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segunda-feira, 04 dezembro 2023 07:08

Conflito de Terra: Membros da Frelimo invadem terreno de 100 hectares e processam seu dono em Matutuine

Um terreno de 100 hectares, localizado na zona costeira da localidade de Nsime, sede do Posto Administrativo de Katembe Nsime, no distrito de Matutuine, província de Maputo, está em disputa (com três processos na justiça) há mais de 10 anos, opondo Inácio Matsinhe, proprietário da parcela, e mais de duas dezenas de indivíduos, incluindo membros influentes do partido Frelimo, que retalharam a parcela.

 

Trata-se de um dossier que teve seu início em 2017, quando Raimundo Diomba, na qualidade de Governador da Província de Maputo, exarou um despacho a revogar o DUAT (Direito de Uso e Aproveitamento de Terra) de Inácio Matsinhe, alegadamente por “incumprimento do plano de exploração, existência de conflitos dentro da parcela, parcelamento e venda de terrenos a terceiros”. Matsinhe, refira-se, é proprietário do referido terreno há mais de 20 anos.

 

Inconformado com a decisão do então Governador da Província de Maputo, Inácio Matsinhe recorreu ao Tribunal Administrativo da Província de Maputo, que decidiu não apreciar o caso até que, supostamente, se resolvesse uma questão fundamental: a venda ou não de terra.

 

A decisão do Tribunal Administrativo da Província de Maputo foi anulada pelos juízes da 1ª Secção do Tribunal Administrativo, em Acórdão nº 49/2019, de 14 de Maio, que alegaram que o argumento da alegada venda de terra (por parte de Inácio Matsinhe) não impedia o julgamento do acto administrativo praticado pelo Governador da província de Maputo que, naquele caso, tinha sido ilegal. A decisão foi também mantida pelo Plenário daquele Tribunal, no seu Acórdão nº 65/2021.

 

À “Carta”, Matsinhe garante que não vendeu qualquer terreno na referida parcela, mas que parcelou mais de 30 talhões para familiares e amigos, como forma de reaproveitar o terreno, uma vez que o seu projecto estava a ser inviabilizado e a parcela a ser invadida.

 

A fonte acusa os técnicos de Serviço Distrital de Planeamento e Infra-estruturas de Matutuine de terem parcelado e vendido os terrenos para terceiros, com ajuda das autoridades locais, com destaque para os líderes comunitários.

 

O Director do Serviço Distrital de Planeamento e Infraestruturas de Matutuine, Júlio Pompeo Cuna, nega que os seus subordinados tenham vendido terrenos naquela parcela. “Pode ter havido algumas atribuições durante o período da revogação do DUAT, mas depois do Acórdão do Tribunal Administrativo todos os actos ficam nulos”, afirma.

 

Inácio Matsinhe acusa ainda Raimundo Diomba, antigo Governador da província de Maputo, de ter invadido a sua parcela, parcelado e distribuído terrenos para os seus “camaradas”, com destaque para as comissárias políticas Verónica Macamo e Margarida Talapa, cujos terrenos ainda estão baldios.

 

A reportagem da “Carta” visitou, há dias, a parcela em conflito e testemunhou o nascimento de um conglomerado de residências luxuosas, à moda Triunfo, Tchumene e Belo Horizonte, nos municípios de Maputo, Matola e Boane, respectivamente. À beira das águas cristalinas do Oceano Índico, “Carta” fotografou uma casa de praia, cuja titularidade é atribuída a Raimundo Diomba.

 

Ao nosso jornal, Diomba negou ser proprietário da referida casa, mas admitiu ter um terreno em Katembe Nsime de cuja localização, curiosamente, já não se lembra. “Sempre que vou para lá, requisitei um técnico do distrito para me indicar”, garantiu o ex-Secretário do Comité Central para Verificação do partido Frelimo sem, no entanto, avançar a data da sua atribuição.

 

O Director do Serviço Distrital de Planeamento e Infra-estruturas de Matutuine não confirma nenhuma das versões (tanto de Matsinhe, como de Diomba), mas explica que, caso o antigo Governador da Província de Maputo tenha terreno em Katembe Nsime, este deve integrar o grupo de talhões parcelados na região da província de Maputo, no âmbito da implementação do Plano de Ordenamento Territorial. Aliás, Júlio Pompeo Cuna revela que o referido Plano terá afectado parte do terreno de Inácio Matsinhe, que, “em sede própria, foi ressarcido pelo Estado”.

 

Inácio Matsinhe confirma a existência do referido Plano, assim como o ressarcimento dos seus direitos pela invasão da sua parcela, mas garante que o terreno de Raimundo Diomba está dentro da sua parcela.

 

 

Processos no Tribunal e dois contra Inácio Matsinhe

 

Com “peixe graúdo” a escorregar das mãos de Inácio Matsinhe, a fonte decidiu processar três “invasores”, cujo julgamento arrancou há dias no Tribunal Judicial do Distrito de Matutuine. Trata-se de Dário Ismael, Sónia Demitrios e Dalima, cidadãos que possuem terrenos no interior da parcela dos 100 hectares de Inácio Matsinhe.

 

Segundo Inácio Matsinhe, os três indivíduos possuem títulos falsos de posse de terrenos, na medida em que os seus títulos de DUAT foram emitidos sobre uma área já ocupada e com o DUAT ainda em vigor.

 

A fonte conta que, sempre que tenta resolver o problema de forma amigável, recebe ameaças de morte, de alguns, e outros alegam ter protecção política do partido Frelimo, pelo que não vão desocupar os terrenos e muito menos indemnizar o titular da parcela.

 

Os três indivíduos já processados por Matsinhe detêm terrenos naquela região há três anos. Aliás, fontes locais de Katembe Nsime contam que a corrida à ocupação daqueles terrenos intensificou-se nos últimos três anos.

 

Os três “invasores” integram a lista de indivíduos que Matsinhe acredita terem sido atribuídos os espaços por técnicos do Serviço Distrital de Planeamento e Infra-estruturas de Matutuine e cujos projectos habitacionais já estão a ganhar forma. A fonte diz que falta processar mais de 20 pessoas, não tendo previsão de quando o fará devido a questões financeiras.

 

No entanto, no meio da invasão daquela parcela, há quem tenha processado Inácio Matsinhe também por invasão. É o caso Rute Monteiro e da empresa chinesa StarTimes. O processo de Rute Monteiro dura há mais de dois anos, enquanto o da StarTimes foi movido no princípio deste ano. Os dois acusam Inácio Matsinhe de ter invadido os seus talhões.

 

No caso da empresa chinesa, o processo foi aberto no Tribunal Judicial do Distrito Municipal de Katembe, na Cidade de Maputo, porém, Inácio Matsinhe requereu a transferência do caso para o Tribunal Judicial do Distrito de Matutuine, pelo facto de os terrenos se localizarem naquele distrito da província de Maputo e não na capital do país. Até ao momento, nenhum processo teve decisão do Tribunal. (A. Maolela)

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