Um documento apresentado pelos procuradores durante as alegações finais do julgamento de Manuel Chang em Brooklyn (a que o CIP teve acesso), nos Estados Unidos da América, revela um ambicioso plano de negócios entre a Privinvest, a família Guebuza e outros importantes funcionários do Estado, na altura da contratação das dívidas ocultas.
Trata-se de um projecto para a criação de um Fundo de Investimento no Liechtenstein (país europeu), denominado Privinvest Holding Mozambique, que iria actuar em vários sectores de negócios em Moçambique, tais como o sector financeiro, imobiliária, petróleo e gás, agricultura, construção naval e até operações de jactos de luxo.
O Fundo de Investimento de Liechtenstein teria como principal accionista a Privinvest Holding (de Iskandar Safa) com 50%. Os outros 50% seriam detidos por um grupo de altos funcionários do Estado que controlavam sectores chave de governação na altura, a começar pelo próprio Armando Guebuza.
Entre os 50% dos moçambicanos, Armando Guebuza e o seu filho Armando Ndambi Guebuza teriam 50% das acções, Manuel Chang teria 20%, Gregório Leão José (director do SISE na altura) teria 20% e António Carlos do Rosário (director da Inteligência Económica na altura dos factos) teria 10%.
Com esta estrutura accionista estava garantido que a Privinvest Holding Mozambique tinha todas as condições de fazer lobby para o sucesso dos seus negócios em Moçambique. Aliás, no plano está referido que a Palomar Capital Advisors Switzerland, que seria detida a 100% pela Privinvest Holding Mozambique iria prestar serviços exclusivos de conselheiros do Ministério das Finanças em Moçambique.
Beneficiando-se do facto de Armando Guebuza ser o Chefe do Estado e do Governo, a empresa tinha o plano de actuar através da criação de empresas subsidiárias focadas nas seguintes áreas de actividades: construção naval; imobiliária; serviços financeiros; logística do sector do petróleo e do gás; agricultura; aluguer/venda de jactos privados.
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América afirma que o plano de negócio entre Guebuza, outros altos funcionários do Estado e a Privinvest era apenas para ganhar mais dinheiro à custa do Estado.
Dirigindo-se aos membros do Júri, a Procuradora Genny Ngai afirmou o seguinte: “... Pearse contou-vos sobre uma reunião (...) que Boustani, o réu (Chang) e Do Rosário tiveram em Setembro de 2013 e essa reunião ocorreu na propriedade de Iskandar Safa, Domaine de Barbossi, no sul da França. E, nesta reunião, o réu (Chang), Boustani e Do Rosário, os três, tiveram esta ideia para ganhar ainda mais dinheiro. Boustani até diz, «Isto foi o que combinámos com os nossos amigos.» E, esta ideia de negócio ou esta ideia, é assim que funcionaria: a Palomar, propriedade de Safa, Pearse e Boustani, concordou em prestar serviços exclusivos ao Ministério das Finanças, que o arguido dirigia. E os serviços que a Palomar ia prestar era para ajudar a angariar dinheiro para esta coisa chamada Fundo Soberano, porque vejam bem, a Palomar era suposto receber 100 milhões de dólares em taxas do Ministério das Finanças e todo esse dinheiro ia fluir para esta empresa chamada Privinvest Holding Moçambique”.
As discussões da criação da Privinvest Holding Mozambique são de Setembro de 2013, segundo revelado nos documentos apresentados no tribunal. No entanto, não andaram porque no ano seguinte Guebuza terminou o Mandato e Nyusi, que o veio substituir não deu continuidade aos projectos das dívidas ocultas e, mais ainda, o escândalo rebentou quando as empresas moçambicanas entraram em incumprimento (default) levando os credores a revelar a existência das dívidas na imprensa. (CIP)