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quarta-feira, 12 fevereiro 2025 00:26

Tensão pós-eleitoral: Refugiados moçambicanos no Malawi descartam o regresso à casa

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No auge da violência pós-eleitoral em Moçambique, milhares de moçambicanos, incluindo mulheres e crianças, cruzaram a fronteira para o Malawi e outros países vizinhos em busca de refúgio. Mas o que era esperado como um alívio temporário, parece ser uma mudança permanente, especialmente entre a maioria dos refugiados moçambicanos no Malawi que prometem não retornar ao país, mesmo sob ameaça de armas, apesar do retorno da paz.

 

Segundo reporta o jornal malawiano “The Nation”, os refugiados, maioritariamente das províncias da Zambézia e Tete, temem pela sua vida caso regressem a Moçambique. Durante uma visita ao Campo de Refugiados de Nyamithuthu, no distrito de Nsanje, no último sábado, Andrasone Moses Basiyalo, que era secretário da Frelimo na localidade de Sabe no distrito de Morrumbala, disse em entrevista àquela publicação que a ideia de retornar ao país lhe dá um arrepio na espinha.

 

Com lágrimas escorrendo pelo rosto no momento da entrevista, ele disse que está arrependido de ter participado da política activa, pois isso custou a vida dos seus dois filhos.

 

“Está claro que eles queriam me matar por ser o secretário da localidade, mas consegui escapar e me esconder quando invadiram a minha casa. Infelizmente, eles capturaram os meus dois únicos filhos que estavam gritando por ajuda, mas ninguém saiu para prestar apoio”, disse Basiyalo.

 

“Depois vi com os meus próprios olhos os meus dois filhos sendo abatidos como galinhas. Então, é melhor morrer a fome aqui no Malawi do que voltar para Moçambique”, sentenciou.

 

A liderança tradicional de Tengani, no distrito de Morrumbala, em Moçambique [também se estende para o território malawiano] que faz parte do grupo de refugiados no campo de Nyamithuthu, diz que a violência pós-eleitoral está a acelerar silenciosamente, apesar dos relatos da mídia de que a situação está calma.

 

“Voltar para casa é como cavar a sua própria sepultura, principalmente para nós líderes tradicionais que supostamente estávamos ligados à Frelimo. Então, sentimo-nos mais seguros aqui [no acampamento], apesar das péssimas condições de vida, como higiene precária, escassez de comida, entre outras”, afirmou um dos líderes tradicionais.

 

Duas idosas, Petina John e Sofia Bingala, ambas de Morrumbala e que escaparam do conflito armado em Moçambique entre 1977 e 1992, ecoaram os mesmos sentimentos dos líderes tradicionais de Tengani, afirmando que Moçambique, particularmente o seu distrito, não era um lugar seguro para elas viverem.

 

Com quase 90 anos, John chegou a Nsanje no passado dia 25 de Dezembro, depois de atravessar o Rio Shire que separa Moçambique e Malawi. Ela disse que a recente violência pós-eleitoral foi mais perigosa do que a guerra civil.

 

“Eu sobrevivi àquela guerra civil [de 1977-1992], mas esta é mais perigosa porque eles simplesmente entram silenciosamente na tua casa e matam-te, ao contrário do que ocorreu durante a guerra, quando os tiros nos alertavam e começávamos a fugir. Enquanto falo agora, deixei os meus netinhos para trás e nem sei se eles ainda estão vivos”, explicou.

 

Reagindo ao clamor dos refugiados, o secretário-permanente do Ministério da Segurança Interna, Steve Kayuni, disse que o governo do Malawi conversou com Moçambique sobre a melhor forma de lidar com a situação.

 

Ele referiu que a situação dos refugiados moçambicanos precisa de esforços conjuntos dos dois governos e de outras partes interessadas, incluindo agências internacionais.

 

“A situação dos refugiados é um campo muito sensível que requer um equilíbrio, incluindo a obrigação legal que Malawi tem. O Campo de Refugiados de Nyamithuthu é um processo que requer consultas mútuas e permanentes.”

 

Por seu turno, o Comissário Distrital de Nsanje (DC na sigla em inglês), Dominic Mwandira, observou que os refugiados enfrentam uma série de desafios, incluindo a escassez de alimentos, tendas e outros itens de ajuda. Ele disse que o número provavelmente aumentaria porque o Departamento de Refugiados ainda estava a realizar o registo de refugiados.

 

Comentando sobre o assunto, a oficial de comunicações da Inua Advocacy, Brenda Buliyani, disse que, conforme as leis internacionais, os refugiados não podem ser forçados a retornar para suas zonas de origem.

 

“Vimos que já há alguns refugiados que começaram a voltar para casa para reconstruir as suas vidas. Isso é uma coisa boa. Então, deixe-os retornar quando estiverem prontos para retornar, assim como os outros fizeram”, destacou Buliyani.

 

Até sexta-feira, Nyamithuthu tinha 3.656 famílias registadas como refugiadas, representando cerca de 7.536 pessoas.

 

Desde 21 de Outubro de 2024, Moçambique vive uma agitação social caracterizada por protestos, manifestações e paralisações convocadas pelo candidato presidencial da oposição Venâncio Mondlane, que protesta contra os resultados que dão vitória ao candidato da Frelimo, Daniel Chapo.

 

Recorde-se que as autoridades moçambicanas anunciaram há dias que vão repatriar o mais breve possível os cerca de treze mil moçambicanos refugiados no Malawi, dos quais mais de 7000 estão registados.

 

Sem avançar a data, a presidente do Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres, Luísa Meque, que esteve de visita ao Malawi no passado dia 31 de Janeiro, disse que o mais importante é que a decisão de repatriar o grupo já foi tomada.

 

Meque visitou na altura o acampamento dos refugiados moçambicanos em Nyamithuthu, no distrito de Nsanje, onde procedeu à entrega de um donativo de 72 toneladas de produtos diversos, como arroz, farinha de milho, feijão, tendas, entre outros.

 

O plano de repatriamento dos refugiados moçambicanos foi também secundado pelo Alto-Comissário de Moçambique em Lilongwe, Alexandre Manjate.

 

A violência pós-eleitoral em Moçambique também está a causar tensão nos países vizinhos. Além do Malawi, o E-swatini, antiga Suazilândia, também recebeu centenas de moçambicanos. (The Nation/Carta)

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