Na sexta-feira passada, um juiz de instrução do Tribunal Judicial do Distrito de Nacala-Porto decretou uma providência cautelar de arresto preventivo de bens de empresas ligadas ao do grupo multinacional ETG, numa acção movida pela empresa moçambicana Royal Group, baseada em Nacala.
A medida gerou alguma “inquietação” em círculos que tomaram conhecimento da mesma - sobretudo porque entre os bens encontram-se produtos agrícolas de exportação, como feijão-boer, arroz e milho, entre outros - mas o quadro geral, o “big Picture”, pode ajudar os leitores a fazerem melhor juízo sobre os motivos e justeza desta contenda legal.
De acordo com uma apuração de “Carta de Mocambique”, a decisão do arresto segue-se a uma acção cível instaurada pelo Grupo Royal na Secção Comercial do Tribunal Judicial da Província de Nampula, através da qual a empresa moçambicana exige ao Grupo ETG (Export Marketing Company, Lda; Export Marketing Company, Lda Beira; ETG Pulses Mozambique, Lda; Agro Processors & Exporters, Lda; Agro Industries, Lda) o pagamento de uma indemnização por danos resultantes de uma denúncia caluniosa que prejudicou uma exportação da Royal.
Esta exigência tem antecedentes numa denúncia caluniosa junto das autoridades indianas de que o Grupo Royal foi vítima. Nas suas alegações em sede da acção cível, o Grupo Royal argumentou que funcionários bem posicionados do grupo ETG fizeram o uso de um certificado fitossanitário falso que declarava que uma exportação de milhares de toneladas de soja, do Grupo Royal para a Índia, como sendo produto com origem em sementes geneticamente modificada (GMO). Refira-se que o Grupo ETG é uma multinacional com forte implantação na Índia, de onde seu dono, Manesh Patel, é originário.
Com base nesse documento fitossanitário falso, as autoridades indianas prenderam, durante 14 meses (desde Setembro de 2022), o navio fretado pelo Grupo Royal, o “Ruby”, com toda a mercadoria que transportava, causando um impacto negativo na reputação e credibilidade comercial do grupo empresarial de Nacala, que alega agora ter sofrido avultados prejuízos económicos.
A saga de Mumbai só terminou quando um juiz do Tribunal Superior daquela cidade declarou que a soja da Royal não era geneticamente modificada, levantando a medida de apreensão antes imposta, de acordo com documentos a que “Carta” teve acesso.
Os juízes de Mumbai decidiram inocentar o Grupo Royal depois de obterem a garantia de resultados de análises laboratoriais levadas a cabo por uma entidade credível terem provado que a soja não era geneticamente modificada.
Agora, o Grupo moçambicano quer ver-se ressarcido desses danos de que até hoje se ressente, usando os instrumentos legais ao seu dispor. Por isso, instaurou um processo crime contra funcionários do grupo ETG, nomeadamente, Venkateshwaran Narayanan e Maulique Patel, e requereu a responsabilização das empresas do grupo ETG, por alegadamente terem mandatado os seus funcionários para prejudicar o Grupo Royal no mercado indiano de comercialização de cereais e leguminosas, por intermédio da denúncia caluniosa.
Mas, enquanto o processo civil por indemnização corre seus tramites, o Grupo Royal registou suspeitas de fuga à responsabilidade do grupo ETG, nomeadamente com a saída do país de um dos arguidos, Venkatesh Narayanan, tido como o cabeça da denúncia caluniosa que prejudicou a Royal.
Foi no âmbito deste processo crime que foi requerido o arresto dos bens das empresas da ETG, como medida de coação para assegurar o pagamento de uma indemnização que cobre os prejuízos sofridos pela Royal.
O Grupo Royal alega também que o arresto foi requerido por conta de um clima de insegurança patrimonial por parte da ETG, concretamente pelo facto de o património do grupo estar longe de cobrir o prejuízo da Royal e que a única garantia patrimonial existente eram produtos agrícolas que, mais ou menos dias, poderão ser exportados, tendo em conta que nem uma mínima percentagem do valor da venda fica no território nacional.
Aliás, de acordo com dados a que “Carta” teve acesso, uma multinacional da dimensão da ETG não coloca o seu dinheiro no sistema financeiro nacional. Com efeito, os Bancos comunicaram aos tribunais saldos num total de USD 4.515.677,11 e a avaliação preliminar da propriedade foi de quase USD 4.000.000, o que não cobre sequer a metade dos danos reclamados pelo Grupo Royal. (Marcelo Mosse)