto levou a especulações sobre uma possível cumplicidade do governo sul-africano. Então, Joaquim Chissano foi eleito como o sucessor de Machel. Chissano era Ministro dos Negócios Estrangeiros desde 1975”.

In Wilkipedia, Enciclopédia Livre, Guerra Civil em Moçambique

Com a morte do Presidente Samora Moisés Machel e sua comitiva, nas colinas de Mbuzini, na África do Sul, a Frelimo decide indicar Joaquim Alberto Chissano para Presidente da Frelimo e da República Popular de Moçambique e este continua com as políticas de busca de Paz iniciadas pelo Presidente Samora Moisés Machel e intensifica a aproximação com a Renamo, o que culminaria com a indicação de Delegações de Alto nível por parte do Governo de Moçambique, liderada por Armando Emílio Guebuza e da parte da Renamo por Raul Domingos que em Roma trabalharam para o alcance da Paz, cujo acordo seria assinado a 04 de Outubro de 1992.

O Acordo Geral de Paz teve como protagonistas o Presidente da Renamo, Afonso Macacho Marceta Dhlakama, e o Presidente da República, Joaquim Alberto Chissano. Um dos passos importantes que o Governo teve de dar foi a Revisão da Constituição da República, abrindo espaço para a economia do mercado e o multipartidarismo em Moçambique. De referir que já estava em curso a implementação do PRE - Programa de Reabilitação Económica, em que o Estado Moçambicano abdicou da gestão da economia, cedendo ao sector privado e, na área de habitação, a APIE- Administração do Parque Imobiliário do Estado vende as casas aos seus inquilinos, de entre vários condicionalismos impostos pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.

O Acordo Geral de Paz também abriu espaço para as eleições periódicas, no caso, de cinco em cinco anos. As primeiras aconteceram em 1994, ganhas pela Frelimo e seu candidato Joaquim Alberto Chissano, tendo ficado para atrás Afonso Dhlakama da Renamo. Nas segundas, a Frelimo e Joaquim Chissano voltaram a ganhar e a Renamo e Afonso Dhlakama voltaram a perder. Nas terceiras, o candidato da Frelimo foi Armando Emílio Guebuza e da Renamo continuou Afonso Dhlakama, que voltaria a perde-las mais uma vez, tendo perdido nas seguintes, igualmente, com o candidato da Frelimo Armando Emílio Guebuza.

Na segunda derrota para a Frelimo e Armando Guebuza, Afonso Dhlakama decide retirar-se da Cidade Capital para a Cidade de Nampula e, posteriormente, para as matas de Sofala onde reiniciam as hostilidades militares, em 2012 e viria a assinar o Acordo de Cessação das Hostilidades Militares a 05 de Setembro de 2013 com o Presidente Armando Emílio Guebuza. Nas eleições seguintes, a Frelimo teve como candidato Filipe Jacinto Nyusi, que viria a ganhar copiosamente e a Renamo de Afonso Dhlakama instala um “braço-de-ferro”, recusando reconhecer os resultados e exigindo governar nas Províncias onde, alegadamente, tinha ganho as eleições. Isso não foi aceite pela Frelimo e seguiram-se negociações que culminaram com o Acordo entre o Governo e a Renamo, tendo sido protagonistas Filipe Jacinto Nyusi e Afonso Dhlakama.

Este Acordo não teve muito sucesso, do ponto de vista da sua implementação. Não irei aqui entrar em detalhes, mas o certo é que a Renamo e Afonso Dhlakama continuaram a protestar o que culminou com o retorno às matas da Gorongosa. A circulação Sul-Centro-Norte era quase impossível, funcionava à base de escolta que, não poucas vezes, era atacada e várias pessoas mortas e meios materiais destruídos, entre bens públicos e privados. Ainda assim, o Presidente Filipe Nyusi manteve o compromisso de Paz e continuou à procura de Afonso de Dhlakama para negociar o fim das matanças, tendo iniciado com trégua por tempo determinado, renovado creio que duas vezes e depois viria a trégua por tempo indeterminado, que abriu espaço para encontros entre o Chefe do Estado e Afonso Dhlakama nas matas da Gorongosa.

Enquanto gozávamos as tréguas por tempo indeterminado, o povo moçambicano viria a ser abalado pela Notícia da morte do Líder da Renamo Afonso Macacho Marceta Dhlakama nas matas. Foi uma morte natural, por doença, a 03 de Maio de 2018, e seguiram-se momentos de incerteza. Mas muito rapidamente a Renamo reorganizou-se e indicou o General Ossufo Momade como seu coordenador interino, no Congresso da Renamo, realizado na Gorongosa, com participação de 700 Delegados e 300 Convidados em Janeiro de 2029. Ossufo Momade é eleito presidente, nestas eleições, derrotando Elias Dhlakama que ficou com 238 votos, Manuel Bissopo com sete votos e Juliano Picardo com cinco votos, Herminio Morais retirou a sua candidatura.

As eleições foram contestadas de forma veemente e dessa contestação surgiu a ala militar que desafiou a Renamo de Ossufo Momade e ficou nas matas, considerada a ala dos Generais. Esta ala não teve sucesso político, no entanto, foi usada para “divisão” da própria Renamo, o que fez com que perdesse as eleições de 2019 de forma marcante. Devido a esta continuação das hostilidades, o Governo foi obrigado a assinar outros dois Acordos com a Renamo, tendo sido protagonistas o Presidente da República Filipe Jacinto Nyusi e o General Ossufo Momade. Trata-se do Acordo de Cessação das Hostilidades Militares a 01 de Agosto de 2019 e do Acordo de Paz Definitiva, a 06 de Agosto de 2019.

Não haja dúvidas que o real fim das hostilidades militares é celebrado com a chegada ao fim do processo de DDR – Desmobilização, Desmilitarização e Reintegração dos Homens residuais da Renamo que se encontravam espalhados pelas várias bases criadas durante o período de Guerra. Isso aconteceu a 23 de Junho de 2023, ou seja, a nossa busca de Paz é incessante e continua com a reintegração dos homens da Renamo na sociedade, o que, até hoje, pode-se considerar de bem-sucedido.

Adelino Buque

Sir Motors

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