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segunda-feira, 15 abril 2019 06:06

Uma simulação matemática sobre a divisão da UP, de acordo com António Prista

O despacho que originou a divisão da Universidade Pedagógica (UP), inicialmente em quatro novas Universidades tendo terminado em cinco, preconizava que os objectivos de tal medida eram os de (1) reduzir os níveis de duplicação de cursos e Unidades Orgânicas, (2) racionalizar o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros e (3) conferir o ensino superior uma nova dinâmica e eficiência de funcionamento. Não tendo nunca sido apresentado como é que a divisão da UP em cinco novas universidades poderia provocar tal mudança, apraz-me aqui realizar um exercício de simulação matemática. Importa desde já sublinhar que se trata de uma SIMULAÇÃO e que, portanto, a realidade poderá ser substancialmente, mas não no essencial, diferente.

 

Sobre o objectivo 1: REDUZIR OS NÍVEIS DE DUPLICAÇÃO DE CURSOS E UNIDADES ORGÂNICAS

 

A extinta UP tinha sete Faculdades e duas Escolas Superiores. Com carácter nacional, as Faculdades estendiam-se por todas as delegações, os programas definiam-se para todas as unidades de forma homogénea e as regências das cadeiras abrangiam todos os cursos do País. Com esta orgânica, evitavam-se multiplicações de regentes de disciplinas, utilizavam-se os recursos de docentes de forma parcimoniosa e mantinha-se uma estrutura administrativa limitada. Não se consegue entender como a criação de cinco universidades vai, como se afirma no despacho, reduzir a duplicação de cursos e unidades orgânicas.

 

Note-se que os programas da UP, sendo organizados por Faculdades, eram de abrangência nacional, o que significava que um único programa servia o País inteiro. Ao mesmo tempo, os docentes de cada delegação, porque da mesma Faculdade, abrangiam sempre que necessário todas as outras delegações, o que em português significa o uso racional dos recursos. Com a divisão recente, cada docente abrangerá apenas a sua Universidade.

 

Uma comparação entre a situação actual e um hipotético cenário simulado a partir da estrutura mais ou menos vigente em qualquer Universidade conduz-nos a um aumento evidente e abrupto de unidades orgânicas. Das actuais sete Faculdades e duas Escolas Superiores que abrangem as 11 Delegações, passarão a ser necessárias, teoricamente, pelo menos 35 Faculdades com os respectivos departamentos.

 

Os cursos deixarão de ser únicos, os recursos humanos que eram um corpo único terão de ser multiplicados e por aí em diante. Salvo outras explicações, fica por demais evidente que, ao contrário de reduzir o nível de duplicação de cursos e unidades orgânicas, o que vai acontecer de forma brutal é exactamente o contrário. Não se entende, pois, como é que a medida tomada vai “reduzir os níveis de duplicação de cursos e Unidades Orgânicas”, quando de facto vai multiplicá-las várias vezes.

 

Sobre o objectivo 2: RACIONALIZAR O USO DE RECURSOS HUMANOS, PATRIMONIAIS E FINANCEIROS

 

Nunca tendo sido apresentado como é que a criação de mais quatro universidades vai garantir a racionalização de recursos humanos, patrimoniais e financeiros, o processo iniciou com a nomeação de um total de cinco Reitores e oito vice-reitores. Sabendo que estes cargos se equivalem aos de Ministros e vice-Ministros (o que sempre achei muito despropositado, mas assim o é, aparentemente, devido a alguma razão histórica que deixou de fazer sentido), o resultado é que onde havia um Reitor e um Vice-Reitor passou a existir esse número multiplicado por cinco e oito respectivamente, e isso para já. Sendo assim, e de forma muito simulatória, o Orçamento do Estado deverá, a partir desta semana, providenciar mais 10 viaturas, protocolares, 10 viaturas de afectação pessoal, 10 ajudantes de campo (não incluído nos cálculos), 10 secretárias e 10 chefes de gabinete.

 

Uma simulação comparativa deste gasto está exposta na Tabela 1 (note-se que a simulação não inclui viagens). Acrescenta-se a estes gastos a multiplicação de directores de faculdade e escolas superiores (um cargo que equivale a Director Nacional). Actualmente são nove directores e 18 directores adjuntos. Passarão, embora se saiba que não será de imediato, a ser um total de 135 directores e adjuntos com toda a despesa que isso implicará. Somam-se os Directores dos Centros de Pesquisa e de Departamento Centrais.

 

A assumir esta simulação, o OGE deverá suportar, só com os quadros de Direcção, um valor quase cinco vezes maior. Assim, as despesas mensais fixas com quadros de direcção passarão para o mesmo número de estudantes, de um gasto em torno de 92 milhões de meticais para quase 458 milhões. Isto representa um aumento de despesa na ordem dos 400%.

 

Fica por isso muito difícil entender como é que esta medida vai “racionalizar o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros”. Fica preocupante também o facto de sabermos que estes aumentos de encargos não serão suportados por aumentos no orçamento, mas sim no desvio de verbas que deveriam ser canalizadas para pesquisa e ensino. Quem vive nas universidades sabe da ausência de recursos para actividade de ensino, pesquisa e extensão que atinge limites inaceitáveis quando consideramos os gastos em mordomias de vária ordem.

 

Tabela 1. Simulação comparativa de gastos anuais com cargos directivos da ex-UP com o quadro actual

 

     

EX-UP

 

NOVAS

DESPESA

VALOR BASE a)    

Qt     

ANUAL                  

QT      

VALOR

Reitor

207 505,20

1

2490 062,40

5

12 450 312,00

Vice-Reitor

175 170,30

1

2 102 043,60

10

21 020 436,00

Assessores

95 587,50

4

4 588 200,00

10

11 470 500,00

Director de Faculdade

95 587,50

9

10 323 450,00

45

51 617 250,00

Director de Centro de Pesquisa

95 587,50

5

5 735 250,00

25

28 676 250,00

Directores de Faculdade Adjuntos

81 328,70

18

17 566 999,20

90

87 834 996,00

Directores Unidade central

95 587,50

23

26 382 150,00

115

131 910 750,00

Chefe de Departamento Central

52 813,25

28

17 745 252,00

140

88 726 260,00

Motorista privativo

5 328,00

2

127 872,00

10

639 360,00

Assistente Reitor

29 036,00

2

696 864,00

10

3 484 320,00

TOTAL SALÁRIOS E SUBSÍDIOS

   

87 758 143,20

 

437 830 434,00

Viaturas de Campo (25%)

3 720 000,00 b)

2

1 860 000,00

10

9 300 000,00

Viatura Protocolar (25%)

4 340 000,00 b)

2

2 170 000,00

10

10 850 000,00

 

TOTAL GERAL

 

91 788 143,20

 

457 980 434,00

  1. a)Valor médio mensal incluindo salário e subsídios
  2. b)Valor estimado da viatura. No valor anual foi colocado o valor de amortização anual (25%)

SOBRE O OBJECTIVO 3: CONFERIR O ENSINO SUPERIOR UMA NOVA DINÂMICA E EFICIÊNCIA DE FUNCIONAMENTO

 

Conferir ao ensino superior uma nova dinâmica e eficiência de funcionamento é algo de muito subjectivo, dado que eficiência é a taxa de resultado sobre o consumo e o consumo irá aumentar de forma abrupta, como demonstrado anteriormente, teremos de ter um resultado extraordinariamente aumentado.

 

Numa altura em que o país passa por tudo o que passa tenho muita dificuldade em entender os motivos e vantagens por que a UP foi dividida dessa forma. Algum motivo que me transcende e que nunca nos foi explicado. Admitindo que possa existir um ou vários motivos que expliquem as medidas tomadas, seria muito útil e decente que nos fossem explicados. Porque objectivamente os que vêm referenciados no despacho não o são. Decidiram destruir um trabalho de muitos anos sem a participação dos seus construtores apresentando motivos que pelo que nos é dado a perceber não são os que de facto motivaram a decisão.

 

Nota: o meu agradecimento aos colegas que colaboraram nesta reflexão e simulação. (António Prista)

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