Acabou o ambiente de “anarquia” (na linguagem policial) e de convivência pacífica entre as FDS (Forças de Defesa e Segurança) e a população, na vila fronteiriça de Ressano Garcia, no distrito da Moamba, província de Maputo. Agora, reina a lei da bala e do gás lacrimogéneo, imposta pela Polícia da República de Moçambique, através da sua Unidade de Intervenção Rápida (UIR).
Desde quinta-feira passada que a vida virou ao avesso, em Ressano Garcia, com a Polícia a perseguir e a matar cidadãos, em nome da reposição da ordem e tranquilidade públicas na maior fronteira terrestre moçambicana, cujas operações estão afectadas pelos protestos, convocados pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, em repúdio aos resultados eleitorais de 09 de Outubro.
A lei da bala e do gás lacrimogéneo já causou a morte de pelo menos cinco pessoas, sendo que uma das vítimas é um jovem blogueiro, de nome Albino José Sibia, mais conhecido por “Shottas”, assassinado em directo, na quinta-feira, quando transmitia, na sua página do Facebook, as atrocidades da Polícia.
As restantes quatro vítimas foram assassinadas no sábado, curiosamente, durante o funeral da primeira vítima da Polícia. Sem explicação, a Polícia invadiu, ao meio da tarde de sábado, o cemitério de Ressano Garcia e começou a lançar gás lacrimogéneo, causando caos e terror aos presentes, incluindo a família de “Shottas”.
O terror policial começou por volta das 14h00 e só terminou por volta das 21h00, depois de concluir a perseguição, casa-a-casa. Mais de dez pessoas ficaram feridas. Até ao momento, são desconhecidas as razões que levaram a Polícia a invadir um cemitério e perturbar uma cerimónia fúnebre.
O ambiente de tensão tomou conta da vila de Ressano Garcia, com a população revoltada com a Polícia, depois de um mês de “convivência pacífica” entre ela e as Forças Armadas de Defesa de Moçambique. Na Polícia, ninguém ainda se disponibilizou a falar do assunto.
Lembre-se que, em dias de protestos convocados por Venâncio Mondlane, a população de Ressano Garcia andava de “mãos dadas” com as FADM. Aliás, em 30 dias de presença dos militares naquele posto fronteiriço, não houve registo de confrontos entre as tropas e a população, facto que eleva a indignação social e levanta questionamentos sobre os motivos da actuação violenta da Polícia. (Carta)