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segunda-feira, 06 julho 2020 06:03

Maleiane assinou diploma sobre selagem sem consulta aos interessados

  • CTA escreveu ao ministro da Economia e Finanças a solicitar suspensão da publicação do diploma em causa
  • Consulta aos interessados é obrigatória, conforme a lei que regula a formação da vontade da Administração Pública

A Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) dirigiu, semana passada, uma carta ao ministro da Economia e Finanças, adriano Maleiane, solicitando que accione “os bons ofícios ao seu dispor” como forma de se suspender a publicação, no Boletim da República, do Diploma Ministerial que aprova o Regulamento de Selagem de Bebidas Alcólicas e Tabaco Manufacturado, por si assinado a 23 de Junho último, apurou a Carta de Moçambique.

 

O que sucede é que num lapso de apenas três dias úteis depois que a presidente da Autoridade Tributária de Moçambique (AT), Amélia Muendane, remeteu à CTA a proposta do Diploma Ministerial em referência para efeitos de apreciação e emissão do relevante parecer, o mesmo foi assinado por Maleiane. A CTA recebeu o instrumento em referência a 17 de Junho, uma quarta-feira, tendo o mesmo sido assinado a 23 de Junho, uma terça-feira.

 

As nossas fontes referem que o ministro da Economia e Finanças pode tê-lo feito desconhecendo que o mesmo ainda carecia de comentários por parte da CTA, de resto no quadro do diálogo público-privado, quando, na verdade, esse não é o caso. “É muito estranho que a AT esteja muito apressada com isto”, comentou ao nosso jornal um empresário da praça.

 

“Tratando-se de um instrumento de extrema importância para os subsectores das bebidas alcólicas e tabaco manufacturado e com efeitos multiplicadores em toda a economia, achamos pertinente realizar uma análise minuciosa sobre o documento, para melhor posicionamento conforme a solicitação da presidente da AT”, lê-se numa das passagens da carta da CTA, assinada pelo respectivo presidente, Agostinho Vuma, dirigida a Maleiane, com a data de 1 de Julho, a que a Carta de Moçambique teve acesso.

 

Aliás, a Carta de Moçambique está em posição de afirmar que a atitude da AT, que terá ‘industriado’ Maleiane a “correr” com a assinatura do Diploma Ministerial em referência, mostra-se contrária não só aos mais elementares princípios do diálogo público-privado, mas, igualmente, à propria lei, nomeadamente a Lei número 14/2011, de 10 de Agosto, que regula a formação da vontade da Administração Pública.

 

Um dos princípios sacrossantos em sede da lei que regula a formação da vontade da administração pública é o princípio da participação dos administrados (artigo 10), que reza que “A Administração Pública deve promover a participação e defesa dos interesses dos administrados, na formação das decisões que lhe disserem respeito”.

 

Mas qual seria a consequência da publicação do referido Diploma Ministerial sem a efectivação da consulta aos interessados no seu objecto? Perguntámos a um jurista especializado em Direito Público. “Em análise simples e óbvia, diria que o diploma legal a ser eventualmente publicado sem a observância do princípio da participação dos administrados estaria inquinado de um vício de ilegalidade”, disse-nos.

 

As autoridades moçambicanas estão a avançar com a selagem de cervejas, em particular, mesmo havendo estudos que referem que a mesma é insustentável para a indústria cervejeira. Aliás, dos pouco mais de 200 países existentes no mundo, menos de 10 alguma vez ensaiaram a selagem de cerveja.

 

Carta de Moçambique sabe que, diferentemente do que sucede no domínio da cerveja, no contexto das espirituosas os elevados níveis de fuga ao fisco, neste momento situados em 73 por cento, justificam a selagem. “Mas nas cervejas essa decisão é de viabilidade muito duvidosa”, sublinhou a nossa fonte.

 

Uma redução na produção das cervejeiras, concretamente a Heineken Moçambique e a Cervejas de Moçambique (CDM), afectaria, por outro lado, uma emergente naipe de empresários agrícolas nas regiões Centro e Norte do país, dos quais as duas empresas compram matéria-prima como milho e mandioca para a produção de algumas das suas marcas de cerveja.

 

Com uma eventual manutenção da decisão de se proceder com a selagem das cervejas, parece não ser difícil concluir que mesmo a maior promessa do Presidente Nyusi para o quinquénio iniciado há seis meses, nomeadamente a criação de pelo menos três milhões de empregos, seria afectada.

 

A Carta de Moçambique sabe que a chave para o sucesso dessa promessa de Nyusi está precisamente no sector agrícola, nomeadamente através da melhoria dos níveis de renda no sector familiar e consequente registo de empregos.

 

De referir que um estudo publicado há dias pelo Centro de Integridade Pública (CIP) constatou haver um “festival” de contrabando de selos em Moçambique, “o que acontece com o envolvimento de alguns funcionários das Alfândegas de Moçambique que controlam o uso dos mesmos”.

 

Ainda segundo o CIP, há evidências de que pessoas com ligações actuais ou passadas com a OPSEC, a firma contratada para cuidar da efectivação da selagem, também estejam envolvidas “no esquema que permite a violação das regras de distribuição de selos holográficos, levando ao seu contrabando para posterior venda nos mercados informais”. (Carta)

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