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BCI
quarta-feira, 19 junho 2019 05:52

“Estamos muito longe de sermos paz”, defende Joaquim Chissano

A exclusão política, económica e social e as fragilidades das instituições democráticas, que deviam funcionar como máquinas capazes de mover o processo de desenvolvimento, tornam Moçambique ainda longe de estar em paz. Quem assim entende é o antigo Chefe de Estado, Joaquim Chissano, falando, esta terça-feira (18), durante o Diálogo Sobre Políticas de Alto Nível, que teve lugar em Maputo.

 

Respondendo a uma pergunta da plateia sobre como via a paz, hoje, com a insurgência que se verifica na província de Cabo Delgado, Joaquim Chissano defendeu que “a paz ainda está a ser construída” e que “falta muito para a paz se consolidar”.

 

“Estamos muito longe de sermos paz, pois, cada um tem de ser paz. Criar a paz dentro de si. Saber ser tolerante com o outro. Aceitar a diferença”, disse o antigo Estadista a uma plateia composta por diplomatas, deputados e Reitores de algumas universidades moçambicanas, para além de jornalistas e outras figuras anónimas.

 

Chissano, que falava sobre “Democracia e Desenvolvimento Económico em África: Desafios e Perspectivas para Moçambique”, afirmou que o percurso da democracia e desenvolvimento moçambicanos não depende apenas de boas políticas públicas, mas sobretudo da paz.

 

“A paz e a harmonia social são as condições sem as quais não há política pública que possa fazer milagres. A paz é o primeiro maior bem comum que deve ser defendido e promovido por todos”, defendeu o antigo Presidente da República.

 

“Muita gente costuma dizer que a democracia e a paz são faces da mesma moeda, mas eu costumo acrescentar que a moeda não tem apenas duas faces, mas também tem bordas. E esta pode ser a paz. Nunca pode ser separada dessa moeda”, acrescentou a fonte, sublinhando que é nas zonas rurais, onde se sente o maior desconforto da vida, devido à falta da paz, desenvolvimento e inclusão.

 

Com o processo de Desmilitarização, Desmobilização e Reintegração em curso, Joaquim Chissano defende que, mais do que buscar a experiência dos outros países na pacificação e consolidação da democracia, deve-se buscar as experiências nacionais, pois, na sua óptica, “não há qualquer país que progride ignorando a sua própria história”.

 

“Em Moçambique, temos muitas experiências e boas. A partir do momento em que decidimos lutar política, militar e diplomaticamente pela nossa liberdade até este momento estamos a acumular a nossa experiência. Talvez não estamos a utilizar essa experiência de forma eficiente”, anotou, sublinhando: “a nossa galinha pode ser mais saborosa que a do vizinho”, em recurso ao adágio popular que diz: “a galinha do vizinho é mais gorda”.

 

Para Chissano, não se pode falar de democracia, se a mesma não influencia o melhoramento das relações humanas e o desenvolvimento dos povos, pois, a democracia e o desenvolvimento constituem a base fundamental das relações internas e externas dos seres humanos, sendo um relacionamento de interdependência económica, política, social e cultural.

 

Neste sentido, afirma Chissano, a melhor forma de relacionamento irá depender, fundamentalmente, das políticas públicas que forem desenhadas com a participação de todo o cidadão, de modo a eliminar-se as barreiras que impedem o crescimento.

 

“A participação activa poderá fazer com que cada moçambicano se sinta orgulhoso de ter contribuído na construção do país, pois, muitas vezes, quando se fala de democracia, as pessoas falam de eleições e esquecem da participação, que é essencial”, argumentou, sustentando a sua posição com a situação vivida pela Líbia, durante o reinado de Muammar al-Gaddafi.

 

“Quando visitei a Líbia, fiquei admirado porque toda a gente tinha carro, casa, escola e o combustível custava 20 cêntimos. Mas, havia gente que não estava tranquila, porque parecia que tudo caía do céu. Não participavam na concepção das políticas. E isso criou agitação na Líbia, pois, tinham pão, mas não participavam na sua concepção Portanto, a democracia deve ser praticada, de modo que as pessoas possam sentir tranquilidade dentro de si”, frisou.

 

Aliás, no seu discurso de 20 minutos, Joaquim Alberto Chissano, de seu nome completo, contrariou a maioria dos moçambicanos que considera a Constituição da República de 1990 como a que introduziu a democracia, no país.

 

Para Chissano, “não nos esqueçamos que, quando travámos a luta de libertação nacional, estávamos a travar a luta contra um regime ditatorial, fascista e não apenas colonial, pois, não havia democracia”, por isso, “que não venhamos a pensar que a democracia começou, em 1990, quando mudamos a Constituição. Lutamos pela democracia, desde quando nos insurgimos”. (Abílio Maolela)

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