O Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou a uma reforma urgente do Conselho de Segurança, criticando a estrutura desactualizada e a falta de representação africana, o que prejudica a credibilidade e a legitimidade do órgão.
António Guterres falava na segunda-feira (12), na reunião do Conselho de Segurança, convocada pela Serra Leoa. O chefe da ONU considerou que, em 1945, quando foi criado este órgão, a maioria dos países africanos não tinha voz nos assuntos internacionais, porque estava sob domínio colonial.
Porém, os tempos são outros e urge que não se continue a "aceitar que o principal órgão de paz e segurança do mundo não tenha uma voz permanente para um continente de mais de mil milhões de pessoas", sendo por isso necessário que "as opiniões de África não sejam subvalorizadas" tanto no continente como a nível mundial.
Guterres pediu que a África tenha um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU como parte das reformas para corrigir injustiças históricas.
O Conselho de Segurança — cujos cinco membros permanentes são China, França, Rússia, Reino Unido e EUA — tem sido criticado há muito tempo por representar as realidades que prevaleciam no fim da Segunda Guerra Mundial, quando grande parte da África ainda estava sob domínio colonial.
“O mundo mudou desde 1945. Mas a composição do Conselho de Segurança, apesar de algumas mudanças, não acompanhou o ritmo”, disse Guterres.
O Conselho de Segurança da ONU, composto por 15 membros, inclui cinco membros permanentes com poder de veto (a capacidade de bloquear decisões, mesmo que todos os outros membros apoiem a proposta) – China, França, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos (EUA) – com os 10 assentos não-permanentes restantes alocados regionalmente.
A distribuição regional inclui três assentos para Estados africanos; dois para cada um dos estados da Ásia-Pacífico, América Latina e Caribe, Europa Ocidental e Outros Estados, e um para os estados da Europa Oriental.
A questão da representação equitativa está na agenda há vários anos, inclusive por meio do grupo de trabalho aberto da Assembleia Geral e de negociações intergovernamentais.
Houve “algumas reformas modestas”, como a recente convocação automática de um debate na Assembleia Geral sempre que um veto é emitido, com o objectivo de aumentar a transparência e a responsabilização.
Segundo o organismo mundial, os apelos por grandes reformas continuam, principalmente de regiões sub-representadas. Dennis Francis, presidente da Assembleia Geral, destacou que o assunto está a ser abordando activamente, por meio de negociações intergovernamentais e instou os Estados-membros a se envolverem construtivamente em direcção a uma reforma substancial.
“Nosso objectivo é criar soluções, ao longo de um processo bem desenhado. E, mais importante, reconquistar a confiança e a credibilidade de 'nós, os povos' das Nações Unidas”, disse, recordando as primeiras palavras do Preâmbulo da Carta da ONU.
“O facto de a África continuar a ser manifestamente sub-representada no Conselho de Segurança é simplesmente errado, ofendendo tanto os princípios de equidade quanto de inclusão”, disse Francis. “Isso vai contra o princípio da igualdade soberana dos estados e clama pela urgência de reformar esta instituição para reflectir o mundo como ele é agora, em vez do que era há quase 80 anos.”
Falando no Conselho de Segurança da ONU, o presidente da Serra Leoa, Julius Maada Bio, disse que a África exige dois assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU e dois assentos não permanentes adicionais.
“A União Africana escolherá os membros permanentes africanos. A África quer o veto abolido. No entanto, se os estados-membros da ONU desejarem manter o veto, ele deve ser estendido a todos os novos membros permanentes como uma questão de justiça”, disse.
A União Africana há muito tempo pressiona para que o continente tenha dois representantes permanentes no Conselho e mais dois assentos como representantes não-permanentes. O debate de segunda-feira foi convocado pela Serra Leoa e o seu presidente Julius Maada Bio defendeu o continente.
“O tempo para meias medidas e progresso incremental acabou. A África deve ser ouvida, e as suas demandas por justiça e equidade devem ser atendidas”, disse Julius Bio.
O Conselho de Segurança da ONU tem responsabilidades significativas, incluindo autorizar operações de manutenção da paz, impor sanções internacionais e determinar como a ONU deve responder a conflitos ao redor do mundo.
“Não podemos aceitar que o principal órgão de paz e segurança do mundo não tenha uma voz permanente para um continente com mais de um bilião de pessoas — uma população jovem e em rápido crescimento — que representa 28% dos membros das Nações Unidas”, disse o chefe da ONU.
A África tem estado frequentemente no centro de conflitos alimentados pela ganância pelos recursos do continente, necessários à economia global, disse Guterres.
Ele também destacou que quase metade de todas as operações de manutenção da paz da ONU ocorreram na África e 40% dos soldados da paz da ONU eram africanos. O chefe da ONU acrescentou que o órgão não conseguiu alinhar adequadamente a representação africana com os esforços e contribuições do continente.
A ONU foi criada após o fim da Segunda Guerra Mundial para poupar as gerações futuras do flagelo do conflito armado. Apenas quatro nações africanas — Egipto, Libéria, Etiópia e África do Sul — estavam entre os membros fundadores.
Para Guterres, a necessidade de mudança não é apenas uma questão de ética e justiça. “É também um imperativo estratégico que pode aumentar a aceitação global das decisões do Conselho de Segurança, beneficiando a África e o mundo”, disse. (BBC)