Director: Marcelo Mosse

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BCI
terça-feira, 30 julho 2019 06:34

Distração monumental da juíza Evandra Uamusse coloca detidos das “dívidas ocultas” no corredor da...liberdade provisória

O Tribunal Supremo tem uma batata quente nas mãos. No prazo de oito dias (prazo vertido na Constituição da República) contados a partir da passada sexta feira, a entidade suprema da magistratura judicial deve decidir se solta ou não quase todos os arguidos das “dívidas ocultas” na sequência de requerimentos extraordinários de “Habeas Corpus” interpostos pela defesa depois da expiração dos prazos de prisão preventiva previstos na lei.

 

Todos os arguidos já cumpriram mais de quatro meses nos calabouços, uma vez que foram notificados do despacho de acusação a 25 de Março. Nos termos do artigo 308 do Código do Processo Penal, o prazo de prisão preventiva é de 4 meses, tendo terminado no dia 25 de Julho. Até antes desta data, a juíza Evandra Uamusse deveria ter elaborado o despacho de pronúncia (acusação definitiva). Em termos concretos, e tendo em conta que a instrução contraditória foi aberta a 3 de Abril (com prazo de 3 meses, ou seja, terminando no dia 3 de Julho), só uma acusação definitiva justificaria a reclusão dos detidos para lá dos 4 meses. Mas isso não foi feito.

 

 

A iminência da libertação provisória dos arguidos detidos das “dívidas ocultas” poderia ter sido evitada se a juíza Evandra Uamusse (que está na categoria B de juiz provincial há menos de 1 anos) não se tivesse distraído de uma coisa essencial: a Lei prevê a prorrogação dos prazos de instrução contraditória e de prisão preventiva por 30 dias nos termos do artigo 334 de CPP, mediante despacho fundamentado depois de ouvidas as partes.

 

No dia 22 de Junho, a juíza prorrogou o prazo de Instrução contraditória por 30 dias, passando a terminar no dia 3 de Agosto. No mesmo dia deveria ter prorrogado o prazo de prisão preventiva por 30 dias, passando a terminar no 25 de Agosto, o que não fez. E, no dia 25 de Julho, também não notificou as partes sobre o despacho de pronúncia, tornando a prisão de todos praticamente ilegal a partir de 26 de Julho.

 

Esta situação está a causar uma grande celeuma no seio das duas magistraturas (judiciária e do Ministério Público) pois a “gaffe” da juíza é mesmo insanável e o único caminho legal é a soltura dos arguidos.  O Tribunal Supremo (a sua secção criminal) tem sido dúbio no julgamento de processos de Habeas Corpus. Presidida pelo juiz-conselheiro Luís Mondlane (um dos mais experientes do TS, e que já foi Presidente do Conselho Constitucional, mas teve de regressar à casa por conduta irregular no CC), a secção criminal mandou libertar, há cerca de dois anos, o cidadão Rufino Licuco, condenado em primeira instância a uma pena de prisão (e também numa acção cível) no caso de violência doméstica interposto por Josina Machel.

 

Licuco sempre respondeu no processo em liberdade. Após a condenação, ele foi recolhido imediatamente à prisão mesmo depois de ter interposto um recurso (que suspendia a condenação). Seus advogados requereram o Habeas Corpus junto do Tribunal Supremo, que decidiu favoravelmente dentro do prazo de oito dias. Mas a mesma secção teve, mais recentemente (e no caso vertente das “dívidas ocultas”) uma postura diferente, amplamente criticada pela defesa.

 

Os pedidos de Habeas Corpus de Gregório Leão e António Carlos Rosário (quadros superiores do SISE) foram decididos negativamente depois de 3 meses e os argumentos para a recusa considerados “pouco convincentes” pela defesa. O facto de ter levado meses a decidir um assunto cujo prazo constitucional é de oito dias, levantou suspeitas segundo as quais o TS estava a ser guiado por ditames extra-judiciais.

 

Agora, a expectativa da opinião pública na sequência dos novos requerimentos de “Habeas Corpus” parece estar redobrada. Uma coisa é certa: a “gaffe” da juíza Evandra Uamusse é insanável. Uamusse é uma novata juíza da sexta secção criminal do Tribunal da Cidade de Maputo. Até bem pouco tempo ela era uma juíza distrital em Quelimane. Depois de ascender à juíza B Provincial, nunca tinha passado pelas suas mãos um caso de grande complexidade como este das “dívidas ocultas”. O critério de distribuição de casos entre os juízes é por sorteio mas há quem pensa que o processo das “dívidas ocultas” deveria ter sido entregue discricionariamente a um juiz mais calejado. (Marcelo Mosse)

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