A corrupção, em Moçambique, é já considerada um problema endémico. O caso das chamadas “dívidas ocultas”, que lesaram o Estado em cerca de 2,2 biliões de USD, figura no topo da lista no que aos casos de corrupção diz respeito. Para já, este é considerado o maior escândalo financeiro de que o país tem memória.
No ano de 2017, por exemplo, foram sacados indevidamente dos cofres do Estado 610 milhões de meticais. Aliás, importa fazer menção que, em 2016, uma vez mais resultado de actos e práticas corruptas, o Estado perdeu qualquer coisa como 459 milhões de meticais.
Em 2018, ou seja, no ano passado, o país regrediu no índice de percepção de corrupção, permanecendo na 157 posição, atrás de Cabo Verde (51) e São Tomé e Príncipe (68). No ano prestes a findar, 2019, ainda no que ao índice de percepção da corrupção diz respeito, o país caiu quatro posições, ocupando, neste momento, a posição 161, num total de 183 países.
Estudiosos nacionais e internacionais em matéria de corrupção e boas práticas na gestão da coisa pública apontam o escândalo das “dívidas ocultas”, arquitectadas e operacionalizas durante o consulado de Armando Guebuza, que tem à cabeça indivíduos umbilicalmente ligados ao partido no poder, a Frelimo, como a razão central para as sucessivas quedas registadas pelo país.
Dados do Gabinete Central de Combate à Corrupção, tornados públicos no princípio deste ano, apontam que o Estado Moçambicano perdeu 46 mil milhões de meticais devido à corrupção nos últimos 10 anos (2008-2018). Do total desviado de 2008 a 2018, o Estado conseguiu recuperar os modestos 96 milhões de meticais.
E por a corrupção ser, actualmente, o tema em voga, “Carta” compulsou, à lupa, o manifesto dos três principais partidos políticos concorrentes às Eleições Gerais de 15 de Outubro próximo. São eles a Frelimo, Renamo e o Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
Nas próximas linhas, a nossa publicação traz os antídotos que as três formações políticas concorrentes ao pleito a realizar-se próximo mês comprometem-se a aplicar, tendo em vista a erradicação desta prática que corrói as contas públicas, isto caso vençam o escrutínio. As soluções constam do manifesto eleitoral para o quinquénio 2020-2024.
Frelimo
O partido Frelimo, no poder há mais de 40 anos define, no seu manifesto eleitoral, a corrupção como sendo “um crime que retarda o desenvolvimento sócio-económico, mina a confiança dos cidadãos para com as instituições, manipula a atenção e as prioridades de um Povo, tem custos sociais e económicos insuportáveis”. E por assim ser, anota a formação político-partidária, vai orientar a sua acção “no contínuo reforço da prevenção e combate à corrupção, bem como na observância da probidade pública na sociedade moçambicana”.
De forma concreta, o partido liderado por Filipe Nyusi, que concorre à sua própria sucessão, prevê introduzir, dentre várias, as seguintes medidas: “Promover a integridade, ética e deontologia profissional no sector público, consolidando a cultura de transparência, prestação de contas e responsabilização; Reforçar as medidas de prevenção da corrupção e estimular a denúncia e promover o envolvimento de várias instituições e dos cidadãos; Combater, enérgica e exemplarmente, todas as formas de corrupção; Fortalecer e criar novos instrumentos, no âmbito da gestão transparente da coisa pública, nomeadamente, na administração e governação central, local, autárquica, bem como no sector empresarial do Estado”.
Esta formação política, ainda no rol das medidas tendo em vista o saneamento do problema, propõe-se a “actualizar, fortalecer e divulgar a legislação e a sua aplicação rigorosa, para melhorar a eficácia da actuação das várias entidades intervenientes na prevenção e combate à corrupção na vida nacional; Profissionalizar a administração pública, para tornar o Estado mais actuante na prevenção e combate à corrupção; Promover a aprovação de legislação pertinente para a protecção dos denunciantes de casos de corrupção no sector público ou privado; Promover a aprovação de legislação pertinente para o tratamento mais célere, pelos órgãos da administração da justiça, dos casos indiciados de corrupção no sector público ou privado, sobretudo, no que diz respeito à priorização da investigação dos casos de fraude ou corrupção que sejam alvo de denúncia pública.
Renamo
A Renamo, o maior partido da oposição do xadrez político nacional, concorre à “condução dos destinos do país”, desde as primeiras eleições multipartidárias, realizadas em 1994. Este partido tem sido crítico à gestão levada a cabo pelo partido no poder, mormente a gestão das contas públicas.
O partido liderado por Ossufo Momade, igualmente, candidato para as presidenciais, diz que no seu “programa de governação” é pelo combate cerrado contra todo o tipo de corrupção, sobretudo a grande corrupção. O maior partido da oposição pretende, logo que ascender ao poder, acabar com o que chamou de “evidente subordinação política e financeira do judiciário ao poder executivo, o que faz com que alguns processos, sobretudo os de grande corrupção, apenas corram de acordo com vontade e interesses situacionais do poder executivo”.
Prossegue: “é urgente libertar o judiciário das amarras do executivo, cessando os poderes presidenciais de escolha e nomeação das lideranças das magistraturas de topo e da Procuradoria-Geral da República”.
MDM
A terceira maior força política do país, o MDM, actualmente liderado por Daviz Simango, candidato presidencial para as eleições que se avizinham, também não concorda com o estado de coisas, afirmando que, nos últimos oito anos, a “corrupção, a impunidade e desonestidade” foram as que mais se evidenciaram.
O partido do “galo” diz que vai “garantir o cumprimento dos princípios éticos e morais bem como o cumprimento da legislação anticorrupção e de conflito de interesses; criar mecanismos de Educação para a Cidadania, em articulação com todas as forças vivas da sociedade moçambicana como um elemento de grande importância na promoção da integridade e na prevenção da corrupção; produzir instrumentos internos do domínio público em consonância com a legislação moçambicana, para acautelar os princípios da necessidade, gestão de riscos, imparcialidade e transparência e simplicidade de modo a prevenir a fraude”.
Propõe-se, igualmente, a “Reforçar a prevenção da corrupção e dar um real combate a este flagelo a todos os níveis e reprimir o enriquecimento injustificado no exercício de funções públicas; Despartidarização do Estado, proibindo o funcionamento de células de partidos políticos e o exercício de actividades políticas partidárias nas instituições públicas; Análise de todos os procedimentos que na Administração Pública podem favorecer estruturalmente práticas de corrupção, para introduzir as alterações necessárias e Revisão das regalias de altos funcionários do Estado, incluindo o Chefe de Estado, Ministros, ex-Ministros, PCA´s e Deputados no activo e cessantes”. (I.B)